Título: Copa faz cursos de inglês jogarem no ataque
Autor: Guimarães, Ligia
Fonte: Valor Econômico, 04/01/2013, Especial, p. A12

Para o mercado brasileiro de ensino de idiomas, 2013 será o ano de transformar em lucros a expectativa pelos cerca de 600 mil turistas estrangeiros previstos para visitar o Brasil durante a Copa do Mundo de 2014. Setores de comércio e serviços correm contra o tempo para qualificar os profissionais que precisarão dominar pelo menos o repertório básico necessário para guiar, orientar, vender produtos e conversar em inglês com os visitantes.

Desta vez, o foco é buscar o aluno que trabalha na linha de frente do atendimento ao público: taxistas, vendedores, garçons, recepcionistas, vigilantes, policiais e auxiliares e de limpeza, perfil diferente dos tradicionais executivos e estudantes que atualmente lideram a presença nas salas de aula. "Estamos nos preparando para atender esse público diferenciado, que não estuda há muito tempo e já perdeu um pouco o hábito", diz Márcia Gherardi, diretora pedagógica do grupo Multi, dono de dez escolas de idiomas e profissionalizantes como as redes Wizard, Yázigi, Skill, Microlins e People.

A expectativa da empresa, que prevê faturamento de R$ 3,8 bilhões em 2012 e registrou expansão média de 30% nos últimos dois anos, é crescer mais 30% até 2014, ano da abertura do campeonato mundial, marcada para o dia 12 de junho.

Para acelerar o aprendizado, a estratégia das redes de idiomas é dar prioridade ao vocabulário usado na rotina de cada profissional. Em janeiro, o grupo Multi começará a vender em todas as suas redes o guia "Brasil Bilíngue", com 2 mil expressões e verbos que, segundo a empresa, são utilizados no atendimento ao turista estrangeiro.

Para reforçar a pronúncia de frases como "let me help you with your bags" ou "Avenida Brasil is three blocks that way", o material virá acompanhado de uma caneta que lê microcódigos de barras e repete palavras e frases em inglês. "O aluno precisa sentir que está aprendendo porque ele é adulto, chega à aula pensando na família, filho, salário e fica disperso. Ele tem um nível de desistência muito mais intenso", diz Márcia.

O Centro Brasileiro de Cursos (Cebrac), especializado em cursos profissionalizantes e que tem 110 unidades franqueadas em 23 Estados do país, lançará em janeiro em nível piloto o primeiro curso de inglês da empresa, que será testado na matriz, em Londrina (PR), e ampliado às demais unidades ao longo do ano. Em 2012, a empresa elevou de 20% para 30% do faturamento o volume investido na reformulação e criação de novos cursos para atender o público interessado em trabalhar na Copa, e pretende investir R$ 2 milhões até 2014 em novas franquias, cursos e reformulações. "Há uma procura atípica de profissionais do comércio, hotelaria, taxistas, serviços em geral", diz Giustino.

Há espaço para mais aulas: o nível de fluência em inglês no Brasil é considerado muito baixo e pior que o de outros mal avaliados países da América Latina, como Venezuela (40º) e El Salvador (41º). O estudo EF English Proficiency Index (EF EPI) de 2012, divulgado em outubro pela escola de idiomas internacional Education First, aponta que o país ficou na 46ª posição do ranking entre os 54 países, resultado dez posições pior do que o observado em 2011. A avaliação indica que os adultos avaliados têm dificuldade até mesmo em dar explicações simples - o que é um obstáculo para os negócios.

Luciano Timm, diretor de marketing da empresa que já treinou juízes e voluntários para a Olimpíada de Pequim, em 2008, diz que a previsão é que o segmento de cursos de imersão em idiomas cresça 33% neste ano, de carona na Copa. A Education First investiu também para garantir em 2013 a expansão do segmento de inglês online, a Englishtown, negócio promissor no ramo de aprendizado rápido: o curso básico com professor particular tem duração mínima de 30 dias e custa cerca de R$ 160 por mês. "O dado mais preocupante do estudo é a piora do nível de proficiência de um ano para o outro. Há tempo de se fazer algo, mas precisa ser uma ação estruturada", diz Timm.

Outra que tem planos ambiciosos para os alunos brasileiros é a Open English, escola de inglês online criada na Venezuela com capital do Vale do Silício em 2008, que já tem 50 mil alunos em 40 países. A empresa abriu suas portas no Brasil em novembro de 2011 e o país já é o campeão em vendas - foram 2 mil novos alunos em novembro -, podendo ser o maior mercado da rede já neste ano.

Além da aposta em recursos multimídia e aulas pela internet com 600 professores que têm o inglês como língua natal, a empresa quer atrair pessoas que já estudaram inglês e não aprenderam - a promessa da rede é garantir fluência em 12 meses. A principal estratégia de divulgação da empresa são inserções em canais de TV a cabo de uma peça publicitária em que o protagonista entoa no ritmo do rap o mantra "the book is on the table". A maioria dos alunos tem entre 25 e 45 anos, são profissionais e já estudaram inglês.

Na opinião de Elza Oliveira, coordenadora da área de idiomas do Senac-São Paulo, o ritmo da qualificação em idiomas para a Copa está bem atrasado. A procura dos cursos do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) ofertados pelo Senac-SP frustrou os planos para 2012. Apenas 35 alunos matricularam-se nos cursos gratuitos de idiomas do Pronatec-SP, voltados principalmente para treinar profissionais que já trabalham no setor de turismo - a escola esperava fechar o ano com milhares de inscritos.

O movimento nos cursos particulares também decepcionou: o segmento de idiomas do Senac-SP cresce a um ritmo entre 5% e 6%, o que representa cerca de 11 mil alunos por ano. Esperava-se, a esta altura, um ritmo de 10% a 15%. "Imaginávamos que seria uma procura enorme e está numa timidez. Para se aprender um idioma é preciso pelo menos 400 horas, e nos cursos básicos do Pronatec a carga horária mínima é de 160 horas. E agora que só temos um ano e meio até a Copa, o que vamos fazer até 2014?", pergunta Elza Oliveira.

A entidade elaborou para o programa os cursos de inglês e espanhol aplicados ao serviço turístico, contratados pelo governo. Além disso, a Editora Senac-SP lançou uma coleção de 12 fascículos com noções de francês, inglês e espanhol para atender turistas estrangeiros, voltados para recepcionistas, camareiras, motoristas, garçons e guias turísticos, que já vendeu 15 mil exemplares e está na segunda edição.

Para a diretora da área de língua inglesa no British Council, Lavaughn John, ainda dá tempo antes da Copa de treinar os prestadores de serviços em um nível do idioma que os permita "atender bem" os turistas. Dados do British Council apontam que apenas 5,3% da população brasileira sabe falar inglês em algum nível.

A organização está oferecendo cursos preparatórios de inglês com carga horária de 120 horas para policiais, em treinamentos que envolvem situações típicas de eventos esportivos, usando o expertise dos profissionais que trabalharam na Olimpíada de Londres de 2012. A intenção é negociar os treinamentos com cada Estado onde estão as cidades-sede da Copa no Brasil.

"O público da Copa não é familiar como dos Jogos Olímpicos, em geral são homens de 40 anos bebendo e se divertindo. A questão do policiamento é bem importante e 99% dos policiais não falam inglês e não têm a iniciativa de procurar um curso", diz Lavaughn John. A escola também oferece módulos básicos para taxistas, com 40 horas de aula.

"O mais importante para quem vai receber pessoas é a comunicação, entender e responder, que geralmente é o mais difícil", afirma a diretora do British Council