Título: Maioria do STF é favorável a Corte decidir pela perda de mandato
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2012, Política, p. A10

O Supremo Tribunal Federal (STF) deve determinar a perda do mandato dos três deputados que foram condenados no julgamento do mensalão: João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT).

Essa questão começou a ser decidida, ontem, quando houve apenas dois votos. O ministro Joaquim Barbosa, presidente do STF e relator do mensalão, defendeu que cabe à Corte definir sobre a perda dos mandatos nas condenações criminais. "Eu acho inadmissível essa Corte compartilhar com outro Poder algo que é inerente à sua decisão", afirmou Barbosa.

Segundo ele, o STF deve comunicar a condenação dos parlamentares à Câmara e eles terão que deixar os seus mandatos assim que for julgado pelo tribunal o último recurso daqueles que foram condenados. Para o relator, a Câmara dos Deputados deve apenas fazer uma declaração sobre a perda dos mandatos de acordo com o que foi determinado pela Corte.

Barbosa disse ainda que o STF não dá um parecer Câmara, mas lhe comunica uma sentença. "A sentença condenatória não é a revelação de um parecer de uma das projeções de um poder estatal", enfatizou.

Em seguida, o revisor do mensalão e vice-presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, alegou que a decisão final sobre a perda dos mandatos é da Câmara e deve ser tomada em votação secreta. "Quando o mandato provém do livre exercício da soberania popular, quando o parlamentar é legitimamente eleito, falece ao Judiciário a competência para decretar a perda automática do mandato", justificou.

Lewandowski admitiu ainda que o deputado condenado pode trabalhar durante o dia na Câmara para, depois, dormir na prisão, cumprindo, assim, a sua pena, caso essa não for a de regime fechado. "Ele pode ser preso e ainda assim continuar o seu mandato. Nada impede que os réus exerçam atividade laboral fora do estabelecimento carcerário para, depois, voltarem para o repouso noturno."

Apesar de apenas dois ministros terem proferido voto, a proposta de Barbosa teve apoio, durante os debates, de mais cinco ministros da Corte. Já Lewandowski foi apoiado apenas por José Antonio Dias Toffoli. Como o STF tem 11 ministros, a proposta do relator deve ser vencedora quando o julgamento for retomado, na segunda-feira.

O ministro Luiz Fux criticou abertamente o voto do revisor: "Será que os mandatários do povo podem continuar falando pelo povo depois de condenados criminalmente?"

Gilmar Mendes atacou outro ponto do voto de Lewandowski: o uso do artigo 55 da Constituição que estabelece, no parágrafo segundo, em quais casos a perda de mandato deve ser decidida pela Câmara. Segundo Mendes, o objetivo desse artigo foi o de evitar a cassação do mandato por crimes menores, como acidentes de trânsito. "A preocupação do constituinte era com esses crimes de pequena monta que implicariam na perda do mandato. Daí, citar os crimes de trânsito", argumentou Mendes.

Celso de Mello também desconstruiu outro ponto utilizado pelo revisor - o de utilizar as atas da Assembleia de 1988 para interpretar a Constituição. "O STF não pode ser pautado pelo teor dos trabalhos desenvolvidos no seio da Assembleia Constituinte. Isso não condiciona o STF!" Marco Aurélio Mello enfatizou que a palavra final nos casos de perda de mandato deve ser a do STF.

Além desses ministros, Cezar Peluso deixou voto, antes de se aposentar, pela perda do mandato de João Paulo Cunha. No caso de Cunha, dez ministros vão votar, dos quais seis se manifestaram nessa linha da perda de mandato pelo STF. No caso de Valdemar e Henry, nove ministros vão votar e cinco já adotaram a mesma argumentação. Essa maioria deve ser confirmada na sessão de segunda, quando os votos serão proferidos oficialmente.

Barbosa também votou pela perda do mandato do ex-deputado José Borba, que, hoje, é prefeito pelo PP em Jandaia do Sul, no interior do Paraná.

Ontem, Lewandowski apresentou ainda uma proposta para calibrar as multas que reduz em mais da metade os valores que alguns dos réus foram condenados a pagar ao longo do julgamento no STF.

No caso do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), o voto do revisor faria com que a multa fosse reduzida de 450 dias-multa (R$ 1,08 milhão) para 165 dias-multa (R$ 396 mil). A diferença é de mais de R$ 600 mil. Já o presidente do PTB, Roberto Jefferson, seria beneficiado com uma pena de 48 dias-multa (R$ 115 mil), bem menos do que os 127 dias-multa (R$ 720 mil) fixados pelo plenário. O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares ficaria com multa de R$ 137,8 mil, menor do que os R$ 325 mil a que foi condenado. Já a líder do núcleo financeiro, a ex-presidente do Banco Rural Kátia Rabello, iria de R$ 1,5 milhão para R$ 900 mil.

Pelo novo método formulado pelo revisor, as multas seriam calculadas conforme os mesmos agravantes aplicados às penas de prisão. "Aplico os mesmos acréscimos que a Corte adotou em relação à pena privativa de liberdade. Se a Corte aumentar a pena em um sexto, haverá de exacerbar também em um sexto a multa", argumentou Lewandowski.

Na prática, esse método acabaria reduzindo o valor final das multas. Isso porque, durante o julgamento, prevaleceu, na maioria dos casos, o voto de Barbosa, que levou em conta a condição financeira dos condenados, resultando em penas mais altas.

A proposta do revisor irritou o relator. "Por essa sistemática de examinar as multas, uma por uma, para cada réu, sem que o seu voto tenha prevalecido, nós invadiremos fevereiro", reclamou Barbosa. "A nação não aguenta mais esse julgamento", completou. "Eu preferia que Vossa Excelência fosse breve. Está na hora de acabar! Como diriam os ingleses, "let"s move on" (vamos seguir em frente)."

Lewandowski não reviu a multa ao ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, pois o absolveu. Mas, o revisor afirmou que vai refazer os cálculos até para quem julgou inocente. Os demais ministros pediram um prazo maior para fazer os seus próprios cálculos e para analisar proposta do revisor. Com isso, a calibragem final das multas ficou para a semana que vem.

O critério de dias-multa pode variar, dependendo da condição econômica dos réus. Na maior parte dos casos, o STF considerou um dia-multa equivalente a dez salários mínimos vigentes na época dos crimes - R$ 240,00 ou R$ 260,00. Para os réus com maior poder aquisitivo, como Kátia Rabello, que presidiu um banco, o STF considerou 15 salários mínimos.

As multas a serem pagas pelos réus serão revertidas para o Fundo Penitenciário Nacional.