Título: Projeto que regulamenta ação de fiscais da Super Receita é criticado na CNI
Autor: Leo, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 29/03/2007, Brasil, p. A2

O projeto enviado pelo governo para regulamentar a ação dos fiscais da Receita Federal do Brasil, a Super Receita, foi condenado ontem, em seminário promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), por advogados e especialistas em tributação

Os especialistas apóiam a chamada Emenda 3 - a emenda acrescentada pelo Congresso ao projeto da Super Receita para obrigar os fiscais a obter autorização judicial quando decidirem multar ou acabar com pessoas jurídicas de prestação de serviços individual. "É pura pirraça tributária, sem efeito na arrecadação", afirmou o ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel, ao comentar o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Emenda 3.

Os empresários e especialistas reunidos na CNI defendem a derrubada do veto presidencial no Congresso. "Se o Congresso mudar de opinião e prestigiar o presidente promoverá a valorização da bola (corrupção dos fiscais)", previu o advogado Walter Vieira Ceneviva.

O poder aos fiscais para autuar empresas e decidir que determinadas pessoas jurídicas não passam de empregados sem contrato regular de trabalho é um "excesso nefasto", que só estimulará a corrupção, garante ele, que considera o projeto de lei do governo sobre os fiscais "um retrocesso".

O que o governo está criando, com a Super Receita e o projeto sobre os fiscais é uma "ditadura tributária", acusou o tributarista Antônio Carlos Rodrigues do Amaral, dirigente da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que condena as medidas do governo por limitarem as possibilidades de contestação às autuações da Receita ao mesmo tempo que impõem punições imediatas, como pagamento e proibição de realização de negócios com o governo. Consultada ontem pelo Valor, a Secretaria de Receita Federal não comentou as críticas dos especialistas.

A iniciativa da CNI e de associações empresariais do setor de serviços é uma reação ao veto e à campanha patrocinada por centrais sindicais contra a Emenda 3, que os sindicalistas e integrantes do governo, como a ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, acusam de levar à "precarização" das relações de trabalho - provocada, segundo os sindicalistas, pela substituição de contratos de trabalho com empregados por contratos com empresas prestadoras de serviços formadas por um só indivíduo.

"O que precariza a relação de trabalho é o desemprego", argumenta Ceneviva, que acusa de "paternalismo" a ação do governo ou de sindicatos no caso das empresas terceirizadas, contestadas pela Receita. "O próprio trabalhador tem instrumentos para se defender; há o Poder Judiciário para isso", argumenta. "Perguntam por que estamos contra os sindicalistas; a OAB-São Paulo não está contra ninguém, mas a favor da cidadania, da democracia e das leis", defende-se Antônio Carlos Rodrigues do Amaral.

O advogado afirma que o projeto de lei enviado pelo governo ao Congresso, em resposta às críticas pelo veto à Emenda 3, dá ainda mais poderes aos fiscais, sem a possibilidade de defesa garantida em um processo judiciário. "O projeto dá superpoderes ao fiscal e nenhuma salvaguarda ao cidadão", analisa o dirigente da OAB, apontando os pontos do projeto que proíbem o Conselho de Contribuintes de contestar a legalidade de resoluções da Receita Federal e a ampliação dos poderes dos fiscais para anular atos das empresas, sem consulta ao Judiciário.

"O veto à emenda não tem fundamento arrecadatório; pode ter ignorância, interesse específico, com o de aumentar a receita de contribuições sindicais, muitas razões, mas nenhuma nobre", criticou Everardo Maciel. Ele criticou a falta de precisão do projeto do governo ao autorizar os fiscais a agir em casos de contratos com pessoas jurídicas para "dissimulação" de contratos de trabalho.

Sem uma definição clara do que seria essa dissimulação, sem clareza das hipóteses de aplicação da regra e sem definição sobre a repartição do ônus entre os sócios das empresas punidas, o projeto dá excessiva margem de arbitrariedade por parte da fiscalização pública, contra o contribuinte, acusa o ex-secretário da Receita Federal, apresentado no seminário como "o Leão de outrora".