Título: Omissão do governo levou à rebelião, diz presidente do sindicato
Autor: Safatle, Claudia
Fonte: Valor Econômico, 05/04/2007, Brasil, p. A5

Foi a omissão do governo que levou os controladores de vôo à rebelião de sexta feira, dia 29, que paralisou os aeroportos do país, segundo avaliação de Jorge Botelho, presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Proteção ao Vôo. O governo simplesmente engavetou o relatório do grupo de trabalho, criado no ano passado para propor soluções à crise no controle aéreo.

Entregue em dezembro ao ministro da Defesa, o relatório lista todos os problemas que precisam ser abordados e que só vieram à tona após o acidente com o avião da Gol, em setembro. Lá estão sugeridas a criação de um órgão civil ligado ao Ministério da Defesa, para tratar da aviação civil; a manutenção do sistema compartilhado de monitoramento do espaço aéreo; reformulação da carreira e das remunerações dos controladores; novas contratações; e uma auditoria independente e imediata para avaliar as condições e necessidades do sistema tanto de pessoal quanto de infra-estrutura e de atualização tecnológica. Do ano passado até março deste ano, ninguém tratou desse assunto no governo.

Ao contrário das lideranças dos controladores militares, Botelho ainda está confiante de que a negociação prosseguirá e será um processo longo até que a transição entre o regime atual e o novo, gerido por civis, se complete. "Não houve rompimento", assegurou ele, que esteve com o ministro na terça-feira e acredita que, acalmado os ânimos tanto dos controladores quanto do comando da Aeronáutica e do Planalto, haverá uma agenda de negociação.

Os líderes militares que estiveram com Paulo Bernardo já não estão tão seguros disso e ontem os ânimos ainda não haviam "serenado", acredita o presidente do sindicato de controladores civis, por que foram ao encontro, na manhã de terça-feira, com uma expectativa exagerada de que sairiam de lá com resultados concretos. "A imprensa dizia que tinha uma medida provisória quase pronta tratando do assunto, criando gratificações, e eles acreditaram. Mas não tinha nada", avalia Botelho, creditando a eventual frustração à falta de experiência dos militares com a prática da negociação.

Botelho garante que Bernardo jamais falou em anistiar os líderes do motim. A minuta de negociação extraída do encontro de sexta, diz textualmente que "o governo federal fará a revisão dos atos disciplinares militares, tais como transferências, afastamentos e outros, envolvendo representantes de associações de controladores de tráfego aéreo, ocorridos nos últimos seis meses, assim como assegura que não serão praticadas punições em decorrência da manifestação ocorrida no dia 30.03.2007". Apesar dessa garantia não caberia ao governo impedir a instauração de inquérito policial militar a pedido do Ministério Público Militar, que é um órgão autônomo, assinalou Botelho.

Ele acredita também que está mantida - " e ontem o ministro disse que isso já estava decidido" - a proposta de criação de um órgão civil para cuidar do controle de tráfego aéreo, no Ministério da Defesa. Mas isso não é uma decisão para ser implementada da noite para o dia. É um processo longo que demanda todo um trabalho de transição, argumentou Botelho.

"História mal contada", segundo ele, é a de que custará muito caro para o país montar um sistema onde o controle do tráfego aéreo é gerido por civis e a defesa do espaço aéreo, pelos militares. O Brasil possui um sistema compartilhado e não há razão para mudar isso, diz Botelho. Os equipamentos dos Centros Integrados de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (Cindactas) não pertencem à Aeronáutica, mas à União e, portanto, não haveria qualquer razão para ter dois sistemas independentes.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva manifestou ontem, após almoço com o presidente do Equador, Rafael Correa, confiança de que não haverá um novo apagão aéreo nos aeroportos neste feriado. Ele transferiu a responsabilidade de uma nova crise para a Aeronáutica. "A Aeronáutica está com a responsabilidade de não permitir que aconteça mais isso. Estou confiante e certo de que todo mundo que está envolvido com a questão dos aeroportos está de prontidão para que a gente não permita que haja mais sofrimento". (Paulo de Tarso Lyra, de Brasília)