Título: Definição de metas é melhor parte do PAC da educação, dizem especialistas
Autor: Salgado, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 12/03/2007, Brasil, p. A2

Com a implementação do Pacote para o Desenvolvimento da Educação, que prevê R$ 8 bilhões extras para o setor até 2010, será a primeira vez que o governo federal realizará investimentos em educação condicionados ao cumprimento de metas e a avaliações de desempenho de escolas municipais, estaduais e federais.

Especialistas avaliam que essas contrapartidas são mais importantes do que o próprio recurso extra planejado pelo governo. Isso porque o Brasil não investe pouco em educação. Atualmente, os gastos totais chegam a 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em ensino. De acordo com números da Organização para Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), é um percentual próximo de países como Canadá, Estados Unidos e Coréia do Sul que gastaram, respectivamente, 5,2%, 4,8% e 4,3% do PIB com educação.

"É bom termos mais recursos, mas essa não é a questão principal do país", afirma Samuel Pessôa, economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Para ele um problema muito sério é a falta de responsabilidade final dos professores em relação a seus alunos e às escolas em que ensinam. Na análise de Pessôa, será difícil melhorar a qualidade do ensino se não forem modificados os instrumentos de avaliação e contratação de professores. "Não falta qualificação, mas sim comprometimento com a escola pública, especialmente na educação básica", diz o professor da FGV.

Outra ponderação é que a avaliação deveria ser feita em cada escola e não no município ou no Estado. Do contrário, os resultados podem camuflar problemas em algumas escolas, avalia Pessôa. Além disso, ele acredita ser importante premiar as que vão bem, para incentivar alunos e professores.

O programa apresentado na última segunda-feira pelo ministro da Educação, Fernando Haddad, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda está em discussão, mas já adianta alguns pontos principais. Para a educação básica, a idéia é criar o Índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira. Cada município e Estado receberão uma nota de 0 a 10, em um índice que reunirá os resultados de uma avaliação já existente, a Prova Brasil, e números de repetência e evasão escolar. Assim, a distribuição de recursos será de acordo com as necessidades de cada município medidas através desse índice.

Para Naercio Aquino Menezes Filho, professor do Ibmec-São Paulo, esse é o principal avanço do programa. "É a primeira vez que vamos usar os dados de provas e avaliações para implementar políticas e cobrar resultados dos investimentos", comenta. Menezes Filho vê com bons olhos as medidas ligadas à alfabetização de adultos.

Pelo novo plano de educação, o governo pretende criar uma bolsa para professores alfabetizadores em programas de alfabetização de adultos e também estabelecer metas e prazos municipais para a redução do analfabetismo. Hoje, 10,9% da população com 15 anos ou mais não sabe ler nem escrever.

Entretanto, o economista do Ibmec acredita que o ideal seria alocar os recursos já existentes para educação de uma forma mais eficiente. "Já investimos bastante nessa área, o que precisa mudar é como esse dinheiro é aproveitado", afirma. Para ele, liberar mais R$ 8 bilhões é uma forma política de aprovar essas medidas de cobrança de resultados e estabelecimento de metas.

Embora os gastos totais do país com educação tenham se mantido no patamar de 4% do PIB nos últimos anos, os recursos do Ministério da Educação (MEC) foram reduzidos. No último ano do governo de Fernando Henrique Cardoso, o MEC gastou R$ 22,1 bilhões. Em 2005, último dado disponível, foram disponibilizados R$ 20,4 bilhões, um recuo de 7,7%.

Ao contrário de Pessôa e Menezes Filho, o professor da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, José Marcelino de Rezende Pinto, acha que o país precisa sim de mais investimentos nessa área. Ele conta que o Estado do Maranhão gasta, em média, R$ 60 com um estudante por mês. Em São Paulo, onde a situação das escolas públicas é melhor, esse valor chega a R$ 150. "É muito aquém do que custa uma mensalidade em uma boa escola particular. Daí se vê que falta dinheiro para a educação", diz.

Para ele, um ponto a ser elogiado no projeto é criação de escolas técnicas federais em 100 cidades-pólo de desenvolvimento no país. "Essas escolas são as que mais colocam gente nas universidades públicas", ressalta o professor da USP. Outra medida importante é a criação de um programa de produtividade para as universidades federais, que receberão mais recursos em troca. "É fundamental aplicar ferramentas que melhorem a eficiência da gestão pública na educação", enfatiza Pessôa, da FGV.

Paulo Renato Souza, ex-ministro da educação de FHC e deputado federal pelo PSDB de São Paulo, diz que o problema educacional é enorme e é preciso muito mais dinheiro para elevar o nível da educação brasileira. Um grupo de trabalho do MEC, formado em 2003, fez um cenário prevendo melhoria progressiva no padrão de gastos por aluno para o período de 2003 a 2011. E concluiu que o país deveria migrar do patamar de 4,3% do PIB para 8,1% para resolver os déficits educacionais do país. "Ainda estamos longe disso, mas pelo menos demos um passo nessa direção", diz Paulo Renato.