Título: Nova linha de crédito dribla falta de recursos
Autor: Belo, Eduardo
Fonte: Valor Econômico, 01/11/2012, Brasil, p. A8
Enfrentar o principal problema dos investimentos do setor público: o contingenciamento de recursos. Essa pode ser a grande virtude do Finisa, nova linha de crédito para infraestrutura e saneamento lançada em setembro pela Caixa Econômica Federal (CEF).
Voltado também para o setor privado, o Finisa deve reunir "o melhor dos mundos" ao combinar acesso fácil, juros moderados e prazos condizentes com o setor, defende Luciana Marques da Costa Jacomassi, gerente de clientes e negócios da Caixa para a área de saneamento.
De acordo com a executiva, a linha não tem um teto estabelecido. A Caixa já divulgou que pretende encerrar este ano com R$ 3 bilhões em financiamentos contratados pelo Finisa.
Os juros do Finisa estão acima daqueles oferecidos pela principal carteira de financiamento do setor, que são os recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), também geridos pela Caixa. Enquanto no FGTS a taxa é de no máximo 9% ao ano mais a variação da Taxa Referencial (TR), a nova linha do Finisa opera com a variação do IPCA mais juros de 5% a 8% ao ano, conforme o projeto, o destinatário do empréstimo, as garantias oferecidas, além de outros fatores. Os prazos do financiamento são de até 20 anos, com até cinco anos de carência.
O Finisa também financia a importação de equipamentos para obras, mas isso não inclui a internalização das importações, afirmou Luciana Marques durante o 2º Seminário de Saneamento Básico organizado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Em meio às constantes reclamações ouvidas em relação à falta de recursos para investir no setor, Luciana Marques afirmou que grande parte dos valores previstos para investimentos não são liberados por falta de projetos. Isso ocorre pela própria ausência de projetos e também pela a inconsistência por parte dos planos apresentados.
Segundo dados da Caixa Econômica, só no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foram contratados R$ 14,7 bilhões desde 2007 para obras de saneamento, dos quais apenas R$ 5 bilhões, pouco mais de um terço do total, foram liberados.
Falta ao Brasil discernimento para aplicar bem os recursos e escolher suas prioridades, defende Marcos Thadeu Abicalil, especialista sênior em água e saneamento do Banco Mundial. De acordo com ele, para o Brasil alcançar suas metas de universalização do sistema até 2030 terá de dobrar o investimento atual.
Abicalil apresentou dois estudos, um da Associação Brasileira da Indústria de Base (Abid) e outro do Ministério das Cidades, segundo os quais seriam necessários, respectivamente, R$ 17 bilhões e R$ 13,2 bilhões por ano em investimentos para alcançar a universalização.
Segundo ele, os recursos para ampliar os investimentos precisam ser criados de alguma maneira. Eles terão de sair de um conjunto de medidas que ajudem a melhorar a produtividade dos operadores de saneamento, de subsídios ou do aumento de tarifas. "Todos os países que atacaram o problema de tratamento de esgoto o fizeram com subsídios, mas no Brasil o subsídio é só 20% do total", afirmou.
Segundo o técnico do Banco Mundial, o Brasil ainda não conseguiu resolver a "agenda velha" do saneamento e a universalização do serviço, que, de acordo com Abicalil, em algumas regiões enfrenta queda na taxa de população atendida porque não consegue avançar no mesmo ritmo da urbanização. Ao mesmo tempo, afirma, o país se vê obrigado a discutir a "agenda nova", que é a do desenvolvimento ambientalmente sustentável e também da tecnologia.
Abicalil relaciona a "agenda velha" com o estado de pobreza e de desigualdade social. De acordo com ele, o país precisa atacar o problema com urgência. Citou iniciativas isoladas, como a despoluição do Dique do Tororó, em Salvador, que não só melhorou a qualidade de vida como deu novo impulsio ao turismo na região, um dado importante para a economia da capital baiana.
Apesar de avanços como esse, segundo o técnico do Banco Mundial, o Brasil ainda enfrenta muitos problemas de saneamento e poluição que geram impactos diretos sobre a economia. "Vejam os relatórios sobre a impressão dos turistas para saber o que eles dizem do país. As reclamações são sobre lixo e poluição", comentou.
Segundo Abicalil, o Banco Mundial vai divulgar dentro de alguns meses um estudo sobre poluição que vai deixar os brasileiros "alarmados". Ele disse também que a instituição começará em breve um levantamento sobre as perdas causadas pela falta de saneamento no Brasil.
O especialista do Banco Mundial defendeu que o país passe a debater melhor o assunto para que fique mais claro o que é ou não prioritário. "No Brasil se fala muito em implantar redes de esgoto, mas não se discute a viabilidade de projetos para áreas de baixa densidade populacional".