Título: Manobra para ganhar tempo
Autor: Jeronimo, Josie
Fonte: Correio Braziliense, 01/12/2010, Política, p. 6

CONGRESSO Enquadrado pela Lei da Ficha Limpa, Jader Barbalho renuncia ao mandato de deputado federal para interromper a tramitação de processos no Supremo e, com isso, conseguir disputar uma nova eleição no Pará

A dois meses do fim da legislatura, o deputado Jader Barbalho (PMDB-PA) renunciou ontem ao mandato na Câmara. De acordo com o advogado de Jader, o jurista José Eduardo Alckmin, a renúncia se trata de um protesto político, e não de uma manobra para o peemedebista ganhar tempo na tramitação de processos. ¿É uma decisão de caráter político, para colocar a posição dele enquanto não reconhecerem sua elegibilidade¿, afirmou Alckmin. Mas, de acordo com a assessoria do Supremo Tribunal Federal (STF), o inquérito nº 2909, que apura envolvimento de Jader em crime contra a ordem tributária, já tem pauta publicada e pode ser julgado a qualquer momento.

Em 16 de novembro, a defesa de Jader pediu o ¿adiamento do pleno¿ por uma sessão. Se o processo fosse julgado e Jader considerado culpado, o inquérito se converteria em ação penal e o único recurso da defesa seria a apresentação de um embargo de declaração, que na prática não modificaria a decisão do plenário do Supremo.

Ao renunciar ontem ao mandato, o peemedebista ganhou tempo porque, sem o foro privilegiado, seus processos voltam à primeira instância. Na eleição deste ano, os 1,8 milhão de votos de Jader na disputa por uma vaga no Senado pelo Pará foram anulados, pois o deputado tem em seu currículo uma renúncia de mandato para escapar de processo investigatório, em 2001, quando era senador (leia Memória ao lado). No início do próximo ano, a renúncia completará oito anos e o paraense será, novamente, elegível, pelos critérios da Lei da Ficha Limpa.

Fevereiro Enquanto o Tribunal Regional do Pará e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) analisam se a eleição que escolheu os representantes do estado no Senado precisa ser anulada, pois mais da metade dos votos (57,24%) foram cancelados, o peemedebista se prepara para concorrer. Em caso de a nova eleição ser convocada a partir de fevereiro, Jader não poderá mais ser enquadrado nos critérios da Ficha Limpa. ¿Primeiro, é preciso saber se vai convocar mesmo novas eleições. Mas a princípio, será possível. Em 1º de fevereiro, ele não estaria inelegível¿, pontua Alckmin. Com a renúncia e a perda do foro privilegiado, para que os processos de Jader se movimentem das instâncias superiores para a Justiça comum, os advogados têm de comunicar a nova situação do peemedebista.

Na carta de renúncia encaminhada ao presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), Jader reclama da Lei da Ficha Limpa e afirma que deixa a Casa porque a regra o deixou em uma situação ¿híbrida¿, em que ao mesmo tempo que é elegível para permanecer como deputado não teve o direito de ter os votos para o Senado contabilizados. ¿Nada mais tenho a fazer na Câmara, já que para exercer o cargo tenho que ser um cidadão elegível, mas o TSE e o STF decidiram que, no momento, sou também elegível, e estou impedido de ocupar a cadeira para a qual fui eleito ao Senado. Portanto, fui declarado um cidadão híbrido, isto é, elegível para exercer o mandato de deputado federal, inelegível para o exercício do cargo de senador, mandato para o qual acabo de ser eleito por 1,8 milhão, cassado pelo regimento do Supremo.¿ A Lei da Ficha Limpa provocou a anulação dos votos de Jader e do deputado petista Paulo Rocha no Pará. Com isso, a candidata do PSol, Marinor Brito, foi beneficiada e apontada como senadora eleita apesar de ter alcançado menor número de votos.

MEMÓRIA Repeteco de 2001

Jader Barbalho (PMDB-PA) era presidente do Senado, em 2001, quando explodiram as denúncias sobre tráfico de influência e desvios de recursos públicos da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e do Banco do Estado do Pará (Banpará). À época, a Polícia Federal investigou o envio de recursos para um ranário da ex-mulher de Jader. O montante de recursos desviados na superintendência, no banco estatal e em vendas de títulos da dívida agrária chegaria a R$ 1,7 bilhão. Jader deixou a Presidência da Casa para se defender das acusações, mas sem conseguir escapar das denúncias, decidiu abandonar o mandato em 5 de outubro de 2001, para não ser cassado. Assim como fez ontem na Câmara, o peemedebista apenas entregou carta de renúncia e não fez nenhum pronunciamento.

PEC DOS PMS VOLTA AO DEBATE

Parlamentares da base e da oposição que apoiam a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 300 usam a retomada do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, como mote para incluir o projeto na pauta de votações deste ano. ¿Isso é a maior prova de que o policial tem que ganhar razoavelmente. Um piso de R$ 3,5 mil não é só um salário digno, não. É a oportunidade que a gente tem de dar esse presente para os nossos policiais¿, afirmou o presidente da Comissão de Segurança Pública da Câmara, Laerte Bessa (PSC-DF). O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) conclamou os parlamentares que apoiam a PEC a não registrarem presença, prejudicando o quorum, enquanto a proposta não estiver na pauta. O líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), também usou o plenário ontem para defender a criação do piso para policiais e bombeiros como forma de valorizar a força policial e elogiou a ação dos homens do Rio de Janeiro.

Ontem, líderes se reuniram para elaborar pauta das últimas sessões do ano. Na lista de propostas, estavam os projetos do pré-sal, a renovação da Lei Kandir e do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, o Código Florestal, a PEC 300 e a legalização das casas de bingo. Da parte do governo, o esforço será pelo pré-sal, Lei Kandir e o fundo. Mas a bancada dos estados produtores só aceita votar o pré-sal se o governo fizer acordo para vetar a parte do texto que trata da distribuição dos royalties do petróleo, informou o deputado Índio da Costa (DEM-RJ), que também participou da reunião na Câmara.

Mas a construção de acordo para a votação dos projetos de legalização dos bingos, piso dos policiais e Código Florestal está longe de ocorrer. O vice-presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), afirmou que não é interesse do governo votar a PEC 300 nos moldes do atual relatório e que a intenção do Executivo é elaborar um só projeto que trate do tema da segurança pública de maneira mais ampla. Para o deputado Ivan Valente (PSol-SP), o caminho das últimas sessões é a votação das medidas provisórias que trancam a pauta. ¿Vamos continuar votando as MPs até retirarem as questões polêmicas. Se não tirarem o Código Florestal e bingos da pauta, não tem acordo.¿

No Senado, a Comissão que analisa o novo Código de Processo Penal (CPP) aprovou o relatório do senador Renato Casagrande (PSB-ES), mas o projeto só será analisado em plenário na próxima semana. (JJ)