Título: BC projeta inflação muito maior para administrados
Autor: Salgado, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 28/03/2007, Brasil, p. A4

As projeções do Banco Central para a evolução dos preços administrados neste e no próximo ano estão muito acima das expectativas do mercado. Enquanto a última estimativa divulgada pelo BC contempla alta de 4,5% nesses preços, os analistas ouvidos semanalmente pela entidade apostam em um aumento entre 3% e 3,5%. A projeção, por exemplo, de elevação de 3,2% nos administrados e não de 4,5%, resulta em um IPCA 0,4 ponto percentual menor. Isso pode significar que o BC tem sido mais conservador do que o que seria necessário.

"Existe uma gordura razoável a ser queimada na inflação ao consumidor", afirma Luis Roberto Cunha, economista da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). No entanto, o professor espera que o Banco Central refaça suas projeções para os preços administrados no relatório de inflação de março, que será divulgado hoje. "As atuais estimativas reafirmam que a queda dos juros vai continuar a ser feita de forma gradual e isso não significa excesso de precaução", avalia Cunha.

A principal diferença entre os números projetados pelos economistas do mercado e pelo Banco Central está nos preços da energia elétrica. Enquanto o orgão projetava na ata do último Copom, divulgada no dia 15 de março, uma elevação de 3,3% nesses preços, há quem aposte em uma variação negativa de até 3%. É o caso de Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho, do Grupo de Conjuntura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele alterou suas estimativas devido à expectativa de revisão tarifárias para esses preços.

No entanto, Gomes Filho não critica o que alguns economistas encaram como excesso de cautela. "Essa história de que mais inflação é desejável e pode levar a um maior dinamismo na economia é balela", afirma o pesquisador da UFRJ. Ele acredita que a atividade já está crescendo com vigor e que o BC está esperando que a demanda fique ainda mais forte, uma vez que os juros atuam sobre ela com algum tempo de defasagem. "Acho que eles até tiveram a oportunidade de reduzirem os juros lá atrás. Mas agora, com um cenário internacional mais incerto, o espaço de ação ficou reduzido", explica.

Os números da inflação, porém, seguem bastante comportados. O dado mais recente, apurado pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo referente aos 15 primeiros dias de março (IPCA-15) apontam que a variação de preços acumulada nos últimos 12 meses está em 2,95%. Os preços administrados estão com alta de 3,31% nesse período, bem abaixo do fechamento de 2006, quando ficaram em 4,45%. A diluição do reajuste no transporte urbano em São Paulo contribuiu para esse arrefecimento.

Outro ponto de discordância entre os analistas do mercado e o BC são os preços de telefonia fixa. Enquanto o governo trabalha com um aumento de 3,9% nesses serviços ao longo do ano, Gomes Filho, da UFRJ, espera alta bem mais modesta, de 2,5%.

Para Otávio Aidar, da Rosenberg & Associados, o Banco Central está sendo mais conservador na política monetária do que o necessário. Segundo ele, as projeções para os administrados (4,5%) e para o IPCA total (4,3%) no fim de 2007 estão bastante descalibradas. "Eles estão preocupados com preços (administrados) que não vão reagir à uma política de juros mais apertada ou menos conservadora", explica Aidar. Isso porque os preços administrados, como tarifas de energia, telefone e aluguel, são reajustados por contratos.

Em seu último relatório de inflação o BC esperava que o IPCA terminasse o ano em 4,3%. É um número muito acima das expectativas do mercado, captadas por uma pesquisa semanal da entidade, que está em 3,73%. Os economistas esperam uma revisão nesse número do BC no relatório que será divulgado amanhã, mas acreditam que a projeção ainda ficará bem acima da média do mercado.

De qualquer forma, a expectativa é que o IPCA termine mais um ano abaixo da meta estipulada pelo governo. "E isso não é ruim. O grande problema de países como Venezuela, México e Argentina hoje é justamente o controle da inflação", argumenta Cunha. Ele acredita que a trajetória benigna dos preços ajudará o Brasil a passar pelas volatilidade dos mercados internacionais.