Título: Syngenta terá milho para etanol
Autor: Chiaretti, Daniela
Fonte: Valor Econômico, 21/03/2007, Agronegócios, p. B14

A anglo-suíça Syngenta, uma das maiores empresas globais de agroquímicos e biotecnologia, está na reta final de lançar, nos Estados Unidos, um milho transgênico mais eficiente que o grão convencional na obtenção de etanol. O produto, que já está em processo de pedido de registro no Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) e também na Food and Drug Administration (FDA), a agência reguladora de alimentos e medicamentos do país, se aprovado, deve ser o primeiro organismo geneticamente modificado para a produção de biocombustível no mundo. Na previsão da Syngenta, recebido o sinal verde a venda acontecerá já em 2008.

Ainda sem nome comercial, o transgênico, conhecido internamente como corn-amylase - ou milho-amilase - "é o mais avançado projeto em transgênicos voltados ao setor dos combustíveis renováveis" e, prossegue o marketing da companhia, "tem potencial para conduzir a maiores rendimentos de energia por acre". Neste setor altamente competitivo, regado a milhões de dólares em pesquisas e muito segredo, a empresa conta, apenas, que o pulo do gato do milho turbinado é "expressar" mais a amilase, uma enzima naturalmente presente nos grãos e que tem o poder de quebrar moléculas de amido e transformá-las em açúcar - que, depois de fermentado com leveduras, leva ao álcool. "Expressar", no jargão da biotecnologia, significa tornar mais poderosa determinada característica.

No caso do corn-amylase, microorganismos descobertos em amostras de DNA de áreas próximas a vulcões no leito de oceanos, chamados extremófilos, tiveram seus genes seqüenciados para serem introduzidos no milho. Os estudos com os tais micróbios são da Diversa Corporation, empresa de biotecnologia sediada em San Diego, especializada em pesquisar e desenvolver enzimas de alta-performance. A Syngenta e a Diversa assinaram parceria de dez anos para projetos no ramo, agora voltada à descoberta de um novo espectro de enzimas que convertam biomassa celulósica em açúcares com potencial econômico para o mercado de biocombustíveis.

"É notório que, por razões econômicas, políticas e de segurança, os biocombustíveis são o caminho do futuro. Todos estão se movendo neste campo. Até os produtores de petróleo falam nisso", diz Steve Euri, gerente de marketing do negócio de enzimas da Syngenta Biotechnology Inc. "Agora, todos estão falando em etanol celulósico. Mas isso pode ocorrer num horizonte de dez ou 15 anos e o milho-amilase, se aprovado, é para o ano que vem", continua. "Além disso, a indústria americana do etanol através do milho investiu milhões de dólares no processo. O que este produto fará quando comercializado, é tornar tudo isso mais eficiente", prossegue. A Syngenta, que tem seu centro de pesquisas na Carolina do Norte, já fez testes com o milho transgênico em laboratório e em escala-piloto.

A empresa parece ter a dianteira desta corrida por ter iniciado a busca a um milho mais eficiente na produção de álcool há seis ou sete anos - antes do boom do etanol. Euri não conta quanto se investiu e nem em quanto o milho-amilase pode maximizar a produção. "É um caso diferente de um transgênico mais resistente a um determinado inseto", diz. "Agora temos que estudar o que ocorrerá com este milho no clima onde as sementes estarão, que pode levar a resultados diferentes se a usina estiver no Kentucky ou em Minnesotta". 2007 é, para a Syngenta, o ano crítico para o desenvolvimento do milho-amilase que, a partir da obtenção dos registros, terá seu potencial testado em escala comercial. "Por isso não sabemos ainda medir o aumento da eficiência. Mas se soubesse, seria relutante em dizer em função da concorrência", afirma Euri.

Em um material promocional da Syngenta, de 2002, dizia-se que o diferencial do transgênico seria na redução de custos para obtenção de etanol. Na ocasião, a estimativa era de uma redução de 10%. Euri não confirma este dado. "Agora temos mais indicadores e experiência no projeto. O que posso dizer é que o milho-amilase aumentará a eficiência do processo todo". Não é pouco avanço. Brasil e EUA respondem por 90% da produção mundial de etanol, só que, no Brasil, o custo de produção é de 83 centavos de dólar, e nos EUA, 1,09 dólar por galão.

A amilase existe no milho, na batata, na mandioca, no trigo e até na saliva. Na natureza, a enzima entra em ação no momento de germinação das plantas. É um processo energético em que a enzima transforma o amido em açúcar para que a planta cresça. No caso da cana, o caldo já tem açúcar e basta fermentá-lo para chegar ao etanol - um passo a menos do exigido no caso do milho. Aqui tem que se quebrar o amido, chegar ao açúcar e depois passar à fermentação - daí a importância da amilase. "O milho-amilase une dois passos", diz Euri.

A Syngenta espera conseguir o registro do transgênico também para comercialização do milho como alimento e para ração animal, mas o grande mercado, evidentemente, é a produção de etanol.

Em 2005, a empresa investiu US$ 822 milhões em pesquisas globais em suas áreas de atuação - o que significa um esforço de mais de US$ 2 milhões por dia. Em 2006, a Syngenta faturou US$ 8,1 bilhões no mundo. Na América Latina, onde além do Brasil há operações na Argentina, Chile, Colômbia, Venezuela e Paraguai, as vendas foram de US$ 1,143 bilhão, sendo US$ 1,036 na Syngenta Proteção de Cultivos (fungicidas, herbicidas, inseticidas e produtos para saúde pública) e US$ 107 milhões na Syngenta Seeds.