Título: Pressão cresce por reforma política na China
Autor: Anderlini, Jamil
Fonte: Valor Econômico, 08/11/2012, Internacional, p. A14

Quando o presidente da China, Hu Jintao, discursou no 17º Congresso do Partido Comunista, cinco anos atrás, pronunciou a palavra "minzhu" (democracia) 69 vezes. Além de falar sobre democracia participativa, democracia socialista e democracia "intrapartidária", Hu explicou como o partido estava construindo "um país socialista rico, forte, democrático, civilizado, harmonioso e moderno".

Quando o 18º Congresso do PC tiver início, hoje, Hu subirá ao pódio tendo pela frente apenas uma semana como líder de um partido que está mais rico, mais forte e mais moderno, e que tem dez milhões de membros a mais que há cinco anos. Mas, para a maioria dos governados por esse fechado partido leninista, o país mais populoso do mundo não está mais democrático nem mais harmonioso do que cinco anos atrás.

Após 30 anos de amplas reformas econômicas e taxas anuais de crescimento perto de 10%, o partido sofre pressões para reformar um sistema que nunca esteve tão autoritário e opaco desde o massacre da Praça Tiananmen em 1989.

"Hoje, a coisa mais importante é a reforma política", diz Ren Yi, neto do ex-líder reformista Ren Zhongyi. "Todos os chineses, incluindo aqueles que estão dentro do sistema, concordam que este precisa ser o próximo grande passo."

Outro jovem príncipe (modo como os filhos de altas autoridades são chamados) diz sem meias-palavras: "O melhor período para China acabou, e todo o sistema precisa ser reformado". Este filho de um ex-ministro diz que a autoridade do partido está "declinando ao mesmo tempo em que o cenário econômico piora". E acrescenta que, sem regras novas, a política chinesa "mergulhará no caos".

O crescimento econômico anual da China caiu de 12%, no começo de 2010, para cerca de 7,5%. Talvez como efeito disso, a crença de que o país precisa reorganizar sua estrutura política autoritária vem se disseminando de modo surpreendente entre aqueles que mais se beneficiaram do sistema.

Até o "Diário do Povo", porta-voz oficial do PC, disse em editorial, nesta semana, que "à medida que aumenta a consciência do público sobre o direito de saber e participar, e também sobre o Estado de direito, vemos que a democracia na China não alcançou o nível que muitas pessoas esperam".

Com a nova geração, liderada pelo futuro presidente Xi Jinping, prestes a assumir a direção do partido na semana que vem, percebe-se alguns sinais de que eles podem estar dispostos a permitir uma maior liberdade política.

Um grupo crescente de conselheiros graduados do partido alerta que, se ele não tomar esse caminho, a própria sobrevivência do regime poderá ser ameaçada.

O Departamento de Organização, que cuida das promoções no partido, ordenou neste ano a realização de um estudo sobre como Taiwan e Coreia do Sul passaram de regimes militares autoritários em democracias prósperas nas décadas de 80 e 90. Segundo fontes, pediu-se aos acadêmicos que elaboraram o relatório que examinassem como essa transformação seria relevante para a China.

Li Yuanchao, chefe do Departamento de Organização, era visto até há pouco como favorito a uma vaga no Comitê Permanente do Politburo, o grupo de elite que governa a China. Como autoridade de província, Li participou de um programa de treinamento na Universidade Harvard e também fez experiências com eleições de autoridades de escalões mais baixos.

Nos últimos dias, fontes políticas vêm dizendo que rivais conseguiram impedir que Li, um aliado de Hu, fosse promovido ao Comitê Permanente. Mas outros insistem que suas chances serão melhores se o partido permitir que um pequeno grupo de autoridades do alto escalão vote numa eleição interna, ainda que muito limitada.

Seria um pequeno passo rumo à democracia "intrapartidária", uma mudança que muitos na China veem como possível precursora de reformas políticas mais amplas. Mas essa pequena e incremental medida está longe de certa.

"É uma questão de legitimidade e apoio popular para o partido", diz Susan Shirk, especialista americana em política chinesa. "Eles precisam mostrar que estão se movendo rumo à democracia - mas têm muito medo de perder o controle."

Regimes fechados como Vietnã e Mianmar adotaram disputas políticas abertas, a portas fechadas. Para desgosto dos líderes chineses, que proibiram debate público sobre as políticas dos dois vizinhos.

"Quem quer que promova a reforma política [na China] ganhará um capital político enorme e ganhará a estima do povo, e isso é um grande incentivo", diz Ren. Mas a maioria dos defensores da reforma não acredita que os novos líderes serão mais bem-sucedidos que os que estão de saída (Hu e o premiê Wen Jiabao), na implementação de mudanças políticas reais.

Eles apontam para os pedidos públicos cada vez mais melancólicos de Wen por mais democracia e liberdade política nos últimos anos, sendo que alguns deles foram censurados pelas poderosas autoridades da área de propaganda.