Título: Candidatura de Azevedo quer resgatar importância da OMC
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 02/01/2013, Brasil, p. A4

Já com o apoio oficial da Argentina, declarações informais de apoio dos países do grupo dos Brics (Rússia, Índia, China e África do Sul) e o estímulo discreto dos Estados Unidos e de outros países, o embaixador do Brasil em Genebra, Roberto Azevedo, lançado candidato à direção da Organização Mundial do Comércio (OMC), na semana passada, foi alçado às prioridades da política externa brasileira neste ano. Sua campanha deve ter como principal tema o esforço para fazer a OMC voltar a ser relevante na discussão sobre comércio internacional. Hoje, segundo um alto diplomata, a organização tornou-se quase exclusivamente um tribunal de litígios comerciais.

"É importante para o Brasil apresentar a candidatura de um diplomata respeitado na OMC, com um currículo importante e qualificado", defendeu o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, ao comentar, por telefone, a candidatura brasileira. Ele confirmou que o Brasil recebeu "manifestações de simpatia" pelo nome de Roberto Azevedo dos países dos Brics, dos EUA e de países europeus e revelou estar, nas mãos, com a carta de apoio da Argentina. "Os que se manifestaram dizem ser a candidatura que atende melhor ao sistema multilateral de comércio", argumentou o ministro.

Na sexta-feira, foi Pimentel quem informou ao embaixador argentino no Brasil, Luis Maria Krekler, a quem recebia em audiência, sobre a decisão de lançar Azevedo para a OMC. Horas mais tarde, Krekler informava ao governo ter entrado em contato com Buenos Aires e enviava a carta manifestando formalmente o apoio à candidatura brasileira. Segundo apurou o Valor, Argentina e Índia estiveram entre os primeiros a pedir ao Brasil para apresentar um candidato à OMC. Uma fonte dos Brics, em Genebra, confirmou ao jornal o apoio ao embaixador brasileiro.

O Itamaraty quer evitar que Roberto Azevedo seja identificado com algum dos grupos em que se dividem os países na OMC, e planeja uma campanha discreta, enfatizando a experiência e capacidade de encontrar consensos, características do diplomata, qualidades conhecidas pelos diplomatas estrangeiros que tiveram contato com Azevedo nas discussões comerciais multilaterais. Roberto Azevedo tem sido o principal promotor da polêmica iniciativa brasileira, para discussão, pela OMC, dos efeitos do câmbio sobre o comércio global. A China, um dos principais opositores da ideia, já deixou claro seu apoio à candidatura do diplomata, porém. Pimentel argumenta que, como diretor-geral, Azevedo assumirá um papel de mediador, e caberá ao novo embaixador brasileiro na OMC defender a questão do câmbio.

"O Brasil tem uma candidatura forte, sempre cumpriu as regras da OMC, defende o sistema de comércio internacional, faz acordos, joga dentro das linhas do jogo", argumentou Pimentel. Lembrado que integrantes da OMC se queixam e ameaçam contestar recentes medidas do governo, como o novo regime automotivo, com vantagens para a produção nacional sobre os importados, o ministro reagiu com bom humor. "A reclamação faz parte do jogo também, ué, envolve dizer que isso ou aquilo é protecionismo." O ministro lembrou que, apesar do aumento nas medidas antidumping levantadas pelo Brasil contra importações desleais, não houve nenhuma contestação a elas na OMC. "Fazemos tudo dentro das regras do jogo, em nossa defesa comercial."

Roberto Azevedo tem, a seu favor, a reputação adquirida durante sua atuação nas disputas comerciais e nas discussões na OMC, nas quais ganhou o respeito de negociadores de outros países por sua maneira franca, seu conhecimento técnico e a capacidade de buscar alternativas para impasses, de maneira pragmática. Os defensores da candidatura de Azevedo argumentam que a indicação de algum ex-ministro alheio às discussões recentes na OMC ameaçaria deixar a organização sem um rumo claro nos próximos anos, ampliando a impressão de sua crescente irrelevância, observadora passiva da multiplicação de acordos de livre comércio paralelos, entre diversos países.

Nos preparativos da última reunião ministerial da OMC, de resultados muito modestos, no fim de 2011, Azevedo conseguiu um dos poucos consensos entre os negociadores, ao formular um texto, aceito por todos, em que se abriu a possibilidade de acordos parciais para a chamada Rodada Doha, a entravada discussão mundial de liberalização de comércio entre os países da OMC.

Até então, as conversas - estagnadas - na OMC se pautaram pelo chamado "single undertaking", o princípio pelo qual nada pode ser decidido enquanto não se fecharem acordos sobre todos os pontos em discussão. Por sugestão de Azevedo, os países concordaram em buscar "colheitas antecipadas", acordos parciais sobre temas que forem considerados do interesse de todos, para decidirem na próxima reunião ministerial, em Bali, em dezembro de 2013. Será mais uma tentativa de salvar a OMC do colapso total das negociações comerciais abrigadas na organização.