Título: Situação fiscal do país fica mais confortável
Autor: Lamucci, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 29/03/2007, Brasil, p. A4

Os novos números do Produto Interno Bruto (PIB) mostraram uma situação bem mais confortável do ponto de vista da solvência do setor público. Como o tamanho da economia aumentou, a relação entre a dívida líquida e o PIB em 2006 passou de 50% para 44,9%. Com uma relação dívida/PIB mais baixa e um crescimento da economia mais forte do que se esperava, é possível economizar menos para pagar juros sem que isso comprometa a solvência do país, dizem analistas.

O PIB mais gordo, porém, pode elevar alguns dispêndios, já que os recursos destinados à Saúde e o salário mínimo têm mecanismos de correção atrelados à variação do PIB. E o superávit de 2006 ficou abaixo da meta: 3,88% do PIB, em vez dos 4,25% da meta ou os 4,32% alcançados.

O ex-diretor do BC Alexandre Schwartsman, economista-chefe para a América Latina do ABN AMRO, diz que o superávit primário necessário para estabilizar a relação dívida/PIB é menor do que se estimava com os números antigos do PIB. Segundo ele, se o crescimento ficar entre 4% e 4,5%, o endividamento fica estável neste ano como proporção do PIB mesmo se a economia para pagar juros for equivalente a 1,6% do PIB. Nessa conta, Schwartsman considera um custo da dívida de 13,5% ao ano. Isso mostra que a situação fiscal hoje é bem mais confortável, e distante do que ocorria há alguns anos, quando se discutia se o país conseguiria honrar seus compromissos.

Para ele, não é necessário fazer um superávit primário de 4,25% do PIB - meta prevista para este ano, que leva em conta uma economia para pagar juros de R$ 95,5 bilhões. Ele não vê problemas na manutenção do valor em reais, o que deve equivaler a algo como 3,7% do PIB novo. Cumprir a meta de 4,25% do PIB exigiria um esforço fiscal pesado, dizem analistas.

Para o economista Bráulio Borges, da LCA Consultores, o superávit primário deste ano ficará em 3,3% do PIB. Ele considera aí o uso de 0,4% do PIB de gastos relacionados ao Projeto Piloto de Investimentos (PPI), mecanismo que permite que despesas com obras de infra-estrutura sejam descontadas do cálculo da meta fiscal.

Mesmo com um superávit primário de 3,3% do PIB, quase 1 ponto percentual inferior à meta de 4,25% do PIB, Borges estima que a relação dívida/PIB pode cair para 42% a 43% no fim deste ano. Esses cálculos levam em conta um crescimento de 4,5% e uma taxa Selic de 11% ao ano em dezembro.

Schwartsman e Borges acreditam que esse quadro fiscal indica que o Brasil está mais perto de obter o grau de investimento, a classificação dada pelas agências de rating a países considerados mais seguros. A questão de solvência não é hoje uma questão das mais preocupantes. O problema, segundo Schwartsman, é a qualidade da política fiscal: os gastos públicos são muito elevados, o que exige uma carga tributária estratosférica. "Há poucos países do mundo em que o consumo do governo é maior do que o investimento", diz ele.

Com o PIB maior, a taxa de investimento caiu de 20,3% para esses 16,8% do PIB - o consumo do governo está na casa de 20% do PIB. Mesmo com uma taxa de investimento mais baixa do que se estimava, a economia conseguiu crescer a taxas um pouco mais robustas. Isso sugere, segundo Schwartsman, que a produtividade da economia está melhor do que se imaginava.

Um dos problemas do PIB mais elevado para as contas públicas é a fórmula de correção para o salário mínimo. A partir de 2008, ele deve ser reajustado pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) acrescido da expansão real do PIB de dois anos antes. Como em 2006 a economia cresceu 3,7%, e não 2,9%, o impacto sobre os cofres públicos será maior - o salário mínimo corrige dois terços dos benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).