Título: Demanda eleva renda e emprego na construção
Autor: Watanabe, Marta e Salgado, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2007, Especial, p. A16

Depois de procurar trabalho durante dois anos, o baiano Inácio de Oliveira finalmente conseguiu emprego em 2004. Na época, o pedreiro foi registrado para ganhar R$ 300 mensais. Desde então passou de obra em obra com o uniforme azul e o capacete amarelo da mesma empresa de impermeabilização. O salário, porém, aumentou para R$ 800, o que significa uma elevação real de cerca de 150%. Para ele, não foi uma questão de sorte individual. Ele percebe que seus colegas também ocupam vagas com mais facilidade. "Hoje só não trabalha quem não quer."

Os últimos três anos de trajetória do pedreiro de 60 anos, natural de Mirangaba, refletem o desempenho da construção civil. "Após um período de retração entre 1999 e 2003, o setor começou a crescer a partir de 2004", diz o presidente do sindicato dos trabalhadores da construção civil do Estado de São Paulo, Antonio de Sousa Ramalho. O maior aumento de emprego no último triênio ocorreu no ano passado, com alta média de 7,3% no país. Por demandar mão-de-obra intensiva, o índice supera o crescimento de 4,5% do próprio setor.

Algumas regiões do país, porém, apresentaram expansão bem maior que a média. Os índices mais surpreendentes são do Maranhão, Rio Grande do Norte e Amazonas. Nos dois primeiros Estados, o emprego na construção civil aumentou, respectivamente, 18,1% e 23,6% em relação a 2005. Os números, medidos pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), mostram a força do setor nestes Estados, pois no Nordeste o crescimento médio foi de 5,5%.

No Rio Grande do Norte, o incremento do emprego com carteira na construção civil foi mais de três vezes superior à média nacional, com geração líquida de 4,3 mil postos. O resultado desse avanço é a falta de mão-de-obra para os empreendimentos que não param de pipocar no Estado, especialmente em Natal e arredores.

Por conta disso, o governo do Estado lançou um programa de qualificação para trabalhadores do setor. "Servente, que é o trabalhador que carrega as pedras, até temos bastante. O problema é achar os mais especializados, como carpinteiro e armador", explica Sílvio Bezerra, presidente do Sinduscon-RN e diretor comercial da Ecocil, incorporadora e construtora. A maior demanda ajudou a elevar os salários. Os serventes tiveram reajuste de 17% em 2006 e os profissionais mais qualificados, 15%, números bem acima dos 3,1% de inflação em 2006.

O aquecimento no Estado se deu tanto por obras residenciais como por projetos ligados ao turismo, como resorts, pousadas e hotéis. "Os europeus descobriram o Nordeste nos últimos anos. Muitos vêm para cá de férias e depois compram flats e apartamentos nas praias", conta Bezerra. Atualmente, saem 24 vôos de Natal por semana para a Europa, entre regulares e charter. A TAP tem um vôo diário para Portugal. "E ele está sempre lotado", afirma.

Os dados do Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (Snic) mostram que o consumo aparente de cimento avançou 17% em 2006 no Rio Grande do Norte, acima dos 8,2% da média nacional. E esse crescimento veio após outro ano de expansão forte, já que em 2005 o consumo desse produto foi 11% maior em relação ao ano anterior.

Projetos de grupos espanhóis e portugueses além do das empresas brasileiras têm consumido todo esse cimento. Bezerra conta que um desses grupos começará neste ano a construção de um resort que empregará cerca de 1,5 mil pessoas. "E é um empreendimento para mais de cinco anos de trabalho".

Com desempenho semelhante ao do Rio Grande do Norte, o Maranhão também apresenta aumento consistente de consumo aparente de cimento nos dois últimos anos, com elevação de 9% em 2005 e 19,9% no ano passado.

A pesquisadora Amaryllis Romano, da Tendências Consultoria, diz que o setor de construção civil mostra um crescimento generalizado em todo o país, mas há um aumento puxado pelo Norte e Nordeste. Nessas duas regiões, as obras são impulsionadas pelo turismo e obras de infra-estrutura.

Além disso, há também o efeito de maior renda disponível em algumas regiões, que ajuda a puxar os empreendimentos residenciais e a auto-construção. Isso acontece, segundo Amaryllis, no Norte, Nordeste e, no Sudeste, principalmente em Minas Gerais, com a renda adicional propiciada pela siderurgia e setor sucro-alcooleiro.

Beneficiado pela expansão do setor imobiliário, o pedreiro Inácio de Oliveira não só conseguiu um emprego como também promete engrossar os chamados "puxadinhos". Depois de pintar a casa este ano, o baiano planeja construir mais três cômodos e transformar em sobrado a casa levantada por ele mesmo em terreno cedido pela prefeitura paulistana.

Na região Norte, o destaque fica por conta do Estado do Amazonas, onde o emprego cresceu 17,7% no último ano. O secretário de Finanças da prefeitura de Manaus, Onildo Elias Castro Lima, diz que o setor cresce principalmente na região da Zona Franca e arredores. "A construção civil impulsionou a economia local e foi uma das responsáveis pelo crescimento de mais de 16% na arrecadação de ISS". diz. "Para se ter uma idéia do crescimento do setor, basta dizer que em 2004 havia 400 mil metros quadrados licenciados para construção. Em 2006 esse número saltou para seis milhões de metros quadrados", conta Lima.

Cláudio Guenka, superintendente do Sinduscon do Amazonas, diz que o setor apresentou aquecimento a partir de 2006, com o lançamento de vários empreendimentos comerciais e residenciais. Ele conta que, no ano passado, quando grandes obras foram lançadas na região da Zona Franca, houve falta de engenheiros civis e empregados da construção civil ligados a serviços.

Segundo o sindicato, até agosto de 2006, a Caixa Econômica Federal havia liberado R$ 51,3 milhões para financiamento habitacional no Amazonas, número que já superava em 58% os recursos liberados em todo o ano de 2005. "Para 2007, a expectativa é que o setor cresça com obras públicas, como o projeto de habitações populares do governo estadual."

Roberto Bernardes, presidente do sindicato dos trabalhadores da construção civil do Amazonas, confirma o aquecimento. "O setor vive hoje o melhor momento dos últimos cinco anos", diz. "Há também muitos trabalhadores vindos de outros Estados, principalmente do Ceará, Maranhão e Pará."