Título: Indústria aumenta produção em março
Autor: Salgado, Raquel e Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 28/03/2007, Empresas, p. A3

O crescimento do mercado doméstico e o impulso extra da construção civil ajudaram a indústria brasileira a manter um bom ritmo de produção em março. Levantamento do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) mostra que 42% das 678 empresas ouvidas planejaram aumento de produção neste mês. É um número muito maior do que o verificado no mesmo período do ano passado, quando apenas um quarto delas estava produzindo mais.

E esse movimento não está restrito às companhias localizadas em São Paulo. A Papaiz, que produz fechaduras e cadeados, vai contratar mais 150 pessoas para sua fábrica de Salvador, após expandir a área de produção dessa unidade. "Fomos muito bem nesse primeiro trimestre do ano", comemora Sandra Papaiz, do conselho de administração da empresa.

Ela explica que apesar dos números de faturamento deste início de ano estarem parecidos com os de 2006, a qualidade desse crescimento é muito superior. "No ano passado, vendemos mais no primeiro trimestre porque tivemos aumento nos preços das matérias-primas e os nossos clientes se anteciparam ao reajuste." Neste ano, o aumento da demanda está bastante consistente, ancorado na forte expansão da construção civil.

O ritmo mais forte da indústria está ancorado em um mercado interno mais dinâmico, com renda e crédito ainda em expansão. A análise é do diretor do departamento econômico do Ciesp e vice-presidente do conselho de administração da Suzano Holding, Boris Tabacof. "Em 2005 crescemos apoiados no mercado internacional. No ano passado, isso mudou. Agora, o papel da demanda doméstica está ficando cada vez mais evidente", explica Tabacof.

Na Becton Dickinson (BD), da área de tecnologia médica, o faturamento cresceu entre 8% e 10% em relação ao mesmo período do ano anterior. "O mercado interno está indo bem", diz o presidente para a América do Sul da BD, Geraldo Barbosa. No trimestre, o crescimento deve ficar próximo de 10%. Ele atribui o bom resultado neste ano principalmente ao aumento da renda, e menos à queda dos juros, que continua gradual. O ambiente de estabilidade, com inflação baixa, também estimula as empresas a investir, diz ele.

O Ciesp compartilha da avaliação sobre os juros. "Por enquanto, o otimismo dos empresários não se deve à queda da Selic, já que os juros reais seguem em patamares muito elevados", diz Tabacof. O mercado externo, informa, continua preocupando os empresários. Segundo a sondagem da entidade, apenas 24% dos empresários esperam aumentar as vendas externas. É um percentual maior do que o de 2006 (13%), mas ainda pequeno. A maior parte das companhias, 41%, espera queda nas exportações, e 35% projetam manutenção.

Barbosa faz parte do time dos menos otimistas com o cenário externo. As exportações têm perdido peso no faturamento da BD. Elas recuaram de uma participação de 20% em 2004 para menos de 10%, devido à valorização do real.

O setor alimentício é outro a se beneficiar da continuidade do crescimento da renda e do emprego. A Village, que fabrica chocolates, panetones e bolos de páscoa, aposta em um incremento de 6% em suas vendas nesse início de 2007. Reinaldo Bertagnon, gerente comercial da indústria, diz que os varejistas estão animados com a Páscoa porque neste ano ela será justamente na semana do pagamento de boa parte dos consumidores. Bertagnon já está pensando no Natal, uma vez que suas vendas são bastante sazonais. "Vamos vender ainda mais. Já estamos sendo contatados pelo pessoal que quer comprar para exportar."

A General Motors (GM) também tem visto seus números crescerem puxados pelo mercado interno. A empresa informa que expandiu suas vendas em 10% no primeiro trimestre. No final do ano passado, por conta de promoções, muitos carros foram vendidos. O resultado foi falta de estoque em algumas concessionárias, especialmente dos modelos Corsa, Celta e Prisma. Ao contrário do que o Ciesp avalia, a montadora credita o bom desempenho à redução dos juros ao consumidor, o que facilita o financiamento. E espera um segundo trimestre ainda melhor.

São as maiores empresas, com 500 funcionários ou mais, como a GM, que estão mais confiantes na expansão econômica. A pesquisa do Ciesp aponta que 44% delas esperam fechar março com volume de produção maior do que o observado no mesmo mês de 2006. Ao mesmo tempo, são também as companhias de grande porte que menos esperam recuos. Apenas 4% apostam em queda na atividade. Nas empresas com até 100 empregados, esse dado sobe para 10%.

No setor de aços planos, dominado por grandes indústrias, o desempenho é vigoroso. O diretor-presidente da distribuidora Rio Negro, Carlos Loureiro, diz que, no primeiro bimestre, as vendas da rede distribuição cresceram 20% em relação ao mesmo período de 2006, percentual que se repete em março. Segundo Loureiro, o segmento de máquinas agrícolas, a indústria automobilística e de autopeças e as usinas de açúcar têm puxado a demanda por aços planos, assim como as usinas de açúcar, que consomem chapas grossas. "O estoque da distribuição está em queda há uns sete ou oito meses", afirma ele, para quem o bom resultado do setor se deve à queda dos juros e ao aumento dos investimentos em ativos fixos.

No setor de papelão ondulado, a demanda também segue bem, segundo o presidente da Indústria São Roberto, Roberto Nicolau Jeha. A expedição do produto deve fechar março com crescimento de 3% em relação ao mesmo mês de 2006. Segundo ele, o crescimento no trimestre deve ficar bem próximo deste percentual na comparação com janeiro a março de 2006. "É um desempenho melhor que o crescimento de 1,2% registrado pelo setor em 2006, embora a base de comparação seja fraca", diz Jeha.

Mesmo com essa ressalva, ele diz que a situação melhorou nos últimos meses. Para Jeha, a queda dos juros é um dos fatores por trás dessa recuperação. Ele acredita ainda que o fato de o crescimento ter se tornado a prioridade do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva também tem um papel nessa história, por criar um ambiente que incentiva os empresários a investir. Ele considera possível uma expansão de 4% a 5% neste ano, ressaltando o crescimento do agronegócio e da construção civil, que beneficiam indiretamente o segmento de papelão ondulado.