Título: Relação EUA-Brasil muda pouco após eleição
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 01/11/2012, Especial, p. A20

As eleições presidenciais da semana que vem deverão mudar muito pouco a política externa dos EUA para a América Latina e o Brasil, avaliam especialistas na região e diplomatas brasileiros. Para o Brasil, a perspectiva é de continuidade, seja quem for o eleito, graças a dezenas de parcerias assinadas nos últimos anos. O Palácio do Planalto avalia que o apoio de democratas e republicanos a projetos dos EUA com o Brasil impedirá mudanças sensíveis na relação entre os dois países. Empresários consultados pelo Valor também mostraram pouca preocupação com uma mudança de governo.

As diferenças entre as propostas dos dois candidatos e as chances de cada um são objeto da reportagem principal de "EU& Fim de Semana".

Eleição deve mudar pouco a relação entre EUA e Brasil

Por Alex Ribeiro | De Washington

As eleições presidenciais da semana que vem deverão mudar muito pouco a política externa dos EUA para a América Latina e o Brasil, segundo especialistas na região e lobistas que defendem interesses brasileiros em Washington.

Num eventual governo do republicano Mitt Romney, adversário do presidente Barack Obama, subiria a retórica contra regimes de esquerda, como Cuba e Venezuela. O republicano indicou que quer aprofundar laços comerciais com a região, mas é reduzida a chance de um acordo de livre comercio.

Para o Brasil, a perspectiva é de continuidade independentemente de quem for eleito, graças a dezenas de parcerias assinadas nos últimos anos, que estabelecem diálogo em áreas que vão da resolução de pendências comerciais ao combate à discriminação racial. "Talvez fosse o caso apenas de juntar todos os diálogos para evitar a fragmentação", afirma Celia Feldpausch, diretora-executiva da Coalizão Brasileira da Indústria (BIC).

"Com Romney, provavelmente veremos uma retórica mais dura contra a Venezuela e Cuba", diz Michael Shifter, presidente do Diálogo Interamericano, um centro de estudos de Washington. "Isso poderá aprofundar a divisão que já existe entre os EUA e a América Latina." Romney, diz, também parece menos interessado em mecanismos e entidades multilaterais.

"Vejo pouca energia no governo Obama para se relacionar com a América Latina", diz Roger Noriega, pesquisador do American Enterprise Institute (AEI), outro centro de estudos de Washington, e que foi responsável pela região no no governo George W. Bush. "Obama fracassou em construir boas relações pessoais com a presidente Dilma Rousseff, como as que Bush construiu com Lula."

Há quatro anos, quando Obama foi eleito, um dos principais pontos na agenda brasileira nos EUA eram barreiras comerciais a produtos como etanol, suco de laranja e aço. Hoje, boa parte dessas questões está encaminhada, embora existam pendências, como o subsídio americano ao algodão e a análise da liberação da carne bovina.

"Um assunto prioritário é o fim da exigência de visto para viagens", diz Diego Bonomo, diretor de políticas da seção americana do Conselho Empresarial Brasil-EUA. "É importante também pelo simbolismo de colocar o Brasil no grupo seleto de países que recebem esse tratamento diferenciado."

No debate sobre política externa entre os candidatos a presidente, a América Latina foi citada apenas uma vez, por Romney. "A América Latina é quase tão grande quanto a China", disse ele. "É uma enorme oportunidade para nós."

Especulou-se que Romney está interessado em reabrir a negociação de uma área de livre comércio nas Américas. Mas continua presente o mesmo clima que, anos atrás, impediu progressos, como a resistência dos americanos em cortar subsídios agrícolas e a pouca disposição do Brasil de expor a sua indústria à concorrência.

O ambiente econômico também contribui pouco, com acusações mútuas de protecionismo. O Brasil reclama que a expansão monetária americana desvaloriza o dólar e cria condições desiguais de competição, enquanto os EUA veem protecionismo em medidas recentes de defesa comercial adotadas pelo governo brasileiro.

No comércio, lobistas brasileiros nos EUA indicam, de forma reservada, a preferência por Romney. Para eles, os republicanos em geral defendem políticas mais pró-negócios e são menos refratários a medidas de abertura comercial.

"O aprofundamento das relações comerciais com a América Latina faz parte do plano de Romney para criar empregos e recuperar a economia doméstica", diz Noriega, que não atua na campanha, mas fez contribuições indiretas ao programa do republicano.

Uma questão num novo mandato de Obama é quem substituirá Hillary Clinton do Departamento de Estado. "Ela tem dado atenção especial à America Latina", diz Shifter. Um dos cotados, o senador John Kerry, já mostrou interesse em melhorar a relação com Cuba.