Título: Secretaria de Micro e Pequena Empresa é aprovada na Câmara
Autor: Giffoni, Carlos ; Martins, Daniela
Fonte: Valor Econômico, 08/11/2012, Política, p. A12

Sob intenso lobby da Central Única dos Trabalhadores (CUT), o plenário da Câmara aprovou nesta ontem o texto-base do projeto que cria da Secretaria da Micro e Pequena Empresa. O texto passou em votação nominal por 300 votos favoráveis, 45 contrários e uma abstenção.

A secretaria, segundo o projeto de lei enviado pelo Executivo, terá status de ministério - o que vai possibilitar a negociação de mais uma Pasta com os partidos da base aliada ou ainda a aproximação de algum partido ao governo. Já se diz que a criação de um novo ministério seria a forma de trazer o PSD, partido que conseguiu eleger o quarto maior número de prefeitos nas últimas eleições, para a base governista.

A pasta, que estava no plano de governo de Dilma Rousseff durante a campanha presidencial em 2010, tinha como favorita a empresária Luiza Trajano (Magazine Luiza). Agora, no entanto, crescem nomes ligados ao PSD, entre os quais o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção, Paulo Safady, da senadora Katia Abreu (PSD-TO), do vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, e do próprio presidente do partido e prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab.

O projeto estabelece a criação de um cargo de ministro, um cargo de secretário executivo e mais 66 cargos comissionados. São duas vagas a menos que o previsto na proposta original enviada pelo Executivo. Em seu parecer, o relator na Comissão de Finanças e Tributação, deputado Júnior Coimbra (PMDB-TO), afirmou que a redução foi feita para adequar a proposta à lei orçamentária.

A CUT engrossou a pressão pela Pasta por identificar no setor um potencial de geração de empregos posto de lado pelas políticas de governo.

De acordo com a Receita Federal, existem 6,8 milhões de micro e pequenas empresas no país, que representam 99% do total de empresas brasileiras. Levantamento realizado pelo Sebrae, que apoia pequenas empresas, mostra que 52% de todo o emprego formal do país estão nessas empresas.

Para Sérgio Nobre, secretário-geral da CUT, as políticas de incentivo à atividade adotadas no último ano pelo governo, principalmente na indústria, não contemplam as pequenas empresas que, apesar de sua representatividade no emprego do país, são as que mais sofrem com a perda de competitividade. "Com a globalização, os produtos são cada vez mais "fatiados" e as pequenas empresas têm dificuldade de viver nesse ambiente. Elas precisam de políticas exclusivas", diz.

Segundo o projeto de lei 865, o ministério será vinculado à Presidência. Entre suas atribuições estarão o assessoramento na formulação e coordenação de diretrizes para apoio a empresas de pequeno porte, artesanato e cooperativismo urbano, e de fortalecimento, expansão e formalização. O impacto orçamentário estimado é de R$ 7,9 milhões anuais. O ministério vai centralizar as atribuições que, hoje, são de competência do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).

Entre hoje e sábado, a CUT reúne representantes da indústria, sobretudo de pequenas empresas, em um seminário na capital paulista. O objetivo do Encontro Nacional do Macrossetor Indústria, que também contará com a participação de um representante do governo federal - ainda não definido -, é redigir uma carta reforçando o pedido de criação do Ministério da Micro e Pequena Empresa e construir uma agenda de defesa das pequenas empresas, explica Nobre. O documento será baseado na realidade dos metalúrgicos, químicos e trabalhadores da indústria do vestuário e da construção da CUT.

O dirigente da central afirmou ao Valor que várias empresas de pequeno porte têm procurado a CUT para reclamar das dificuldades de conseguir benefícios que as ajudem a superar a crise, diante da concorrência acirrada pelo mercado brasileiro, e existe a ameaça disseminada de falências.

Modesto Cáceres é dono da Lenor, fabricante de peças para a indústria e corre o risco de ter que reduzir em 20% o seu quadro de funcionários até o fim do ano. "As empresas estão comprando menos de mim. Ainda não demiti, mas há trabalhadores ociosos. O máximo que consigo segurar é até o fim do ano", diz. A Lenor tem cerca de 50 funcionários. "O governo deveria dar mais apoio às pequenas empresas. Para eu comprar uma máquina importada e poder produzir mais, tenho que pagar imposto. É incoerente. Tudo o que você faz esbarra em taxas e tributos."

Renato Cicarelli, dono de uma fabricante de autopeças, também questiona a carga tributária. "Às vezes, para saldar uma dívida, você atrasa o pagamento de um imposto. E isso impede a obtenção de crédito do governo. As pequenas empresas têm pouco acesso às linhas de crédito do BNDES."

O emprego na indústria rasteja neste ano. À exceção de fevereiro e julho, todos os outros meses apresentaram queda do pessoal ocupado, sempre na comparação dessazonalizada com o mês anterior. Em agosto (último dado disponível), essa queda foi branda, de 0,1%, de acordo com a Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário do IBGE. No entanto, a queda acumulada no ano é de 1,4%. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) já declarou que espera fechar o ano com cerca de 80 mil empregos a menos que em 2011, o que representará uma queda de 3% no estoque de trabalhadores na indústria de transformação paulista.

"A pequena empresa ficou à margem do Programa Brasil Maior. O benefício para a micro e pequena empresa deve ser feito via carga tributária. O sistema integrado de imposto [Simples], de simples não tem nada. É uma infinidade de tabelas e cálculos a serem feitos", diz Hitoshi Hyodo, diretor do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) de São Bernardo do Campo.

Outra dificuldade apontada por Nobre é a certidão negativa de débito, rara entre pequenas empresas, afirma. Para a obtenção de alguns benefícios cedidos pelo governo, como a compra de produtos nacionais, ou linhas de crédito, a empresa precisa da certidão. "Não faz sentido. É como se você precisasse comprovar que é saudável para ter acesso ao sistema de saúde. Do modo como é feito, uma empresa com dificuldades não tem acesso a benefícios que poderiam ajudá-la, justamente por estar em dificuldades", diz.

O secretário-geral da CUT aponta a burocracia e a complicada legislação tributária como agravantes para as pequenas empresas em dificuldade, que, na maior parte dos casos, não conseguem manter um departamento para cuidar dos tributos. "Se a característica do Brasil é ter pequenas empresas, as empresas precisam se organizar, assim como fazem as empreiteiras. O ministério será um canal para aumentar a sua competitividade", afirma Nobre.

Para Antonio Ribeiro, gerente de recursos humanos da fabricante de autopeças Itaesbra, no ABC paulista, faltam meios para investir em qualificação - e sobra burocracia. "Para competir, preciso investir em qualificação de mão de obra. Mas como posso investir tendo de arcar com tamanha carga tributária?", diz. Segundo ele, um trabalhador da Itaesbra que receba um salário de R$ 1,8 mil custa R$ 1,9 mil adicionais. Ribeiro ainda destaca os esforços necessários para reter a mão de obra qualificada instalada na empresa. "Por R$ 100 a mais no salário, os funcionários saem. Não consigo criar uma cultura da empresa", diz.