Título: Segurança dos Jogos Pan-Americanos transforma jovens carentes em guias
Autor: Vilella, Janaina e Góes, Francisco
Fonte: Valor Econômico, 01/02/2007, Brasil, p. A2

Os serviços policiais de inteligência do país se preparam para garantir a segurança nos jogos Pan-Americanos, que começam em 13 de julho, no Rio de Janeiro. Mas é difícil assegurar que novos atentados, à semelhança dos ocorridos em dezembro, não se repitam. As ações de prevenção e controle do governo federal são apoiadas por investimentos de R$ 385 milhões, dos quais apenas 37% foram gastos até agora, segundo o coordenador das ações de segurança dos jogos, Hilário Nunes Medeiros.

Uma das iniciativas mais importantes no plano de segurança é o treinamento de 10,5 mil jovens moradores de comunidades carentes para buscar a solução pacífica de conflitos em uma cidade dominada pela sensação de insegurança e violência. Na visão de especialistas, a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), ligada ao Ministério da Justiça, responsável pela execução de um plano de prevenção e controle nos jogos, tarda em colocar os jovens na rua, o que só deve acontecer no Pan.

O ideal, segundo os especialistas em segurança pública, seria que esses jovens, muitos dos quais vivem em guetos como o do Complexo do Alemão, conjunto de 14 comunidades espalhadas por morros do subúrbio carioca, passassem por treinamentos práticos antes de assumir a função de guias turísticos e de apoio no evento. Com idade entre 14 e 24 anos, parte dos jovens é treinada em cursos de quatro meses e sairão com título de "guias cívicos", com noções de espanhol e inglês. Para eles, participar dos jogos significa a oportunidade de começar vida nova.

"Não houve coordenação do trabalho de formação dos guias cívicos com as entidades da sociedade civil organizada no Rio, como Observatório de Favelas, Afroreggae e Viva Rio", diz Pedro Strozenberg, coordenador de segurança pública e direitos humanos do Viva Rio. Segundo ele, os guias ainda não são conhecidos pela sociedade carioca. "O ideal seria de que esses jovens ganhassem visibilidade antes dos jogos para que a população se acostumasse com eles."

Por enquanto, os jovens vêem recebendo aulas teóricas. O curso é desenvolvido por professores e líderes de 120 comunidades que conhecem a realidade dos jovens. Além das aulas de cidadania, ética, inglês e espanhol, eles também conhecem os principais pontos turísticos do Rio. Os líderes comunitários recebem auxílio mensal de cerca de R$ 350 e os jovens ajuda de custo de R$ 175 nos quatro meses de curso. Até agora, 5,6 mil jovens já foram capacitados. A partir de março começam as aulas para a formação dos 4,9 mil restantes.

A Senasp também desenvolve dois outros projetos de inclusão social: Brigada Socorrista e Olimpíada Carioca. Os participantes do curso de brigada, com idade entre 18 e 24 anos, foram escolhidos pelas lideranças comunitárias e durante três semanas devem aprender noções de primeiros socorros e de combate a incêndio. O governo federal investe R$ 6,7 milhões nos programas sociais.

Segundo o coordenador das ações de segurança dos jogos Pan-Americanos, Hilário Nunes Medeiros, 14% do investimento total previsto pela União para a segurança dos jogos serão destinados à prevenção. Os 86% restantes serão aplicados na capacitação de policiais, na compra de equipamentos, veículos e armas não-letais.

A ex-governadora do Estado do Rio, Rosinha Matheus, se comprometeu a investir R$ 80 milhões na compra de outros veículos e de novos uniformes para os policiais. Mas os projetos acabaram não saindo do papel, porque parte dos recursos foi contingenciada. Em visita ao Rio nesta semana, a ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, descartou a hipótese de a União fazer um novo aporte de recursos para o Rio. "A parte da União está bastante adiantada. Mas o governo anterior se comprometeu a liberar R$ 80 milhões e não o fez", disse ela na ocasião.

Ontem, o governador do Estado do Rio, Sérgio Cabral Filho, confirmou que o acordo não foi cumprido pelo governo anterior e disse que o secretário nacional de segurança Pública, Luiz Fernando Corrêa e o secretário estadual de segurança, José Mariano Beltrame, estão conversando para buscar uma "equação para o problema".

Cerca de 350 novas câmeras serão instaladas nos locais dos jogos, nas principais vias de acesso e em pontos estratégicos da cidade. Parte dos investimentos, cerca de R$ 80 milhões, será destinada à aviação policial. O Estado contará com 34 aeronaves extras para reforçar a segurança das delegações, autoridades e do público durante os jogos. O Ministério da Justiça finaliza licitação para a compra de 14 helicópteros, que serão distribuídos entre os Estados depois dos jogos.

Na tentativa de mapear as ações dos traficantes no Estado, o setor de inteligência da polícia do Rio também passará por reformulação. Serão montados dois centros de comando e controle, de onde os coordenadores de todas as forças de segurança acompanharão o andamento das ações. Mais de 5 mil aparelhos de rádio-comunicação das polícias Civil, Militar e Corpo de Bombeiros serão trocados por equipamentos com tecnologia digital e criptografados. O objetivo é planejar operações e o deslocamento de policiais sem que os bandidos saibam da mobilização.