Título: SDE recomenda condenação da AmBev
Autor: D'Ambrosio, Daniela e Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 14/03/2007, Empresas, p. B4

Depois de três anos, a Schincariol conseguiu ontem um parecer favorável da Secretaria de Direito Econômico (SDE) contra o programa de fidelização da AmBev, batizado de "Tô Contigo". A cervejaria de Itu entrou com o processo em maio de 2004 - poucos meses depois do lançamento da campanha "Experimenta", época em que a disputa entre as duas empresas estava no auge.

A SDE, do Ministério da Justiça concluiu que o programa da AmBev prejudicou a concorrência. Em 2004, a Schincariol alegou que a Ambev estaria obrigando os bares a aderirem aos programas, excluindo marcas concorrentes. Os bares seriam obrigados a assinar um termo de compromisso em que se comprometeriam a dar exclusividade total às cervejas produzidas pela AmBev. Eles também não poderiam expor nenhum tipo de material publicitário das marcas concorrentes.

"Eles oferecem preços diferenciados e fecham a porta para outros fabricantes", afirma José Domingos Francischinelli, diretor de relações institucionais da Schincariol. Segundo o executivo, entre 80% e 90% do volume de vendas de cerveja do mercado mineiro está dentro do programa.

Ontem, a SDE recomendou ao Cade a condenação da Ambev por infração à ordem econômica e pediu alterações no programa. De acordo com a SDE, a AmBev não deverá exigir exclusividade para a adesão de revendedores ao programa e terá de excluir as limitações de compras de outras marcas por estes mesmo revendedores.

A SDE abriu processo administrativo para investigar os programas de fidelização da AmBev em agosto de 2004. A Secretaria realizou inspeções na sede da empresa, diligências junto aos pontos de venda e encomendou uma pesquisa de mercado ao Ibope, antes de chegar a uma conclusão final.

"Considerando que o Programa Tô Contigo embute descontos não-lineares aos pontos de vendas, já que os benefícios são concedidos com o requisito de que o varejista adquira somente cervejas da AmBev, ou reduza as compras das cervejas de marcas concorrentes, e dado o poder de mercado da AmBev, a análise feita pela SDE concluiu que o programa prejudica a livre concorrência no mercado de cervejas", afirmou a secretária Mariana Tavares de Araújo. "O programa ainda tem reflexos sobre a elevação dos custos das empresas concorrentes, dificultando a colocação dos produtos nos pontos de vendas", completou.

A SDE ressaltou, no entanto, que a AmBev não descumpriu as condições impostas à aprovação da fusão entre a Brahma e a Antarctica, realizada em 1999. Caso ficasse comprovado o descumprimento, a companhia teria de ser desfeita.

O "Tô Contigo" foi criado pela AmBev em outubro de 2002. Os pontos-de-venda são bonificados pela venda de produtos da empresa, dona das marcas Skol, Brahma e Antarctica. Os pontos acumulados com a venda dessas marcas dão direito a prêmios. São desde ventiladores, televisores, mesas, cadeiras, geladeiras e ingressos para eventos patrocinados pela AmBev, como jogos da seleção brasileira, Skol Beats ou o camarote da Brahma no carnaval e até bolsas de estudos - segundo a concorrência. Também inclui melhoria e reforma dos estabelecimentos. Segundo a AmBev, cerca de 10% dos pontos-de-venda (a companhia atua em um milhão) estão no programa.

Mas nesses três anos, desde que a cervejaria de Itu entrou com o processo, o programa da AmBev mudou. Hoje, os pontos-de-venda já não assinam contratos de exclusividade. "Não é tão explícito", diz uma fonte do setor. Segundo a fonte, a AmBev tem uma rede de coleta de informações - batizado de TOMÁS - que acompanha praticamente todos os pontos-de-venda e monitora não só as marcas da companhia como também as da concorrência. "Se a marca de uma outra cervejaria estiver subindo, eles oferecem um aumento de pontuação na venda de produtos da AmBev para que o bar deixe de vender aquela marca específica", diz a fonte.

Como é feito por marca e não por empresa, ainda segundo a fonte, não é caracterizado como exclusividade ou alijamento da concorrência. "É um programa inteligente, desenhado de forma para a não dar problemas jurídicos", afirma.

O "Tô Contigo" é um programa de fidelização e não de patrocínio. Esses contratos são comuns entre bares de maior porte e diferentes setores da indústria de bebidas e são feitos por várias marcas.

" A decisão é um marco regulatório em processos de conduta envolvendo o relacionamento com os pontos-de-venda e os limites dos programas de fidelização e fidelidade, em linha com a jurisprudência da comunidade européia", afirmou o departamento jurídico da Schincariol .