Título: Aprovação em queda e economia colocam Bachelet sob pressão
Autor: Uchoa, Rodrigo
Fonte: Valor Econômico, 28/03/2007, Internacional, p. A11

A presidente chilena, Michelle Bachelet, atravessa um período de inferno astral: sua popularidade vem caindo; ela teve de fazer uma segunda reforma ministerial em pouco mais de um ano de governo; e os dados do crescimento levantaram dúvidas entre economistas sobre a capacidade do país de sustentar uma expansão alta de longo prazo.

Segundo pesquisa publicada pelo diário "La Tercera", de Santiago, a aprovação do governo caiu para 45%, sua menor marca até agora. No início do mês, a aprovação estava acima dos 50%.

A crise mais recente enfrentada por Bachelet diz respeito a uma ampla reforma no sistema de transportes da capital, que acabou provocando confusão e aumento nas filas do sistema público de ônibus e trens. Por isso, a reforma ministerial começou pela substituição do responsável pela pasta dos Transportes.

Mas ela tentou também atacar um importante entrave para a economia ao desmembrar o Ministério de Minas e Energia, entregando a área de energia a um economista de prestígio no país. Este é o terceiro ano seguido que o Chile sofre escassez de gás natural, por causa da redução das importações vindas da Argentina, e tem problemas com a geração hidrelétrica e com o abastecimento de diesel, uma ameaça à produção industrial.

Em meio a isso tudo, as autoridades revisaram a expansão econômico do ano passado de 4,2% para 4%. Não é uma revisão radical, mas serviu de alerta para economistas chilenos e operadores do mercado financeiro. Questionados pelo Valor, especialistas apontam travas estruturais importantes que são a causa dos resultados menores do que os esperados na economia. Para eles, esses problemas não estão sendo devidamente atacados pelo governo Bachelet.

O economista Jose de Gregório, do Banco Central do Chile, divide o crescimento econômico recente do país em dois períodos. O primeiro, que ele chama de período dourado, vai de 1985 a 1997, quando o Chile cresceu a uma média anual de 7,1% - uma enormidade, se considerados que os 12 anos anteriores haviam registrado uma média de crescimento de 0,4%. Mas o período pós-1997 rebaixou a média anual de crescimento para cerca de 3%.

"Isso causa preocupações quanto à real capacidade do Chile de crescer: o período dourado foi apenas um fenômeno temporário ou o país pode voltar àquele nível de crescimento?", questiona.

De Gregório aponta os sinais positivos da economia: estabilidade macroeconômica; política fiscal austera; instituições fortes.

E aponta os sinais negativos. O primeiro é o baixo investimento em pesquisa e desenvolvimento, 0,5% do PIB - a China, por exemplo, investe 2,5% do PIB. Além disso, há pouca participação da iniciativa privada no financiamento da pesquisa (nos países da OCDE, cerca de 70% dos investimentos em P&D vêm da iniciativa privada, no Chile, esse percentual é de só 26%).

Apesar de o governo ter anunciado novos incentivos à área de P&D, eles são ainda considerados tímidos, diz o economista.

Outro grande entravem, na sua avaliação, é a baixa qualidade da educação no país.

Segundo o especialista em educação Rodrigo Vera, da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), houve uma confiança excessiva de que apenas a mão invisível do mercado serviria para consertar todas as deficiências do país. Para ele, a experiência de três décadas do modelo neoliberal produziu "diferenças, e não igualdades" nos sistemas de educação e de saúde.

Cerca de 15% dos estudantes do ensino médio freqüentam escolas particulares; 35 % estão em escolas públicas; e cerca de 50% vão a escolas particulares subsidiadas pelo Estado. Segundo dados da Unesco (fundo da ONU para educação), 90% dos alunos das escolas particulares entram na universidade, enquanto apenas 10% dos que freqüentam as escolas subsidiadas conseguem entrar no ensino superior.

"Sem reforma profunda nesse setor, não há como o país realmente deslanchar", diz Vera.