Título: Israel quer Brasil mais equilibrado
Autor: Silvan Shalom
Fonte: Correio Braziliense, 03/12/2010, Mundo, p. 23

entrevista - SILVAN SHALOM

Vice-premiê critica "ingenuidade"em relação ao Irã e pendor pelos palestinos

Isabel Fleck

Às vésperas da posse de Dilma Rousseff, o vice-primeiro-ministro israelense, Silvan Shalom, veio trazer uma mensagem ao novo governo: é preciso olhar com mais cuidado para o Irã. O número dois do gabinete israelense sugeriu que o Brasil deve, inclusive, preocupar-se com os desdobramentos do programa nuclear de Teerã na própria América do Sul. ¿Amanhã, o Irã pode dar uma bomba atômica de presente ao presidente Hugo Chávez (da Venezuela). E então, o que vai acontecer?¿, questiona. Para Shalom, países como o Brasil, que acreditam no caráter pacífico do programa iraniano, são ¿ingênuos¿. Ele acredita que o país pode ter um papel no processo de paz entre israelenses e palestinos, mas só se adotar uma postura menos parcial daqui para a frente. ¿O Brasil tem de entender que, se quiser se tornar um ator importante na comunidade internacional, deve ser mais balanceado.¿

O senhor veio ao Brasil no período de transição. Trouxe alguma mensagem para a presidente Dilma Rousseff? Nós queremos melhorar nossas relações. Acreditamos que o último ano foi muito produtivo, com as viagens do presidente Lula a Israel e do presidente Shimon Peres ao Brasil. É claro que gostaríamos que o Brasil compartilhasse conosco a preocupação com o Irã, de que ele representa uma ameaça não só para Israel, mas para todo o mundo. Com a bomba nuclear, eles podem atingir todo mundo. Eles têm desenvolvido mísseis com alcance muito maior, que poderão atingir todas as capitais da Europa: Londres, Paris, Madri, Roma, Berlim. Amanhã, o Irã pode dar uma bomba atômica de presente ao presidente Hugo Chávez (da Venezuela).

O Brasil deveria se preocupar com isso? Eu não sei. A América Latina não tem bombas atômicas até hoje. Amanhã, já não sabemos. O Irã é uma tirania, eles podem fazer o que quiserem. E se decidirem dar uma bomba ao Chávez?

O senhor considera que o Brasil é ingênuo por acreditar e defender um programa nuclear pacífico para Teerã? Talvez. Acho que aqueles que acreditam realmente que os iranianos estão tentando desenvolver apenas energia nuclear são ingênuos. Porque todos sabemos que os iranianos estão tentando se tornar uma superpotência. E eles trabalham em duas frentes: construir uma bomba atômica e tentar minar os regimes dos países moderados da região, controlar esses países e as suas reservas de petróleo.

Mas Teerã argumenta que Israel já tem a bomba, e que esse é um fator de desequilíbrio na região. Israel enfrenta uma situação única. Israel é o único país no mundo cuja existência é questionada. Israel é o único país que outros membros das Nações Unidas estão pedindo para destruir. Por isso, mantemos a nossa política ambígua e não comentamos os rumores sobre Israel e seu poderio (nuclear). Mas também não é a mesma coisa. Israel é uma democracia, e não apenas um homem que pode tomar a decisão destruir todo o mundo.

O senhor acredita que o Brasil pode ajudar no processo de paz com os palestinos? O Brasil pode desempenhar um papel importante, mas precisa ter uma postura balanceada. É o mesmo que eu digo aos europeus: você não pode aceitar todas as demandas dos palestinos e se oferecer como mediador entre nós e eles.

O Brasil não teve essa postura durante o governo Lula? O Brasil tem de entender que, se quiser se tornar um ator importante na comunidade internacional, deve ser mais balanceado. Hoje, os únicos mediadores são os EUA, porque são mais balanceados.

O senhor espera aproximação maior com Israel no governo Dilma? Primeiro, esse é um governo que já estava no poder. É a mesma coalizão, são os mesmos partidos, então não acredito que vá haver grandes mudanças na política. Mas, é claro, temos de continuar trabalhando, e é por isso que estou aqui.

Além da questão política, o que mais pode avançar? Eu vim ao Brasil com alguns objetivos: estreitar a relação entre os dois países, encontrar maneiras de as empresas israelenses trabalharem aqui. Tive um encontro com o ministro Miguel Jorge para tratar de como as empresas israelenses podem participar da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos que ocorrerão no Brasil nos próximos anos, porque as empresas israelenses estiveram muito envolvidas nos Jogos Olímpicos de 2004 e 2008, especialmente nas áreas de segurança, comunicações e infraestrutura.