Título: Drogas assustam o DF
Autor: Oliveira, Noelle
Fonte: Correio Braziliense, 06/12/2010, Cidades, p. 19

A venda e o uso de entorpecentes será um grande desafio para o novo governo. A oferta de tratamento aos dependentes também precisará ser reestruturada Noelle Oliveira

A cerca de dois quilômetros do Congresso Nacional, nos fundos do Teatro Nacional Cláudio Santoro, adolescentes e adultos se revezam no uso de entorpecentes, quase todos fumam crack. Próximo ao local, ao lado do Conic, um homem trajando roupa social compra drogas de um morador de rua. A ação acontece às 16h e é rápida. Com uma das mãos o usuário pega o produto, com a outra repassa o dinheiro. Esse é apenas um dos lados da realidade do tráfico que terá de ser enfrentado pelo governador eleito Agnelo Queiroz (PT) a partir de 1º de janeiro. Atualmente, o DF conta com apenas seis Centros de Assistência Psicossocial (CAPs), que atendem dependentes de álcool e de substâncias ilegais. O cenário faz com que o Distrito Federal ocupe a última posição no ranking nacional no tratamento de distúrbios psicossociais.

Sem estrutura para tratar os atuais usuários, a tendência é que a situação piore. Estatística da Polícia Civil mostra que, em se tratando do crack, a média mensal de apreensões nos primeiros sete meses deste ano é quase três vezes maior do que o registrado em 2009. Foram 18,8kg da droga recolhidos até julho de 2010, contra 6,9kg computados no mesmo período do ano passado. Segundo estimativa da Secretaria de Segurança Pública, 27% dos crimes registrados nas delegacias do DF no primeiro trimestre de 2010, estão associados ao tráfico, especialmente das pedras.

O tráfico e o consumo de drogas é visto por toda a capital. No centro de Brasília, no gramado atrás da Rodoviária do Plano Piloto, a droga mais devastadora entre as consumidas no Brasil pode ser adquirida por R$ 10. Na maioria das vezes, ela é partida ao meio, uma metade é consumida pelo comprador e a outra, revendida, ao mesmo preço, para os usuário já drogados ou em crise de abstinência. É assim que o ciclo se fortalece. De acordo com policiais que atuam na região, as ações de repressão são constantes e ocorrem em três turnos, mas não conseguem conter a proliferação de usuários.

¿Tiramos de um ponto e eles vão para outro. Apenas a ação policial não resolve esse problema¿, avalia o sargento Gadelha, um dos PMs responsáveis pelas rondas diárias. Como nenhuma policial feminina integra as ações, as mulheres não podem ser revistadas e são as responsáveis por transportar as pedras de um lado para outro. A maioria dos usuários já foi encaminhada às delegacias, todos assinaram termos circunstanciados e foram liberados. A maioria dos usuários é menor de idade. Muitos já foram levados a abrigos pela Secretaria de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda (Sedest), mas, sem residência fixa, acabam voltando para as ruas.

Para o delegado da Coordenação de Repressão as Drogas (Cord), João Emílio Oliveira, só será possível resolver o problema do tráfico no DF caso o novo governo invista mais com soluções alternativas além de reforçar a atuação policial. ¿Precisamos de prevenção efetiva em todos os aspectos. Estamos vendo o que o consumo exacerbado de drogas fez com o Rio de Janeiro. No DF, não é a policia sozinha que vai resolver¿, avalia. Para Oliveira, o crack é hoje o maior problema a ser enfrentado no tocante ao tráfico de entorpecentes.

Em contrapartida ao crescimento do crack, desde 2007, a polícia tem encontrado cada vez menos dependentes de merla e de cocaína no DF. Há três anos, por exemplo, a quantidade de pasta base retirada das ruas ultrapassou a casa dos 145kg e a de cocaína, 166kg. No ano passado, os números foram reduzidos para 93kg e 137kg, respectivamente. Além do crack, em 2009, foi apreendida no DF 1,3 tonelada de substâncias ilícitas. Até julho de 2010, último balanço consolidado pela Polícia Civil, a coorporação já havia retirado de circulação 509kg de entorpencentes.

À paisana A Polícia Civil do DF adotou uma nova estratégia para combater o problema das drogas na capital do país, principalmente o crack. Há alguns meses, as cidades do Entorno passaram a contar com agentes à paisana, que monitoram todo movimento de suspeitos nessas regiões. Segundo a Polícia Civil, uma quantidade considerável de entorpecentes que chega ao DF tem como rota municípios goianos como Luziânia, Valparaíso, Cristalina e Formosa

Dependentes terão programa Para combater o avanço das drogas no DF, o governador eleito, Agnelo Queiroz, afirma ter estruturado uma política de prevenção e combate ao tráfico, com atenção ao atendimento na saúde psicossocial dos dependentes e das famílias. Entre as medidas previstas em seu plano de governo estão a criação de um centro integrado de planejamento de ações para combate às drogas, aumento do número de centros de atenção psicossocial e a criação do Programa Distrital Integrado Antidrogas.

¿Não podemos deixar nossa juventude ser consumida por essa epidemia, por essa praga (os entorpecentes). É preciso ser implacável, enérgico na luta contra as drogas. Não dá para a gente permitir que crianças, adolescentes, adultos sejam escravizados pelo crack e fumem no centro da capital da República e na sua periferia. É uma questão de saúde pública, social e, principalmente, de humanidade. Não dá mais para fingir que o problema não existe. Como pai, como médico, como cidadão, como político, este assunto me indigna. Não permitirei que essa tragédia continue no meu governo¿, afirmou Agnelo.

O governador eleito promete ainda criar serviços residenciais terapêuticos, centros de convivência e cultura, e leitos de atenção integral em todos os hospitais regionais, destinando-os também ao tratamento de usuários. Para atuar na prevenção, Agnelo diz que promoverá ações educativas contra as drogas ilícitas, e também para a conscientização a respeito do uso do álcool e do tabaco. Para ampliar a repressão, a estratégia do futuro governo passa pela promoção da inteligência policial, a fim de combater o crime organizado e o tráfico.