Título: Super Receita vai à sanção presidencial
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 14/02/2007, Política, p. A5

Um ano e meio depois da edição da medida provisória que criou a Receita Federal do Brasil - a chamada Super Receita - e perdeu a validade por decurso de prazo, a Câmara dos Deputados aprovou ontem em definitivo o projeto de lei do governo que unifica as secretarias da Receita Federal e da Receita Previdenciária.

O projeto agora vai à sanção presidencial. As centrais sindicais e sindicatos dos funcionários da Receita e do INSS pressionam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que ele vete um dos pontos da medida: o que tira da autoridade fiscal a atribuição de reconhecer relação de trabalho entre empresa e contratado, definindo se há ou não vínculo empregatício. Pelo texto, essa decisão caberá à Justiça do Trabalho.

Incluída no projeto pelo Senado, essa emenda foi aprovada ontem pelos deputados por 304 votos a favor e 146 contra, depois de muita polêmica. Na véspera, o governo tentou um acordo com os partidos para votar apenas o texto-base do relatório do deputado Pedro Novais (PMDB-MA) e adiar a votação das emendas para depois do Carnaval.

Mas não houve acordo. Defensor da medida, o PFL ameaçou não votar o texto sem a garantia de sua aprovação. De acordo com o líder da bancada pefelista, Onyx Lorenzoni (RS), a emenda protege o contribuinte. "Sem essa emenda, o texto permite que um fiscal ingresse em qualquer empresa e, contrariando a Constituição - que concede esse poder apenas à Justiça do Trabalho -, possa validar ou não a relação de trabalho", disse.

A possibilidade do veto foi admitida pelo deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), vice-líder do governo, se ficar constatada a inconstitucionalidade desse ou de outros dispositivos. Se isso ocorrer, o governo poderá propor a regulamentação das relações contratuais entre uma empresa e um trabalhador pessoa jurídica para prestar o serviço.

Para Albuquerque, há consenso sobre a necessidade de regulamentar essas relações contratuais entre empresas. "O que veio para a Câmara foi um texto do Senado. Se ele não está perfeito, do ponto de vista constitucional, temos de buscar uma solução para regulamentar essa realidade", afirmou.

O Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Unafisco) e a Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Previdência Social (Anfip) apontam inconstitucionalidade. Para o Unafisco, a atribuição do Fisco de desconsiderar a personalidade jurídica é instrumento fundamental para o combate à sonegação de tributos e à formação de "empresas de fachada". As centrais sindicais já se manifestaram, ontem, o desejo de que o presidente Lula vete esse item, sob o argumento de que a emenda abre mais espaço para a precarização do mercado de trabalho no país, ao retirar dos fiscais o poder de diagnosticar e definir se há vínculo de trabalho entre uma empresa e um trabalhador e remeter essa questão para a Justiça.

PSDB e PMDB ficaram favoráveis à emenda do Senado. O governo liberou sua bancada, que se dividiu. O PT ficou contra. "Essa é a primeira vitória da oposição depois de sucessivas derrotas", disse o deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP).

Na votação de ontem, os deputados rejeitaram emenda dos senadores - que havia sido acolhida pelo relator - segundo a qual o nome do secretário da Receita Federal do Brasil teria de ser aprovado pelo Senado, após sabatina, como acontece com o presidente do Banco Central.

O projeto de lei foi enviado ao Congresso em novembro de 2005, na gestão do então ministro Antonio Palocci (Fazenda), depois que a MP unificando as estruturas da Receita Federal e da Receita Previdenciária perdeu a validade por não ter sido votada no prazo constitucional de 120 dias. A Receita vem se preparando desde então para absorver a nova estrutura. Segundo estimativa do governo, a maioria dos dispositivos previstos no projeto entrarão em vigor em até 30 dias.

Segundo exposição de motivos assinada por Palocci e ministros Paulo Bernardo (Planejamento) e Nelson Machado (Previdência), a medida tem o objetivo de "reorganizar a administração fazendária da União por meio da simplificação de processos e de outras medidas de eficiência, de modo a incrementar a arrecadação de tributos e contribuições federais".

O governo nega que a unificação das estruturas vá significar aumento da carga tributária. Mas espera que a "racionalização" do sistema resulte em melhoria do combate à sonegação, ao contrabando e outras formas de evasão fiscal.