Título: Governo orientará prefeitos a implementar programa da ONU
Autor: Exman, Fernando ; Peres, Bruno
Fonte: Valor Econômico, 31/10/2012, Política, p. A11

Repetindo prática lançada pela administração Luiz Inácio Lula da Silva, o governo Dilma Rousseff planeja realizar no início de 2013 um grande evento para recepcionar os prefeitos que acabam de ser eleitos e tomarão posse em janeiro. Como em 2009, a ideia do governo é apresentar o catálogo de programas federais voltados aos municípios e promover as potenciais parcerias entre o Executivo e as prefeituras. Autoridades do Palácio do Planalto sabem que não escaparão da pressão por mais recursos. Desta vez, entretanto, também farão uma demanda aos gestores municipais: o Palácio do Planalto quer mobilizar os novos prefeitos para que o país acelere a implementação e busque reduzir as disparidades regionais na execução dos chamados Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs).

A intenção do governo de reduzir os riscos de interrupção nas parcerias com os municípios tem fundamento. Nas eleições concluídas no domingo, o índice de prefeitos reeleitos diminuiu. Nas 26 capitais, por exemplo, o índice de reeleição caiu de 95% em 2008 para 50% neste ano.

"O índice de reeleição foi menor, então nós devemos fazer esse evento. É um evento importante", explicou ao Valor a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti.

São oito os Objetivos do Milênio: erradicar a extrema pobreza e a fome, universalizar a educação primária, promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres, reduzir a mortalidade na infância, melhorar a saúde materna, combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças, garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento. A instituição dessas metas resultou de um compromisso firmado por 189 países, em setembro de 2000, para combater a extrema pobreza e outros problemas sociais e ambientais do mundo.

Dez anos depois, a comunidade internacional renovou o pacto para acelerar a implementação dessas metas, as quais deverão ser atingidas até 2015. Ou seja, num período próximo à campanha para a reeleição de Dilma.

"São metas específicas de compromisso de livre adesão das prefeituras", afirmou Ideli. "A nossa ideia neste evento é poder ter uma intensificação desta adesão. A adesão hoje em relação aos municípios é baixa."

Do ponto de vista político, o governo demonstrará aos prefeitos que a execução dessas metas poderá garantir às suas administrações selos de excelência capazes de lhes render dividendos políticos futuramente. "São metas muito claras e fáceis de serem acompanhadas pela população", explicou a articuladora política do Executivo.

Com esse esforço, o governo espera reduzir as disparidades na implementação dos ODMs entre as regiões do país. "Algumas metas o Brasil já superou ou está muito próximo de alcançar. Mas, mesmo o Brasil estando muito próximo ou já superando, a distribuição regional é muito desigual. O fato de o país atingir não significa que todos os municípios e regiões atingiram", explicou a ministra. "Tem muito diferencial na questão da saúde, da desigualdade da mulher ou das questões da criança e de desigualdade salarial."

Para a coordenadora da Unidade de Planejamento Estratégico do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no Brasil, Maria Celina Berardinelli Arraes, essa maior articulação entre governo federal e municípios não ocorre tarde demais e o Brasil está bem posicionado para cumprir os objetivos dentro do prazo estipulado. O Pnud é o órgão que coordena o grupo de trabalho sobre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio na Organização das Nações Unidas.

Em entrevista por e-mail, ela disse que a posse dos prefeitos eleitos é uma oportunidade para a repactuação do compromisso municipal pelos ODMs. "A implantação de políticas públicas específicas com foco no cumprimento dos ODMs, como foi o caso do Programa Bolsa Família e agora do Plano Brasil sem Miséria, está sendo fundamental para esta evolução do desenvolvimento humano no Brasil", anotou a representante do Pnud, lembrando que o Brasil já ultrapassou a meta estabelecida para a redução da pobreza. Por outro lado, ponderou, o Brasil e outros países latino-americanos precisam realizar um esforço adicional para melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem em habitações precárias nos grandes centros urbanos. "O Brasil apoia e tem trabalhado seriamente para alcançar os ODMs e os frutos desse esforço têm dado bons resultados, tanto que o país é destaque no cenário mundial em relação ao cumprimento das metas", acrescentou Maria Celina.

Segundo ela, os avanços observados no Brasil devem ser creditados principalmente aos esforços conjuntos realizados por governos, empresas, universidades, organizações não governamentais e organismos internacionais. "Apesar de o país estar bem posicionado em termos de médias nacionais, é importante fazer chegar essas conquistas às comunidades mais longínquas, ou seja, acabar com as desigualdades regionais e locais que se escondem por detrás das médias", ponderou. "Tanto em âmbito mundial como nacional, o progresso tem sido desigual, muitas vezes com impacto modesto sobre os mais pobres e os segmentos mais vulneráveis da população. O progresso dos ODMs exige crescimento sustentado, inclusivo e equitativo e oferta intensiva de emprego, com oportunidades para todos."

Já o "mundo pós-2015", completou a representante do Pnud, deve ser discutido num evento da ONU em 2013. A entidade e os diversos governos devem debater uma proposta de elaboração dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs), um novo conjunto de metas que visa a ampliação do combate à desigualdade social, a promoção da sustentabilidade ambiental e outros problemas que afetarão a comunidade internacional até 2030. "Nesta reta final até 2015, é indispensável que Estados e municípios também dediquem suas políticas sociais e mobilizem a sociedade civil e o setor privado para conseguirem completar as lacunas ainda existentes."