Título: Asiáticas aproveitam mão-de-obra formada no Brasil
Autor: Campassi, Roberta
Fonte: Valor Econômico, 22/03/2007, Empresas, p. B2

Numa tarde de terça-feira, Sigrid Rath atende o telefone em sua sala, na sede da Qatar Airways, em Doha. Do outro lado da linha, onde o relógio ainda marca sete e meia da manhã, a repórter brasileira busca informações sobre a empresa. Os primeiros dois minutos da conversa são mantidos em inglês até que Sigrid muda o código: "Eu falo um pouquinho de português", diz, com sotaque estrangeiro e ao mesmo tempo pronúncia de Portugal. "Eu nasci no Rio de Janeiro", completa Sigrid, para o espanto de sua interlocutora.

Sigrid, que nasceu e morou no Brasil até os dois anos de idade, é filha de uma portuguesa e de um alemão. Morou a maior parte da vida na Alemanha e visitava com certa freqüência a família da mãe, em Portugal. Até que foi viver no Catar. "Há muitos empregos por aqui e os salários são altos", explica ela, que é a executiva de relações com a mídia da Qatar Airways, a companhia aérea nacional. Se ela gosta? "Bom, não é tão bonito como o Rio de Janeiro, mas é uma boa experiência."

Por mais curiosa e multicultural que seja a história de Sigrid, ela é bastante comum em alguns países do Oriente Médio. No Qatar, onde a população é de apenas 900 mil habitantes, não há profissionais nativos especializados em número suficiente para fazer frente a uma economia que cresce mais de 7% ao ano. Por isso, o pequeno país contrata mão-de-obra no exterior. Lá, 60% da população economicamente ativa é estrangeira, segundo uma pesquisa do Gulf Corporation Council (GCC), organização que congrega seis Estados árabes.

Se no caso das companhias aéreas o corpo de funcionários já tende a ser multicultural, nas empresas do Oriente Médio essa característica fica ainda mais forte. A Emirates, por exemplo, sediada em Dubai, voa para 59 países, mas emprega pessoas com mais de 100 nacionalidades diferentes.

A Emirates já ficou conhecida no Brasil ter recrutado ex-pilotos da Varig. Hoje, a companhia tem 200 tripulantes brasileiros, entre pilotos e comissários, mas o objetivo é chegar a 400, conta Ralf Aasmann, diretor da companhia para América Latina e Caribe. A Emirates realiza até o fim deste mês eventos de pré-seleção em Curitiba, Belo Horizonte e Brasília. Nos próximos meses, o mesmo trabalho será feito em outros países da América do Sul, como Bolívia, Paraguai e Venezuela.

A Qatar Airways, que tem expectativa de começar a voar para o Brasil em 2008, já realizou um processo seletivo no país para contratar 40 pilotos. "Mas sem dúvida vamos aumentar as vagas, porque compareceram 115 pessoas, muito bem qualificadas", disse Ian Gillespie, diretor da empresa para América Latina e Caribe. Além dos pilotos, 20 comissários de bordo brasileiros e 30 argentinos já estão contratados, mas o número tende a crescer em função da proximidade do início dos vôos. O Brasil tornou-se um lugar atraente para recrutar tripulantes, pelo tamanho do seu mercado de aviação e quantidade de profissionais com experiência, muitos dos quais perderam seus postos de trabalho com as crises da Varig, Transbrasil e Vasp.

A Air China é a exceção. Ao contrário da empresas do oriente médio, não tem nenhum brasileiro entre seus tripulantes. Nos vôos para o Brasil, todos os pilotos e comissários são chineses, devido a uma política da companhia. No aeroporto e no escritório em São Paulo, dos 14 funcionários, cinco são chineses.