Título: O papel dos bancos no desenvolvimento sustentável do país
Autor: Jantalia, Fabiano
Fonte: Valor Econômico, 21/03/2007, Legislação & Tributos, p. E2

A recente divulgação de pesquisas científicas sobre o nível de aquecimento global despertou a atenção dos mais diversos setores da sociedade mundial, dando a impressão de que, finalmente, a questão ambiental será inserida como tema prioritário na agenda político-econômica internacional. Ao que parece, caminhamos para a superação do velho paradigma de que a preocupação ambiental implica em obstáculo ao desenvolvimento econômico. Volta-se a falar em desenvolvimento sustentável, entendido como o desenvolvimento que atende às necessidades do presente, sem comprometer a possibilidade de satisfação de necessidades das gerações futuras.

A variável ambiental é um dos principais componentes de um modelo de desenvolvimento realmente sustentável. Nosso país detém quase um quarto de todas as espécies animais e vegetais do planeta, o que revela o tamanho de nossa responsabilidade e a importância de nossa atuação para a conservação da Terra. É nosso dever contribuir para a reformulação do relacionamento entre o capital e a natureza.

Ao se falar em responsabilidade ambiental dos bancos, surgem os aspectos legais pertinentes à imputação de deveres às instituições financeiras e penalidades daí decorrentes. A Lei nº 6.938, de 1981, que institui a Política Nacional de Meio Ambiente, estabelece a obrigação legal de entidades e órgãos de financiamento e incentivos governamentais condicionarem a aprovação de projetos habilitados a esses benefícios ao licenciamento ambiental, na forma daquela lei, e ao cumprimento das normas do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama).

Mas a responsabilidade dos bancos não se esgota numa simples verificação documental, já que, sendo a responsabilidade civil ambiental tida como objetiva, à luz do artigo 3º, inciso VI e do artigo 14, § 1º, o poluidor é obrigado, independentemente de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros. Por sua participação como agente financiador de atividade potencial ou efetivamente poluidora, a instituição financeira é uma das destinatárias da norma e pode, em tese, ser responsabilizada pelos danos que a atividade praticada pelo financiado causar.

-------------------------------------------------------------------------------- A responsabilidade dos bancos não se esgota na verificação documental, pois se trata de responsabilidade objetiva --------------------------------------------------------------------------------

Entretanto, mais importante que a punição é a conscientização. No plano internacional, o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), editou, em 1992, a Declaração Internacional dos Bancos sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, reconhecendo que "o desenvolvimento sustentável depende de uma interação positiva entre o desenvolvimento econômico e social, e a salvaguarda do ambiente, a fim de equilibrar a satisfação dos interesses das gerações atuais e futuras". No Brasil, o governo federal criou o Protocolo Verde, instrumento criado para induzir bancos e órgãos públicos a incorporar a questão ambiental como critério de análise de concessão de créditos e benefícios fiscais.

A partir da década de 90, disseminou-se a alternativa de incorporar instrumentos econômicos à gestão ambiental, de modo a complementar os esquemas tradicionais de regulação direta. E é ai que as instituições financeiras podem ajudar, contribuindo para a aplicação do instrumento econômico à gestão ambiental no Brasil.

O papel a ser desempenhado pelos bancos não deve se ater à burocrática verificação de licenças e estudos de impacto ambientais dos empreendimentos. É preciso desenvolver uma política de concessão de crédito e linhas de financiamento voltadas para a gestão responsável dos recursos naturais. Como ponto de partida, poder-se-ia tomar os principais pontos da Declaração Internacional dos Bancos, com destaque para a recomendação de uma abordagem preventiva da gestão ambiental e o reconhecimento de que a avaliação do risco ambiental devem fazer parte do processo normal de gestão de riscos. Impõe-se que os bancos adotem essas premissas não apenas no plano interno - o que, aliás, se espera de qualquer organização socialmente comprometida - mas também na orientação de suas ações estratégicas e negociais.

O foco dessa atuação deve ser a prevenção e conscientização ambientais, capazes de produzir mudanças nos métodos de produção e hábitos de consumo da sociedade brasileira. A atuação pode se dar em duas frentes: através da ampliação do financiamento de pesquisas e programas de educação ambiental, onde os bancos atuariam junto ao meio científico e educacional, incentivando, sob a forma de patrocínio ou bolsas de estudo, os projetos de pesquisa em instituições de ensino; e através da criação de fundos de investimento e linhas de crédito especiais para projetos de repercussão ambiental positiva, com juros reduzidos, aplicando, para as demais linhas de crédito, um rating de risco menor para as empresas que adotarem práticas ambientais em sua planta ou junto à comunidade em que estão inseridas.

Com essas iniciativas, dentre muitas outras, os bancos darão passos largos para seu engajamento na questão ambiental, contribuindo fortemente para conciliação dos interesses das gerações presentes e futuras, e, com isso, para a preservação do mundo em que vivemos.

Fabiano Jantalia é procurador do Banco Central do Brasil em Brasília (DF) e especialista em direito do Estado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

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