Título: Governo pode rever metas de investimento e superávit primário
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 22/03/2007, Brasil, p. A4

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que o novo PIB levará o governo a rediscutir a meta de superávit primário, hoje de 4,25% do PIB. Ele não adiantou se a meta será reduzida, mas a tendência é que o governo persiga uma meta menor que 4,25%, mantendo a meta em reais, estimada em R$ 95,5 bilhões.

"Não dá para dizer o que vamos fazer porque não saiu nem o PIB de 2006", afirmou Mantega. "Quando sair, vamos discutir o assunto com o presidente Lula." Questionado se a meta de 4,25% do PIB está mantida, ele procurou não assumir compromissos. "A única coisa que posso dizer é que os fundamentos da economia melhoraram", disse.

O superávit primário é o principal embaraço causado para o governo no novo cálculo do PIB. "Teremos depois que ver o que fazer", disse o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. O outro embaraço é a queda do investimento, de 19,9% para 16,3% do PIB. O resto foi só comemoração. Mantega comparou o crescimento do PIB no primeiro governo Lula, que sobe de 2,7% para 3,3%, com o desempenho do governo FHC, que cresceu 2,3%. "Não posso resistir a essa informação: a carga tributária de 2005 cai de 37,4% para 33,7% do PIB."

Pela nova metodologia adotada pelo IBGE, o PIB nominal de 2005 fica 10,9% maior do que o anteriormente estimado. Espera-se que os PIBs de 2006 e 2007 sejam também maiores. Como o PIB previsto para este ano é maior, o governo terá que fazer um esforço adicional no seu orçamento, gastando menos ou arrecadando mais, para fazer um superávit primário de 4,25% do PIB em 2007. As estimativas preliminares de consultorias do setor privado dão conta de um esforço fiscal adicional entre R$ 9 bilhões e R$ 10 bilhões do governo federal. Antes da mudança do PIB, o governo federal e suas empresas estatais tinham que fazer um superávit primário estimado em R$ 71,1 bilhões - o resto, para chegar a R$ 95,5 bilhões, vinha de Estados e municípios.

O problema para o governo é assumir o ônus perante o mercado financeiro de anunciar que irá perseguir uma meta ainda menor. Antes, já havia anunciado que, para acomodar investimentos públicos, a meta de 4,25% poderá cair para até 3,75% do PIB. O contraponto é que, com a revisão de toda a série estatística, o primário já caiu abaixo da meta outras vezes, como em 2003, 2004 e 2006. Nem por isso a relação entre a dívida liquida e o PIB deixou de ser reduzida no período.

Segundo estimativa preliminar divulgada pelo Ministério do Planejamento, o superávit primário ocorrido em 2003 cai de 4,3% para 3,9% do PIB; o de 2004, de 4,6% para 4,2% do PIB; o de 2005, de 4,8% para 4,4%. O Planejamento não divulgou estimativas sobre o superávit de 2006, mas o cálculo de economistas do setor privado é que tenha caído de 4,32% para 3,9% do PIB.

A dívida líquida do setor público também caiu substancialmente com o novo PIB. Segundo cálculos preliminares do Ministério da Fazenda, teria ficado em 46,5% do PIB em 2005, em vez dos 51,5% do PIB divulgados pela metodologia antiga. A Fazenda não divulgou cálculos para a dívida líquida em 2006, mas estimativas do mercado dão conta de que tenha ficado pouco acima de 45% do PIB. É como se o país tivesse avançado três anos no seu programa de redução da dívida.

Pelas projeções do mercado financeiro, a dívida líquida cairia a 45,5% do PIB somente em 2009. As projeções oficiais da Fazenda incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) previam 45,8% em 2008. "Certamente chegaremos abaixo de 40% do PIB antes de 2010", disse Mantega. "Estamos mais próximos da condição de 'investment grade', que leva em conta crescimento da economia e dívida pública."

A revisão do PIB também leva à queda no déficit nominal. Para 2005, o indicador era calculado em 3,28% do PIB e, agora, em 2,96% do PIB, segundo cálculos da Fazenda. O interessante é que o déficit nominal cai mesmo com a redução do primário daquele ano, de 4,8% para 4,4% do PIB. É que, como a dívida ficou menor, também encolheu o gasto com juros - de 8,1% para 7,4% do PIB.

O economista Francisco Pessoa Faria, da LCA Consultores, afirma que o governo poderá tomar três caminhos em relação ao superávit primário. Um deles é aumentar em cerca de R$ 10 bilhões o primário, para que o superávit chegue a 4,25% do PIB neste ano. Uma segunda alternativa seria manter a meta em reais, mas diminuir a meta em relação ao PIB. Uma terceira alternativa é reduzir as metas tanto em reais quanto em relação ao PIB, com a justificativa de que a dívida líquida e o déficit nominal caíram. "A redução do superávit em reais seria muito mal recebida", disse.

O economista Guilherme Loureiro, da Tendências, lembra que afrouxar a disciplina fiscal seria ruim porque o principal indicador de solvência observado pelos investidores é a dívida bruta, que permanece alta. Segundo seus cálculos, com o novo PIB, o indicador cai de 74,8% para 67,5% do PIB em 2005, ainda muito acima da media dos países com "investment grade", que é de 36,3%.

Mantega considera que a queda dos investimentos na revisão do PIB é positiva - mostra que a economia pode crescer mais com menos investimento. "A produtividade cresceu", concluiu. Ele disse que, com aos novos cálculos do PIB, fica inviabilizada a meta, contida no PAC, de elevar os investimentos a 25% do PIB até 2010. Mas, segundo ele, será possível expandir os investimentos em cerca de um ponto percentual do PIB por ano, até atingir algo como 21% do PIB. E, com esse percentual, será assegurada uma alta taxa de crescimento potencial. "Em 2007, o crescimento da será maior do que 4,5%", disse. (colaborou Mônica Izaguirre, da sucursal de Brasília)