Título: Monsanto também busca melhorias
Autor: Chiaretti, Daniela
Fonte: Valor Econômico, 21/03/2007, Agronegócios, p. B14

A "febre" global em torno do etanol, que ganhou força neste ano depois que o presidente americano George W. Bush elevou o combustível à condição de principal alternativa ao petróleo em seu país, deflagrou uma mudança significativa na estratégia que guia os investimentos em pesquisas da Monsanto: o milho desbancou a soja como principal alvo dos aportes da empresa em melhoramento de plantas, desenvolvido tanto a partir de métodos convencionais quanto com tecnologia transgênica.

Concentradas em um complexo de 850 quilômetros quadrados localizado em Chesterfield, nos arredores de St. Louis (Missouri), nos EUA, onde está a sede da multinacional, essas pesquisas ainda absorvem, no total, cerca de US$ 550 milhões por ano. Mas a forte demanda por variedades mais eficientes de milho acelerou os trabalhos com o grão, deixando a soja, tradicional carro-chefe da múlti, em segundo plano.

Geraldo Berger, gerente de biotecnologia da subsidiária brasileira da Monsanto, que concentra no país as informações sobre as pesquisas que saem dos 250 laboratórios e 100 estufas de Chesterfield, explica que para isso a empresa dividiu seus esforços em três etapas: mapeamento dos híbridos disponíveis em busca daqueles que podem render mais etanol, identificação de linhagens com elevado teor de carboidratos e avaliação sobre se o uso da biotecnologia pode ampliar potencialidades.

Para a próxima safra americana de grãos (2007/08), acredita Berger, a seleção dos híbridos "alcooleiros" deverá estar concluída, como já ocorre com a soja. "A meta é a união entre elevado teor de carboidratos e boa produtividade", explica. Alcançado o objetivo, os produtores, especialmente os americanos, esperam elevar a competitividade do etanol de milho em relação ao álcool de cana, que hoje é pelo menos duas vezes mais eficiente. E, enquanto esses híbridos para atender à onda do etanol não chegam ao mercado - o que em alguns casos pode consumir até dez anos, ou US$ 100 milhões em investimentos -, outro, com tecnologia transgênica e ao mesmo tempo tolerante a insetos e ao herbicida Roundup Ready, será servido como "tira-gosto" a produtores dos EUA provavelmente em dois anos.

A combinação de tolerâncias em uma mesma planta é uma demanda antiga dos agricultores, e produtos com essa característica estão no foco da Monsanto desde que os transgênicos "estrearam" no mercado mundial, em meados dos anos 90. Nesse contexto, diz Berger, o desafio, particularmente no caso do milho, é buscar híbridos mais produtivos por meio de melhoramento convencional - a partir do uso de marcadores moleculares, que aceleram o processo - e depois agregar nesses híbridos as tolerâncias da biotecnologia.

Esse processo está mais acelerado na soja, e novas fornadas desse grão transgênico com características combinadas continuam saindo dos laboratórios de Chesterfield e das dezenas de estações experimentais que a Monsanto mantém em países "agrícolas" relevantes - são nove no Brasil, certificadas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). É o caso da nova geração da soja RR. "Blockbuster" da primeira década de comercialização de organismos geneticamente modificados (OGMs) nos EUA, na Argentina e mesmo no Brasil - apesar da ilegalidade que marcou os primeiros anos de comercialização por aqui -, a soja RR agora está, segundo Berger, mais produtiva. E, só no Brasil, a "RR 2" embutirá uma tolerância a insetos desnecessária em outros países.

Com melhoramento convencional, sojas e milhos capazes de produzir óleos de melhor qualidade também estão sendo testados, da mesma forma que avançam as pesquisas com plantas resistentes a déficit hídrico, aguardadas com expectativa sobretudo em tempos de preocupação com os rumos do aquecimento global. Há milho mais resistente à seca sendo testado pela companhia nos EUA, na Argentina e na África do Sul, e no futuro testes deverão ser feitos também no Brasil. "Estamos fazendo grandes investimentos nessa área. No caso do milho podemos dizer que estamos no segundo dos cinco degraus das pesquisas", diz Berger.

Outra frente importante para a múlti, cuja receita líquida global supera US$ 7 bilhões, é o algodão. Nesse caso, os esforços estão concentrados não na qualidade do caroço, mas da fibra que será obtida. Na última safra, chegou ao mercado americano o algodão "RR flex" (que permite maior quantidade de aplicação de herbicida), também resistente a insetos. E, mais ou menos em busca das mesmas vantagens que movem as pesquisas com milho, soja e algodão, a Monsanto trabalha no desenvolvimento de canola (nos EUA e Canadá), alfafa (EUA), beterraba açucareira (EUA e União Européia) e grama (EUA), além de abóbora e milho doce convencionais e transgênicos. Para a cana, outra estrela da era do etanol, não há nada próprio em desenvolvimento, mas a companhia afirma ter interesse em parcerias.