Título: Maior abertura faz país seguir ciclo econômico global, mostra estudo
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 21/03/2007, Brasil, p. A3

Com o aumento expressivo do grau de abertura comercial do Brasil nos últimos anos, o impacto de uma desaceleração global sobre o ritmo de crescimento do país tende a ser maior hoje do que há uma década. A avaliação é do economista Alexandre Marinis, da Mosaico Economia Política. "O grau de inserção comercial do Brasil no mundo aumentou nos últimos anos, elevando muito o coeficiente de correlação entre o crescimento do Brasil e do mundo."

De 1999 a 2006, houve um forte aumento da abertura, medido pela soma de exportações e importações (a corrente de comércio) como proporção do Produto Interno Bruto (PIB). A média móvel de dez anos passou de 14% do PIB em 1999 para 20,8% no ano passado. Pelas contas de Marinis, a correlação entre o crescimento do Brasil e do mundo passou de 0,37 em 1999 para 0,74 em 2006, na mesma média móvel. Quanto mais próximo de 1, maior a correlação. Marinis usa a média móvel de longo prazo para suavizar os movimentos, evitando distorções provocadas por resultados extraordinários num ou noutro ano. Para calcular o indicador de 2006, leva-se em conta a média da abertura comercial de 1997 até o ano passado.

Outros economistas relativizam a visão de Marinis: o estrategista-sênior para a América Latina do WestLB, Roberto Padovani, nota que, mesmo com a maior abertura nos últimos anos, o Brasil ainda é uma economia razoavelmente fechada. Além disso, o PIB neste ano será puxado pela demanda doméstica, num cenário de juros em queda e renda em alta. No curto prazo, o cenário externo tem menos importância para o desempenho da economia.

Marinis diz que a maior correlação entre a expansão do Brasil e o mundo significa que o país tende a crescer mais quanto mais a economia global avançar, mas a questão é que o inverso também é verdadeiro: "Se o mundo desacelerar, o Brasil provavelmente enfrentará uma dificuldade maior do que no fim da década passada para crescer acima do ritmo global."

Padovani diz que uma economia mais aberta está de fato mais ligada aos ciclos econômicos globais, mas questiona o peso que uma eventual desaceleração mundial pode ter sobre o Brasil. Ele lembra que, mesmo com os avanços recentes, o país ainda é relativamente fechado se comparado a países asiáticos como a Coréia do Sul, que tem uma corrente de comércio superior a 70% do PIB.

No Brasil, a abertura se acentuou especialmente a partir de 1999, quando o país adotou o regime de câmbio flutuante. De 1971 a 1998, a corrente de comércio ficou estagnada na casa de 15% do PIB, nota Marinis. Em 2006, atingiu 23,9% do PIB. Outro fator para explicar o crescimento da corrente de comércio é a robusta expansão da economia global nos últimos anos, que impulsionou as exportações brasileiras.

Marinis diz que o estudo evidencia um quadro preocupante: num momento em que a correlação entre o crescimento do Brasil e do mundo é muito alta, o país continua a crescer a taxas pífias, justamente quando a economia global passa por uma fase de forte expansão. Nos últimos dez anos, o PIB brasileiro avançou a uma taxa média de 2,2%. Para ele, o Brasil não tem conseguido acompanhar o ritmo do mundo porque ainda há fundamentos fora do lugar, principalmente o tamanho do Estado, que tem papel fundamental para explicar o nível dos juros e da carga tributária.

Padovani vê o Brasil hoje numa situação bem mais sólida, embora veja problemas como o peso do sistema de impostos e questões regulatórias como obstáculos importantes a um crescimento mais forte do PIB. Ele nota, porém, que o Brasil tem hoje uma situação mais confortável, com reservas internacionais acima de US$ 100 bilhões e contas externas robustas. "Teria que haver uma desaceleração muito forte da economia global para prejudicar expressivamente o crescimento do PIB brasileiro", diz Padovani.

A economista Ana Carla Abrão Costa, da Tendências Consultoria Integrada, também vê o Brasil razoavelmente bem protegido. Ela diz que as contas externas estão bastante folgadas, com o país contando com um saldo comercial na casa de US$ 40 bilhões. Uma eventual desaceleração do crescimento chinês tenderia a derrubar os preços das commodities, afetando as exportações brasileiras, mas não a ponto de provocar uma freada relevante na atividade econômica interna ou uma forte desvalorização do real.

Um outro fator tende a amortecer o impacto de uma expansão mais fraca da economia global no curto prazo, lembram os dois analistas: o PIB neste ano vai ser puxado pela demanda doméstica, com especial destaque para o consumo das famílias e o investimento, como diz Ana Carla. Os juros em queda, o aumento da renda e a estabilidade da economia devem fazer o país crescer mais que os 2,9% de 2006 - Ana Carla e Padovani estimam um crescimento de 3,4%.