Título: MEC e Cade unem-se na regulação universitária
Autor: Máximo, Luciano
Fonte: Valor Econômico, 30/11/2012, Brasil, p. A5

Prestes a completar um ano à frente do Ministério da Educação (MEC) em janeiro de 2013, Aloizio Mercadante só começou a deixar as marcas de sua gestão nos últimos meses. De julho para cá ele passou a apoiar o uso dos futuros royalties do petróleo para elevar o gasto público no setor de 5% para 10% do Produto Interno Bruto (PIB), lançou a lei de cotas raciais e socioeconômicas para o acesso às universidades federais públicas e a campanha para melhorar a alfabetização infantil no país. Além disso, Mercadante convocou a União Nacional dos Estudantes (UNE) e uma dezena de movimentos sociais, tradicionais defensores de uma "educação pública, gratuita e de qualidade", para ampliar a regulação estatal do mercado de ensino superior privado.

Impulsionada por grandes grupos, alguns financiados por fundos de investimento, a educação superior particular vive há anos forte expansão, contabiliza mais de 200 negociações de fusões e aquisições e reúne as mais rentáveis empresas na bolsa de valores brasileira. Diante desse cenário, Mercadante conta com ajuda dos movimentos sociais para pressionar o Congresso a aprovar um projeto que tramita em regime de urgência: a criação do Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (Insaes), nova autarquia do MEC com mais de 500 funcionários para dar mais agilidade nas análises de abertura e fechamentos de instituições e cursos. Em outra frente, o MEC fechou recentemente parceria com o Conselho de Administração de Defesa Econômico (Cade) para ter mais controle nos processos de compra e venda de instituições de ensino superior.

Em encontro com representantes de movimentos estudantis há duas semanas, Mercadante pediu apoio para a criação do Insaes e manifestou preocupação com as fusões das universidades particulares. "Estamos tendo processos de fusão muito acelerados, temos instituições com mais de 500 mil matrículas. Isso tem implicação no processo pedagógico, exige atenção do MEC", afirmou Mercadante.

Yuri Pires, dirigente da UNE, disse ao ministro que a entidade é contra o atual movimento de concentração no setor. "Aglutinar várias universidades na mão de apenas um grupo educacional prejudica a qualidade drasticamente. Em São Paulo, estudantes reclamam da troca de professores com alta titulação e salários altos por outros menos preparados, diminuição da carga horária das aulas. Esses grupos também acabam com bolsas e não destinam nenhuma verba para pesquisa."

Para minimizar polêmicas, o secretário de regulação de ensino superior do MEC, Jorge Messias, afirmou que a parceria entre o ministério e o Cade é um passo para evitar autorizações de fusões e aquisições que resultem em prejuízo à qualidade do ensino. "O MEC já está atuando com bastante atenção a esse respeito, tanto é que temos um acordo de cooperação técnica na perspectiva de dotar o Cade de todas as informações necessárias para o plano concorrencial. Nesse aspecto estamos atentos para zelar pela qualidade", disse Messias.

O conselheiro do Cade Elvino de Carvalho Mendonça contou que desde o fim do ano passado as análises dos casos de aquisições no setor educacional feitas pelo órgão ficaram mais pormenorizadas. "Até 2011 nossas análises consideravam como produto apenas a instituição e como mercado geográfico relevante, o Estado de atuação. No meu último voto, olhei como produto o curso oferecido e a região escolar", explicou Mendonça.

Ele complementa que a mudança não significa "apertar o cerco" aos movimentos de concentração. No novo formato de análise do Cade, a incidência concorrencial é até menor, pois o local de atuação da instituição envolvida na aquisição é mais limitado "à área de influência escolar". "Fusões e aquisições são naturais. Há uma grande demanda reprimida por educação e o mercado de ensino superior privado é dinâmico, se comporta como qualquer outro conforme as oportunidades", diz Carvalho.

De acordo com reportagem publicada pelo Valor em junho deste ano, com a entrada dos fundos de investimento para turbinar os caixas das universidades privadas, a consultoria Hoper fez levantamento que dá conta de 200 processos de fusão e aquisição no ensino superior privado do Brasil. Uma das maiores negociações foi a compra da Uniasselvi, universidade de Santa Catarina com mais de 70 mil alunos, pelo grupo Kroton, numa operação de mais de R$ 500 milhões realizada no meio deste ano. A Kroton é justamente a empresa que teve uma das maiores rentabilidades na Bovespa entre janeiro e novembro, com valorização de cerca de 130% de suas ações.

"A tendência é de continuidade desse movimento, porque estamos falando de um setor muito fragmentado, com empresas pequenas e cheias de problemas. Percebemos as novas ações do governo como um meio para dar mais celeridade aos processos, afinal é uma demanda que o Estado não consegue atender com as universidades públicas", avalia a equipe de análise de investimento da corretora Coinvalores.

O ministro Aloizio Mercadante pondera que o MEC precisa de uma estrutura maior para cumprir seu papel de regulador com mais agilidade e também com mais rigor. "Temos demanda de abertura de cursos que não conseguimos atender na velocidade que deveríamos. Devemos fazer uma análise da infraestrutura, da carreira docente, da estrutura didática e de outros compromissos necessários para garantir a qualidade de ensino. Também precisamos de mais agilidade para tomar medidas disciplinares quando elas são indispensáveis. É evidente que nossa expectativa é aumentar a oferta de matrículas, mas às vezes elas [medidas disciplinares] são necessárias", disse Mercadante.

A reportagem tentou ouvir as grandes redes particulares de ensino do país, mas não teve resposta.