Título: Caso da operadora levanta dúvidas sobre oferta para minoritários
Autor: Moreira, Talita
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2007, Empresas, p. B3

O debate sobre o direito dos minoritários de participar do prêmio de controle está prestes a registrar um novo capítulo. Trata-se da antiga novela em torno do chamado tag along, que carece de um caso prático para balizar o mercado em situações de controle compartilhado. A definição do futuro da Vivo poderá ser a experiência que faltava.

O comando da maior operadora de celular do Brasil é dividido entre Portugal Telecom e Telefónica. As conversas entre os acionistas sobre um possível negócio começaram na semana passada, depois do clima entre eles ter ficado impraticável.

Embora o tema seja alvo de controvérsias entre advogados especializados em legislação societária, os investidores já atribuíram prêmio às ações ordinárias da companhia. O preço dos papéis com direito a voto está cerca de 120% maior que o dos preferenciais, conforme o fechamento de ontem da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).

É possível que a definição do controle da Vivo se torne referência para as próximas operações no setor e também em outros ramos da economia. As companhias de telefonia têm, em sua maioria, o controle dividido entre dois ou mais sócios. Tal modelo é fruto da formação dos consórcios para privatização ou de negócios que vieram a seguir.

A primeira discussão sobre o assunto surgiu quando a Telecom Italia, minoritária no bloco controlador da Brasil Telecom, esteve perto de comprar a fatia dos sócios majoritários, fundos de pensão e Citigroup. O negócio, entretanto, não se concretizou e a operadora permanece à venda.

A Lei das Sociedades por Ações é breve no artigo em que trata do tema, limitando-se a informar que a alienação de controle direta ou indireta prevê a realização de oferta aos minoritários de ações ordinárias por 80% do valor pago por papel do bloco controlador. Por não prever as transações dentro do próprio bloco controlador, a legislação dá margem a dúvidas.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) está ciente da polêmica e já afirmou mais de uma vez que avaliará a necessidade de oferta aos minoritários caso a caso. A posição da autarquia, no entanto, manteve alta a expectativa de investidores e analistas sobre os negócios nessas condições.

O ex-presidente da xerife do mercado Luiz Leonardo Cantidiano acredita que a análise casuística é, de fato, a melhor solução. Na opinião dele, normalmente, não há tag along aos minoritários quando uma sociedade é modificada ou desfeita porque um dos participantes adquire a fatia dos demais.

O entendimento está em linha também com a interpretação do jurista Paulo Cezar Aragão. O advogado do escritório Barbosa, Müssnich & Aragão afirmou que a oferta aos investidores menores depende da participação de um terceiro, um "alien", no negócio. "Caso contrário, não há como falar em alienação de controle."

Mais flexível, Cantidiano admite a existência de exceções em que haveria de fato a oferta, dada as complexidades possíveis nas companhias comandadas por mais um dono. Daí a necessidade de análise de acordo com a forma e o objetivo da transação .

Para o professor do Ibmec São Paulo Plínio José Lopes Shiguematsu, negócios realizados dentro do bloco de comando não disparam a obrigatoriedade de realização de oferta aos minoritários. "Movimentações entre sócios são comuns. Travaria demais os negócios admitir que elas demandam o tag along."

Mas, consciente das várias nuanças da questão, Shiguematsu ressalva que não há uma única posição sobre o assunto.

A coordenadora do núcleo jurídico da Fundação Getúlio Vargas, Roberta Prado, tem a posição mais definida entre os especialistas. Ela defende que a caracterização da necessidade de oferta aos minoritários se dá pela existência ou não de ágio na transação realizada entre os sócios. Para Roberta, esse ponto é até mais importante nessa definição do que eventuais alterações na orientação estratégica da companhia.

A especialista da FGV entende que a consolidação do controle de uma empresa - antes exercido por um acordo de acionistas - em torno de um único investidor pode ser considerada mudança de dono do negócio. Por isso, seria obrigatória a oferta aos minoritários detentores de ordinárias.

No caso da Vivo, a criação do grupo envolveu diversas movimentações societárias para unir os investimentos detidos pela Portugal Telecom e pela Telefónica no Brasil. Os grupos internacionais já tinham os ativos e apenas decidiram juntá-los numa única empresa. Em nenhuma dessas etapas, porém, foi cogitado o pagamento de tag along por alteração de controle.

Primeiramente, em 2003, os ativos detidos por portugueses e espanhóis foram colocados sob uma sociedade registrada na Holanda, denominada Brasilcel. Porém, somente três anos após a implantação da joint venture, em 2006, é que a estrutura societária das companhias operacionais foi consolidada em uma única empresa listada na bolsa: a Vivo Participações.

Os envolvidos nas negociações da companhia preferem não expor sua opinião a respeito do tag along aos minoritários na Bovespa. No entanto, sinalizaram que há margem para interpretações diferenciadas conforme o comprador - espanhóis ou portugueses.

Vale lembrar que a Vivo de hoje é produto da incorporação de outros ativos pela Telesp Celular, cujo comando anterior era dos portugueses. Também cabe destacar que a estratégia da companhia sofrerá mudança mais profunda no caso da Telefônica ficar sozinha no comando.

O valor de mercado da Vivo está em torno de R$ 15 bilhões. Os sócios detêm 89,3% das ações ordinárias e 47,5% das preferenciais por meio da holding holandesa. Pelas cotações da Bovespa, o valor das ações ordinárias em poder dos minoritários é de aproximadamente R$ 870 milhões.

O prêmio das ações ordinárias da Vivo sobre as preferenciais é o maior do setor, perdendo somente para os ativos pouco líquidos da Tele Norte Celular. O sobrepreço é superior até mesmo que o existente na Telemig Celular, que está em processo público de venda.