Título: O anticlímax de mais de dois meses de espera
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 22/03/2007, Opinião, p. A18

Dois meses e meio depois de assumir o segundo mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda tenta completar um inevitável quebra-cabeças de quem pretende governar com o apoio de oito partidos, sendo que um deles, o PT, o seu próprio, já com articulações de tão longo prazo que quase suprimem do calendário os quase quatro anos que faltam para 2010, quando Lula termina seu último mandato. Ninguém imaginaria que essa pudesse ser uma equação fácil, mas o fato é que o presidente monta um novo ministério com os mesmos companheiros que o comprometeram no episódio do mensalão, no segundo ano de seu primeiro mandato, acrescidos do PMDB, com igual potencial de arrumar confusão. Fora isso, a oficialização do apoio do PDT coloca mais um numa longa lista que contraria a lei da física, de que dois corpos não conseguem ocupar o mesmo lugar ao mesmo tempo.

Excluídas as dificuldades inerentes a acordos para articular uma grande aliança, também é fato que o presidente Lula conseguiu apenas em raras oportunidades manter suas escolhas em um nível técnico adequado para tocar os projetos do segundo mandato. Os critérios para composição do ministério foram fundamentalmente políticos. Do ponto de vista técnico, o presidente manteve intocáveis dois ministros do primeiro mandato que foram formuladores de políticas fundamentais para o segundo mandato e responsáveis pela implantação de projetos e concepções de execução de políticas, o ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Patrus Ananias, e o ministro da Educação, Fernando Haddad. Colocar os dois ministérios na cota das negociações políticas seria comprometer os acompanhamentos de gestão que estão sendo implantados no MDS e adiar por mais tempo uma intervenção obrigatória na Educação. Além disso, Lula manteve, sem ser questionado, parte da equipe que atua na sua assessoria direta - a mais importante é a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Desse final melancólico da reforma ministerial sobram, portanto, um pequeno núcleo dos ministros da casa - a eles agregado Walfrido Mares Guia, que assumirá a Secretaria das Relações Institucionais com a ida de Tarso Genro para o Ministério da Justiça - mais dois executores de políticas sociais e o próprio Genro, que sem dúvida continuará a compor o núcleo dos estrategistas do governo. Ainda assim, mesmo resguardado por pessoas de confiança, o governo ainda passou pelo vexame da indicação do deputado Odílio Balbinotti (PMDB-PR), alvejado logo após a indicação por denúncias ainda frescas de falsificação de documentos. No mínimo, é um sinal de que a Agência Brasileira de Informações (Abin) continua operando com a mesma ineficiência de antes, submetendo o presidente da República a vexames evitáveis.

A outra enorme trapalhada do governo, na reforma ministerial, é a forma como dá um "jeitinho" de composição com o PSB, que ficou de fora das indicações. O anunciado "governo de coalizão" que prometia ministérios com "porteira fechada" aos partidos aliados está sendo obrigado a fatiar territórios para colocar mais porteiras, justo no momento em que anuncia total prioridade ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A idéia de desmembrar do Ministério dos Transportes uma Secretaria dos Portos, que serviria de compensação ao PSB, é a antítese de um programa que se pretende como globalizador. Pior que isso, coloca dentro dessa nova porteira o Porto de Santos, o mais cobiçado historicamente nas partilhas políticas de cargos - e alguma razão para isso deve ter. Leva de roldão a Codesp, o órgão que o controla.

Politicamente, além de alguma confusão, o que Lula efetivamente conseguiu foi ganhar a queda-de-braço com o PT. Fingiu-se de morto na disputa pela presidência da Câmara - que foi, de fato, uma demonstração de força do partido sobre o governo -, mas deu o troco resistindo a pressões para brindar a ex-prefeita Marta Suplicy com ministérios em que ela pudesse se projetar como candidata à Presidência pelo partido em 2010. Marta começa o segundo mandato como ministra do Turismo. É só.