Título: Haddad quer parcerias com setor privado
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Fonte: Valor Econômico, 29/10/2012, Política, p. A13

Em seu primeiro discurso depois de eleito com 55,6% dos votos válidos prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT) disse que o objetivo central de seu futuro governo será o combate à desigualdade social. O petista prometeu se empenhar na construção de parcerias com os governos federal, estadual e com a iniciativa privada e sinalizou uma trégua com o PSDB, ao elogiar os adversários pela disputa "limpa", apesar das incontáveis brigas com o tucano José Serra.

Haddad disse ter sido eleito pelo "sentimento de mudança" e que deseja "derrubar o muro da vergonha que separa a cidade rica da pobre". Para o petista, "a cidade tem que unir, e não desunir". "Tem que acarinhar, e não violentar. Tem que dar conforto, e não sofrimento".

Segundo Haddad, a melhoria dos serviços públicos é uma forma de distribuir renda e garantir "paz social". "A cidade tem que dar um teto digno, limpo e descente para a família realizar o sonho de ser feliz", disse.

O prefeito eleito ressaltou que quer tornar a cidade referência para o país. "São Paulo precisa voltar a ser farol e antena. Farol para iluminar o Brasil e antena para captar o que há de mais moderno", afirmou. Em uma alfinetada no atual prefeito, Gilberto Kassab (PSD), Haddad prometeu buscar parcerias com a iniciativa privada, com as forças criativas e a "intelectualidade que nunca perdeu a capacidade de pensar", mas que a prefeitura, por vezes, deixou de atrair.

Ainda em crítica à gestão, disse que a prefeitura deixou de ouvir os movimentos sociais com a "constância e necessidade" que merecem. Em outro momento, reforçou que São Paulo tem que se abrir para o Brasil e para o mundo e que a cidade "não é uma ilha política", em outro ataque a Serra e Kassab.

Sem a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cancelada de última hora, Haddad discursou por 13 minutos em um hotel na região da avenida Paulista. O petista começou agradecendo aos milhões de homens e mulheres que votaram nele, à sua família e, "do fundo do coração" seu padrinho político, sem o qual sua candidatura não existiria. "Agradeço ao presidente Lula pela confiança, orientação e apoio, sem os quais seria impossível lograr êxito".

Haddad agradeceu a presidente Dilma Rousseff "pelo estímulo pessoal e conforto nos momentos mais difíceis". O petista reforçou a menção à presidente lembrando que Dilma participou da eleição em São Paulo desde o primeiro turno, apesar de existirem outras candidaturas da base aliada. Ontem, Dilma ligou para Haddad para cumprimentá-lo e disse que a vitória "representa o Brasil de braços dados com São Paulo". Hoje o futuro prefeito deve se encontrar com a presidente em Brasília.

No discurso, Haddad também saudou o deputado federal Gabriel Chalita (PMDB), que o apoiou no segundo turno, o vice-presidente Michel Temer (PMDB) e os partidos coligados, além de destacar "a figura decisiva e equilibrada" do coordenador de sua campanha, vereador Antonio Donato, cotado para a Secretaria de Governo. O deputado federal Paulo Maluf (PP), também presente no evento, não foi citado por Haddad.

Maluf, no entanto, disse que teve participação na vitória do petista. "Teve uma pesquisa do Datafolha que disse que 12% dos eleitores votariam no candidato que eu indicasse, e outros 12% poderiam votar em quem eu escolhesse. Em uma eleição que terminou com dez pontos [percentuais] de diferença, acho que dei minha contribuição", afirmou o deputado, ex-adversário do PT cujo adesão à campanha causou polêmica.

Por último, Haddad mudou o discurso que adotou ao longo da campanha, quando criticou principalmente Serra, a quem chamou de "mentiroso", e fez um aceno aos adversários. "[Eles] me obrigaram a extrair o melhor de mim em uma disputa limpa e democrática. A todos, indistintamente, o meu muito obrigado".

Ao festejar o resultado na avenida Paulista, Haddad fez um novo aceno ao tucano. Ao citar que havia recebido uma ligação de Serra para lhe desejar "bom trabalho", o público xingou o adversário. Desconcertado, o petista ignorou as vaias. "Fizemos um bom embate, de guerreiros, de pessoas que militam pelo Brasil, daqueles que querem melhorar a vida do nosso povo", declarou. Haddad relatou ter recebido também um telefonema do prefeito Kassab, se oferecendo para uma "transição de alto nível".

Os acenos à oposição, segundo petistas, visam um acordo para manter a governabilidade. A avaliação é que o segundo turno acabou sob forte clima de tensão, sobretudo com os tucanos, que poderiam dificultar a relação com a Câmara Municipal - o PSDB elegeu a segunda maior bancada, com nove vereadores, de um total de 55. Outro que pode atrapalhar a aprovação dos projetos é o PSD, de Kassab, que fez a terceira maior bancada, com sete parlamentares. O prefeito busca se articular com vereadores de outros partidos para formar um bloco com capacidade de influenciar nas decisões.

A transição do governo será feita pelo comando da campanha. Haddad tem dito que escolherá pessoalmente seus secretários de Educação, Saúde e Finanças e mostra-se resistente às cotas dos partidos aliados no secretariado. Petistas defendem uma reforma administrativa, com a redução das secretarias e descentralização do poder, com a retomada da autonomia das 31 subprefeituras.

Haddad, de 49 anos, já foi subsecretário de Finanças e Desenvolvimento Econômico na gestão da ex-prefeita Marta Suplicy (2001-2004). Em Brasília, foi assessor especial do Ministério do Planejamento e secretário-executivo no Ministério da Educação. Em 2005, no auge do escândalo do mensalão, assumiu o ministério e ficou no cargo por seis anos e meio, até janeiro. É bacharel em Direito, mestre em Economia e doutor em Filosofia pela USP e foi professor da universidade. O petista é casado e tem dois filhos.