Título: Universalização depende de articulação e parcerias
Autor: Rockmann, Roberto
Fonte: Valor Econômico, 01/11/2012, Brasil, p. A8

Sexta maior economia do mundo, o Brasil tem um desafio árduo pela frente: universalizar os serviços de água e esgoto para os mais de 190 milhões de brasileiros das cinco regiões do país, cuja rede de saneamento ostenta histórico déficit. Cerca de 60% do esgoto são lançados a céu aberto, enquanto 54% dos domicílios não possuem rede coletora. Do lado de abastecimento de água, a realidade também é dura: 55% dos pouco mais de 5500 municípios poderão conviver com déficit de abastecimento hídrico nos próximos anos, enquanto um em cada cinco lares não tem água encanada. Estima-se que, para universalizar os serviços de água e esgoto, seriam necessários recursos de R$ 420 bilhões até 2030, uma média anual de R$ 20 bilhões em investimentos, um número muito acima dos R$ 5,6 bilhões anuais aplicados entre 2003 e 2011.

Para mudar essa realidade, será preciso um esforço articulado e planejado entre governos, empresários e sociedade, segundo especialistas que participaram do 2º Seminário de Saneamento Básico realizado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) na terça-feira. "O sonho de universalização ainda é possível, mas é preciso agir com rapidez, eficácia e de forma planejada", disse o diretor de infraestrutura da Fiesp, Carlos Cavalcanti. "O Brasil está na 84ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Um dos elementos que mais impactam no baixo IDH do país é a infraestrutura de saneamento, um setor que tem sido gerenciado há três décadas predominantemente por estatais", reforçou o diretor da Fiesp. "Se mantivermos o ritmo atual de investimentos, de R$ 5,6 bilhões ao ano, que foi a média entre 2003 e 2011, demoraremos muito mais décadas ainda pela frente", disse.

Para o empresário, as desigualdades devem ser atacadas com o maior ingresso de capital privado no setor. "No Sudeste, 69% das casas têm acesso a esgoto, enquanto no Norte esse percentual fica abaixo dos 5%. O setor tem sido bancado pelo Estado, é preciso alterar isso e reduzir custos operacionais e melhorar projetos", afirmou.

O índice de desperdício nas redes das concessionárias brasileiras está em 40%, enquanto na Europa e nos EUA fica na casa dos 10% a 15%. No Japão, referência mundial, o indicador é de 4%. De acordo com estimativas do consultor Airton Sampaio Gomes, que elabora trabalhos para o Banco Mundial e concessionárias de saneamento, as perdas no sistema no Brasil chegam a R$ 7,4 bilhões por ano. "Seria preciso estimular as parcerias público-privadas, que ainda estão travadas", afirmou o presidente do conselho de infraestrutura da Fiesp, Rodolpho Tourinho Neto.

A advogada Rosane Menezes Lohbauer, sócia da área de infraestrutura e regulatório da MHM Advogados, estima que a presença do capital privado no setor esteja em 6%. "As PPPs poderiam ser um instrumento mais utilizado, mas se veem alguns obstáculos", afirmou. Entre eles, a ausência de bons projetos e o despreparo de servidores públicos para trabalhar em modelagens complexas como as das PPPs, que envolvem várias esferas. "Não é uma tarefa simples preparar uma PPP ", afirmou.

O governo de São Paulo, que fez a primeira PPP do setor, em 2004, está se preparando para lançar em breve ao mercado o edital de uma nova parceria com a iniciativa privada, que envolverá uma ampliação do abastecimento de água para a Região Metropolitana de São Paulo. A PPP do sistema produtor de Água São Lourenço, que pode envolver R$ 1,6 bilhão em investimentos e está sendo conduzida pela Sabesp, deve ter a licitação oficialmente lançada dia 8 de novembro, segundo o secretário estadual de saneamento e recursos hídricos de São Paulo, Edson Giriboni. "Ela deve trazer um aumento de 4,7 metros cúbicos por segundo na vazão para a região metropolitana", afirmou. O secretário paulista ainda afirmou que, até o fim de novembro, o Estado deve lançar edital de PPP com foco no combate a enchentes. O projeto tem custo de R$ 814 milhões, e a empresa vencedora deve construir sete piscinões em dois anos e gerir outros 33 existentes ou em construção. "A ideia é que a operação dos piscinões seja feita 24 horas em tempo real."