Título: Revisão de contratos divide os especialistas
Autor: França , Martha San Juan
Fonte: Valor Econômico, 30/10/2012, Especial, p. F1

O impacto da Medida Provisória 579 sobre os investimentos em energias renováveis, anunciada no começo do mês pela presidente Dilma Rousseff, divide os especialistas. A MP definiu a redução da tarifa de energia no país em 16,2% para as residências e em até 28% para as indústrias, a partir do ano que vem. Isso, considerando o corte de três encargos setoriais que incidem sobre a conta de luz e de novas exigências para a renovação dos contratos das concessionárias de geração, transmissão e distribuição de energia, que vencem em 2015. A prorrogação será feita com a depreciação dos ativos das hidrelétricas e linhas de transmissão e distribuição que já estavam amortizados.

Para Nivalde José de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico do Instituto de Economia (Gesel), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), "a reforma do setor elétrico apenas regula o processo de renovação das concessões para exploração de hidrelétricas das empresas que terminam em 2015, que estavam ganhando como se elas fossem novas. Isso poderá ter impacto significativo na manutenção de suas rentabilidades em um contexto de tarifas mais reduzidas, mas não afeta o modelo energético e os leilões de energia nova que investem nas outras fontes renováveis", disse.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deverá calcular os valores de reversão aos quais as empresas têm direito, uma vez que nem todos os investimentos teriam sido remunerados ao final do contrato. Também precisam ser calculados os valores das novas tarifas das concessionárias para cobrir os custos de operação e manutenção dos ativos. Para o físico José Goldemberg, a diminuição das receitas das concessionárias deverá afetar mais fortemente as empresas estatais que precisarão reduzir os custos operacionais e que, de qualquer maneira, não estavam investindo muito nas renováveis.

"É preciso ver o efeito do pacote nas privadas que estavam apostando nas novas tecnologias, como por exemplo a solar fotovoltáica, como oportunidade de negócios", afirma Goldemberg. "Mas acredito que ainda é cedo para analisar o panorama. Cada empresa deverá rever seus investimentos caso a caso." Com o término das eleições, estará na pauta do Congresso a análise das mais de 400 emendas propostas à medida provisória.

A diminuição dos encargos tributários, por sua vez, foi bem recebida até mesmo pelas entidades ambientalistas. Para Ricardo Baitello, do Greenpeace, a medida é justa com os consumidores que pagam muito mais por sua energia do que em outros países. Ele defende, porém, que deveria vir acompanhada de uma visão estruturante que beneficiasse o desenvolvimento de fontes renováveis.

Baitello lembra que o modelo energético baseado em usinas de grande porte, distantes dos centros de consumo, tende a aumentar os gastos com a parcela de transmissão e de distribuição, atualmente responsável por 30% da conta de luz. E a mudança pode impactar o mercado de energia renovável, mais distribuído, justamente o caso da geração de energia solar no Luz para Todos e das usinas do Proinfa, fundo voltado ao desenvolvimento de energias alternativas.

Segundo Gilberto de Martino Jannuzzi, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do International Energy Initiative para a América Latina, a extinção das taxas é bem-vinda, mas deveria avançar mais. "Essas e outras taxas são difíceis de rastrear, não temos como saber exatamente para onde estão indo esses recursos", afirma. "Esses encargos existiram durante vinte, trinta anos e não sabemos quase nada do seu impacto. É preciso haver um processo de transparência e de prestação de contas dos investimentos feitos para que tenham credibilidade." (MSJ)