Título: Fortaleza tem o segundo turno mais indefinido
Autor: Camarotto, Murilo
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2012, Política, p. A14

"Quem vai definir esta eleição, infelizmente, é a máquina". Após uma acalorada discussão na calorenta Fortaleza (CE), foi a este consenso que chegaram dois militantes rivais acerca da corrida municipal, matematicamente dividida entre os candidatos Elmano de Freitas (PT) e Roberto Cláudio (PSB), respectivos representantes da prefeitura e do governo estadual. Noves fora o grau de interferência que terá no processo eleitoral, a referida máquina é, de fato, protagonista na eleição da capital cearense.

O médico e deputado estadual Roberto Cláudio, que é presidente da Assembleia Legislativa do Ceará, foi escolhido candidato do PSB após o rompimento da aliança entre o governador Cid Gomes (PSB) e a prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins (PT). Ele enfrentará no próximo domingo o advogado Elmano de Freitas, petista de longa data e ex-dirigente do partido que saiu da secretaria municipal de Educação direto para o palanque eleitoral.

O desejo de Cid em ver o PT fora da prefeitura vem dos alegados boicotes que Luizianne teria feito aos projetos do governo estadual na capital do Estado. "Por um espírito de competitividade política, ela não queria que nós realizássemos as coisas. Não conseguia fazer e não queria que os outros fizessem", afirmou o governador, que avalia sua relação com Luizianne como irreconciliável, apesar da obrigação de conviverem por conta dos cargos que ocupam. "Tenho que engolir alguns sapos", alfinetou.

Antes do primeiro turno, Cid não acreditava que teria o PT como principal adversário na eleição municipal. Não bastasse a crise de popularidade da prefeita, o candidato petista era considerado fraco. Neófito em eleições, Elmano não era citado nem por 5% dos eleitores nas primeiras pesquisas, mas ganhou consistência e acabou o primeiro turno da disputa na liderança, com 25% dos votos. Apadrinhado por Cid, Roberto Claudio teve 23%.

"Atribuo o nosso crescimento à união do PT, ao fato de termos conseguido mostrar o que fizemos na prefeitura e, claro, à participação do (ex-) presidente Lula na campanha, que foi fundamental", afirmou Elmano de Freitas. Outro fator que contribuiu para sua subida nas pesquisas foi a diminuição da rejeição à administração de Luizianne, defendida diariamente na propaganda eleitoral petista.

Para os adversários, porém, seu desempenho se deve exclusivamente à utilização sistemática da imagem do ex-presidente da República, que na última quarta-feira falou por quase 20 minutos em um comício na Praça do Ferreira, no centro de Fortaleza. Na televisão, Ciro Gomes alerta "aos fãs de Lula" que o candidato não é o ex-presidente, mas sim o desconhecido Elmano.

Evitando polemizar com Lula, que ainda tem força eleitoral relevante no Nordeste, Cid afirma apenas que o ex-presidente "está fazendo seu papel". O governador avalia, porém, que o efeito da visita ilustre nas urnas será mínimo, visto que a imagem de Lula já vinha sendo usada desde o começo da campanha de Elmano.

Para tirar a diferença e renovar seu reinado na capital cearense, que já dura oito anos, a campanha petista promete tomar a cidade este final de semana. Haverá intensificação da atividade nos núcleos estudantil e sindical do partido. Do lado do PSB, Cid, Ciro e Roberto Cláudio decidiram trabalhar separados, a fim de ampliar o alcance da campanha. "Vou morar nas ruas de Fortaleza", afirmou o governador, que tirou licença do cargo para se dedicar exclusivamente à campanha na última semana da corrida eleitoral e atraiu para sua seara alguns dos candidatos derrotados no primeiro turno, como Moroni Torgan (DEM) e Inácio Arruda (PCdoB).

Pesquisa do Datafolha divulgada ontem mostra Elmano com 51% dos votos válidos, contra 49% de Roberto Cláudio. A sondagem, porém, revela crescimento do candidato do PSB e queda do petista em relação ao último levantamento. Já a sondagem do Ibope aponta os dois postulantes com 50% das intenções de votos (válidos). O cenário de total indefinição deixa candidatos, padrinhos e militantes à flor da pele. A atmosfera política na capital, revelam os locais, remete às tradicionais disputas eleitorais do interior do Nordeste, onde não há partidos nem candidatos, mas apenas cores. E máquinas.