Título: Amorim diz a diplomatas que não há pressa em acordos
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 08/01/2005, Brasil, p. A3

O Brasil tem interesse em avançar em todas as negociações comerciais nas quais está envolvido, mas não se preocupa em obter acordos rapidamente, porque "às vezes uma negociação de desfecho rápido é uma negociação mal-sucedida", disse o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, a 49 embaixadores chefes de postos diplomáticos no exterior. Os diplomatas, acompanhados de Amorim, foram recebidos também pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lhes garantiu ter interesse em chegar a acordos entre o Mercosul e União Européia e com os EUA, na Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Lula garantiu aos embaixadores que o governo quitará, até setembro, todas as dívidas do Brasil com organismos internacionais, hoje em US$ 193,9 milhões, dos quais US$ 105 milhões com a Organização das Nações Unidas. Amorim anunciou que o "próximo grande desafio" da diplomacia será o encontro a ser promovido no Brasil, neste ano, entre os países árabes e os países da América do Sul e pediu a todos prioridade para o tema. Pelo menos um dos embaixadores presentes ao encontro com Lula não deverá participar desse esforço: o ex-presidente Itamar Franco, ao deixar o Planalto, entregou a Amorim o cargo de representante brasileiro na Santa Sé. O encontro dos embaixadores teve a participação dos subsecretários-gerais e chefes de departamento do Itamaraty, por iniciativa do secretário-geral, Samuel Pinheiro Guimarães, que aproveitou a presença dos diplomatas em férias no país. Na reunião com o presidente, de quase duas horas, os representantes brasileiros no exterior receberam um relato das prioridades políticas e econômicas e dos programas sociais do governo, e receberam instruções sobre os rumos da política externa. Segundo Amorim, Lula tentou dar nos diplomatas uma "injeção de ânimo, otimismo e de auto-estima". O presidente disse que usa, em sua atuação internacional como chefe de Estado, lições de sua experiência como sindicalista. "Os interlocutores só respeitam os que respeitam a si próprios; quem já chega achando que não pode, que é coitadinho que tem de pedir desculpas, esse não é respeitado", explicou o ministro. Lula mencionou sua boa relação com o presidente dos EUA, George Bush, enfatizou a importância do encontro que teve no ano passado com investidores, em Nova York, e relacionou, entre as suas prioridades de política externa, a cúpula com os países árabes, o combate à pobreza e a fome, as negociações comerciais e a integração sul-americana. Em relação às negociações, segundo Amorim, Lula defendeu "atitude": "Vamos negociar , tendo presente o interesse brasileiro, sem timidez e procurando reforçar nossa capacidade de negociação". Amorim, ao falar para os embaixadores, defendeu "negociações justas tanto quanto é possível ter negociações justas com países desenvolvidos" e pediu o engajamento de todos diplomatas "tanto com a União Européia quanto na Alca e outras que viermos a ter". Esse engajamento, segundo Amorim, "também não é tarefa para céticos, é para pessoas que acreditem no Brasil e no futuro do Brasil e que façam disso a principal recompensa de seu trabalho". O ministro fez sua comparação favorita, ao defender a preferência pelo conteúdo, e não pelos prazos nas negociações: foi o fracasso das discussões da reunião ministerial da Organização Mundial de Comércio (OMC), em Cancún, que permitiu ao Brasil e outros países em desenvolvimento obter um acordo mais favorável a seus interesses, na decisão tomada em Genebra, em julho de 2004, sobre o roteiro das negociações sobre agricultura. Os acordos na OMC hoje favorecem os países ricos, como o Brasil pôde constatar durante a disputa com o Canadá na questão dos subsídios às empresas aeronáuticas Embraer e Bombardier, lembrou Amorim. Se houvesse acordo em Cancún, o Brasil teria provavelmente de aceitar condições desfavoráveis para suas exportações agrícolas, nos próximos dez ou vinte anos, enfatizou. "O fracasso entre aspas de Cancún foi condição de um êxito em Genebra e tenho certeza de que a mesma coisa ocorrerá, por exemplo, nas negociações com a União Européia", disse o ministro. A impossibilidade de obter um acordo com os europeus no prazo antes fixado, de 31 de outubro do ano passado, pode ter sido condição para um resultado melhor, comentou. Amorim disse esperar que não se demore muito a concluir as negociações entre Mercosul e UE.