Título: Chávez agora pode acelerar o socialismo
Autor: Souza, Marcos de Moura e
Fonte: Valor Econômico, 01/02/2007, Internacional, p. A11

O Congresso venezuelano aprovou ontem, em sessão especial realizada ao aberto numa praça central de Caracas, uma lei que confere ao presidente Hugo Chávez poder para governar por decreto por um ano e meio. Ele poderá legislar sobre 11 áreas, de educação à defesa, de saúde à economia.

Em tese, Chávez não precisaria dessa prerrogativa, já que o Parlamento é constituído somente por seus apoiadores - supostamente dispostos a aprovar qualquer medida encaminhada por ele.

Mas, para analistas venezuelanos, Chávez requisitou a aprovação da chamada Lei Habilitante para evitar possíveis percalços e acelerar rumo ao Estado socialista.

"Hoje ele tem controle total sobre os 165 integrantes da Assembléia Nacional, mas acredito que, quando começar a discutir temas delicados como a reeleição indefinida ou mudanças na forma de representação institucional, nem todos os aliados parlamentares se sentirão agradados", disse ao Valor Marino González, professor de Políticas Públicas da Universidade Simon Bolívar . "O que o presidente está fazendo é eliminar qualquer intuito do Parlamento de discutir, atrasar ou alterar mudanças adotadas por ele."

Para a base parlamentar de Chávez não se trata disso. A questão, dizem os deputados, é de velocidade na adoção das mudanças que o presidente considera essenciais para o país. "Ainda que o presidente tenha a maioria na Casa, há uma série de etapas e tramites que precisam ser cumpridos nas votações da Assembléia Nacional", justifica o deputado Earle Herrera, membro da comissão que avaliou a Lei Habilitante. "E o presidente quer impor um ritmo mais acelerado em algumas matérias", acrescenta.

Herrera cita como exemplo os planos de Chávez de fazer uma reordenação política do território nacional, alterando as jurisdição de alguns municípios e Estados. Pelas vias normais do Parlamento, a mudança levaria pelo menos seis a oito meses para ser aprovada.

Chávez legislará sobre os setores de hidrocarbonetos, segurança das atividades petroleiras, econômico e social, financeiro e tributário, institucional, participação popular, segurança pública e jurídica, ciência e tecnologia, ordenação territorial, defesa e infra-estrutura.

A oposição venezuelana - que boicotou as eleições legislativas de 2005 sob a alegação, nunca confirmada, de que o pleito estaria viciado - reagiu dizendo que a lei afetará a confiança dos investidores locais e estrangeiros na economia.

"O país ficará paralisado e sob total incerteza neste ano e meio. Será um período de poder total para o presidente, o que significa uma ditadura nua e crua", disse ao Valor o coordenador nacional do partido Primero Justicia Popular, Júlio Borges. Para ele, o objetivo de Chávez com é acelerar, sem maiores debates, "a implementação de seu plano ideológico".

Desde 1999, quando foi eleito pela primeira vez, Chávez governou sob a Lei Habilitante por duas vezes. A última delas, em 2001, aprovou 49 leis, algumas delas alvo de ira de parte da sociedade venezuelana, o que desembocou no breve golpe que tirou o presidente do poder por 48 horas. Desta vez serão cerca de 60 leis até meados de 2008. Marino González acredita que oposição deverá protestar dentro dos limites institucionais. "Há mais maturidade agora."