Título: Pista sinuosa
Autor: Cotias, Adriana e Camba, Daniele
Fonte: Valor Econômico, 19/01/2007, EU & Investimentos, p. D1

O impasse sobre o rumo das concessões de estradas federais virou de ponta-cabeça a percepção dos analistas para as ações da Companhia de Concessões Rodoviárias (CCR) e da OHL. As últimas declarações do ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, garantindo a continuidade dos processos de licitação de novos trechos, até atenuaram o ruído provocado uma semana antes pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, mas foram insuficientes para dirimir as dúvidas a respeito da geração futura de caixa das companhias. Até que o mercado tenha mais clareza sobre como será o modelo tarifário, os papéis vão ser negociados com muita volatilidade. Mas há quem considere o setor promissor e que o risco é válido.

Na semana passada, a ministra chegou a afirmar que as concessões de sete trechos, incluindo Fernão Dias, que liga São Paulo a Minas Gerais, e Régis Bittencourt, que liga os Estados do Sul com o Sudeste, seriam suspensas. Como já havia um cronograma de licitações aprovado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e a programação era dada como certa, o mercado não perdoou o passo atrás e as ações ordinárias (ON, com direito a voto) da CCR e da OHL caíram 4,29% e 8%, pela ordem, do dia 10 até terça-feira. Só a partir de quarta-feira, quando Passos sinalizou que os processos podem ser retomados após parecer de um novo grupo de estudos é que os papéis esboçaram recuperação, neutralizando o chamado efeito Dilma.

Passos acenou, porém, com mudanças nas licitações sem dar pistas sobre que pontos devem ser revistos. Como o sentimento é de que a principal divergência com a Casa Civil diz respeito aos pedágios, é por aí que podem vir alterações, diz o gerente de análise da Modal Asset Management, Eduardo Roche. "Se for uma proposta ruim, isso pode pesar em outros investimentos, mas pelo menos houve a indicação de que o processo será retomado." Em meio ao jogo de expectativas, ele prefere ficar fora dos papéis da CCR e da OHL.

Descartando o peso das futuras licitações, Roche considera o investimento em CCR como uma opção mais interessante, já que a empresa vem diversificando a sua atuação tanto regionalmente, disputando licitações fora do Brasil - nos Estados Unidos e México -, como avançando por novas linhas de negócios. Ironia do destino, a CCR venceu, por exemplo, a licitação para operar a Linha 4 do Metrô de São Paulo. Agora prevê-se que a geração de receitas esperada com o negócio atrase após o acidente ocorrido na semana passada na Marginal do Rio Pinheiros, diz o chefe de análise da HSBC Corretora, Fábio Zagatti.

A conquista de novos trechos rodoviários faz parte do planejamento de expansão de ambas as companhias, mas a OHL - equivalente a um quinto da CCR em faturamento - sofre mais porque tem uma dependência maior de novas concessões para expandir suas atividades. A CCR faturou R$ 1,577 bilhão nos nove primeiros meses do ano passado. No mesmo período, as receitas da OHL atingiram R$ 308 milhões. A OHL tem atuação bastante concentrada no interior de São Paulo e precisa de novas concessões para se tornar uma empresa maior e atrair atenções na bolsa, diz um analista.

Mesmo no pior cenário, em que o governo federal aborte a concessão dos sete trechos, as empresas podem buscar outras opções para crescer, diz a chefe de análise da Ativa Corretora, Mônica Araújo. "O programa federal é uma das formas para este crescimento, mas ainda há as rodovias municipais e estaduais, principalmente em São Paulo." A expectativa é de que as concessões paulistas saiam do papel durante o mandato de José Serra.

Uma frente alternativa para as companhias é o mercado secundário, em que uma empresa compra as concessões de outra, acrescenta Mônica. Ela destaca que tanto CCR quanto OHL são bem administradas, fazem parte de grupos empresariais fortes e proporcionam um nível elevado de retorno aos acionistas. Por tudo isso, valeria o risco de ter as ações em carteira.

O governo não pode abrir mão do dinheiro privado para novos investimentos em infra-estrutura e, passado o bafafá político, as ações da CCR podem deslanchar, diz o chefe de análise da Link Corretora, Adriano Blanaru. Na pior das hipóteses, se tudo desandar, o atraso de novos investimentos poderia engordar a fatia de dividendos a ser distribuída aos acionistas. "Alguns investimentos feitos no passado já maturaram, gerando um fluxo de caixa bem constante e o 'dividend yield' (o retorno em dividendos) já começa a subir." Ele projeta um retorno anual na casa dos 6%, 7% para os papéis.

Tanto CCR quanto OHL são empresas rentáveis com o atual tamanho que têm. Isso quer dizer que seus caixas não seriam afetados por um eventual naufrágio das licitações de novos trechos federais. Com a dúvida semeada por Dilma, a Fator Corretora rebaixou a indicação para os dois papéis de "atraente" para "manutenção." As estimativas de preços das ações não foram, porém, alteradas porque não incluíam as receitas provenientes de novas concessões, diz o analista Renato Onishi. Para CCR ON, o preço justo de R$ 27 foi ultrapassado ontem, após o papel fechar cotado a R$ 27,87. OHL, cotada a R$ 31,50, ainda pode andar 9,5% e chegar a R$ 34,50 até dezembro.

Nos atuais preços em que estão, as ações da CCR e da OHL já refletem novas concessões e com retornos atraentes, considera o analista do UBS Pactual, Gustavo Gattass. Mas o cenário mudou. "Sem os trechos federais, haverá uma competição muito maior pelas municipais e estaduais, o que significará taxas de retornos menores para as companhias." (Colaborou Danilo Fariello)