Título: "PIB não agüenta uma eleição com tantos custos"
Autor: Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 09/04/2007, Política, p. A6

Líder do PT na Câmara, eleito há dois meses, o deputado Luiz Sérgio (RJ) destoa dos demais colegas de partido. Enquanto a maioria ainda tem forte vocação oposicionista, o parlamentar fluminense foi governo em quatro dos cinco mandatos de sua carreira política. Iniciou sua trajetória como vice-prefeito e depois prefeito de Angra dos Reis. Está em seu terceiro mandato como deputado federal, dos quais só no primeiro era oposição.

Nem assim, Luiz Sérgio tem o discurso afinado com o Palácio do Planalto ou as demais siglas da base aliada. Ao falar ao Valor, na quinta-feira, na sala de reuniões da liderança do PT na Câmara, o petista criticou a cooptação de parlamentares feita pelos partidos governistas - notadamente PR e PMDB - e elogiou, ainda que com ressalvas, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em defesa da fidelidade partidária. Sobre a reforma política, o petista defendeu o financiamento público de campanha. "O PIB brasileiro não agüenta uma eleição com tantos custos", afirmou.

Dentro do partido, Luiz Sérgio critica fortemente a proposta do ministro da Justiça, Tarso Genro, de refundação do PT. Dividiu a responsabilidade dos erros cometidos pela legenda nos últimos dois anos - com o envolvimento no escândalo do mensalão - com todas as demais correntes internas. Para ele, não é só o Campo Majoritário, do qual ele e o ex-ministro José Dirceu fazem parte, o responsável pelos deslizes. A seguir, os principais pontos da entrevista ao Valor:

Valor: O senhor concorda com a decisão do TSE sobre a fidelidade partidária?

Luiz Sérgio: O PT sempre defendeu a fidelidade partidária. O estatuto do partido diz que o mandato é do partido e não do parlamentar. Com relação ao mérito, nós concordamos que tem de haver fidelidade partidária. Eu discordo completamente do método. Não cabe ao TSE legislar e ele tem legislado. Nos últimos seis meses, algumas resoluções do tribunal trouxeram certa intranqüilidade no quadro político brasileiro. E eles já vieram a público para reconhecer que tinham errado. Essa decisão é um dos pontos consensuais da reforma política. Não cabe ao TSE ter postura de legislar. Mas o TSE, tomar uma decisão de que o mandato é do partido, é algo importante. Reafirmar é importante.

Valor: Por que o Congresso não faz a reforma política?

Luiz Sérgio: No Brasil, fazemos distinção entre a lei que cola e a lei que não cola. A lei que cola, quando é constituída, ela vem com a marca de que foi uma conquista da sociedade. A reforma política precisa ter uma lei que pegue.

Valor: Qual a sua opinião sobre a cooptação de parlamentares?

Luiz Sérgio: No governo FHC fazia-se a mesma coisa e o PT era forte crítico. Não é o PT. O PT não pode impor normas ou regimento aos outros partidos. Precisamos respeitá-los. Como também o governo não pode interferir na vida e organização dos outros partidos. O que reflete é que temos uma cultura no país. E uma lei que legitima isso. Isso é algo que precisa ser cessado. A causa desse problema é que a legislação permite isso. Então, vamos mudar a legislação.

Valor: O senhor é a favor da refundação do partido, como propõe o ministro Tarso Genro?

Luiz Sérgio: Eu discordo radicalmente dessa posição do ministro. Você só refunda aquilo que acabou. E um partido que, no auge de uma crise, teve 300 mil filiados votando na eleição interna, que elegeu 82 parlamentares, que tem o presidente eleito que sai do processo muito mais fortalecido do que antes. Isso é uma vitalidade extraordinária. Houve erros? Houve erros. Reavaliá-los é importante. Mas refundar não se encaixa.

Valor: Já que houve tantos erros, o Campo Majoritário deve abrir espaço para os demais grupos do partido?

Luiz Sérgio: No PT, mesmo nos erros, todas as correntes estavam lá representadas. A metodologia do PT garante espaço para todos aqueles que conseguirem representação da base. O Campo Majoritário não foi hegemônico o tempo todo no PT. Essa oscilação de maior poder ou menos poder é um processo natural. A crise que nós vivemos foi uma crise dos partidos políticos. Todos estiveram envolvidos nela. A causa real é que se for feito um levantamento de quanto custou a campanha política brasileira para presidente, governadores, senadores, deputados federal e estadual, verificaríamos que o gasto é desproporcional ao tamanho da nossa economia. O PIB brasileiro não agüenta uma eleição com tantos custos.

Valor: Na reforma ministerial, o PT perdeu dois cargos fundamentais: a coordenação política e a liderança do governo na Câmara. O partido fracassou na articulação política?

Luiz Sérgio: Desde o primeiro momento, o partido manifestou nosso total e irrestrito apoio às escolhas do presidente. Mas isso mostra uma outra ousadia que o PT está tendo no poder: nós estamos buscando fazer um governo de coalizão. Buscamos construir uma coalizão e ela se produz muito mais no preenchimento dos cargos do que no discurso.

Valor: Mas o presidente já disse, até publicamente, que o PT cria muitos problemas para o governo. O senhor vai tentar fazer com que o PT atrapalhe menos?

Luiz Sérgio: Todo governante reclama um pouco do partido, porque o partido precisa cumprir o seu papel. Ele serve para questionar mesmo, propor, ser vigilante. Isso ainda é uma tensão maior na coalizão, onde uma diretriz de ação reflete uma média daqueles que estão no governo. Até se chegar a essa média, há um processo natural de disputa.

Valor: Mas o partido continuará fazendo críticas à política econômica?

Luiz Sérgio: O partido tem feito um papel importante. O PT sempre disse que era contra o superávit elevado, que os juros devem ser menores. Esse é um papel do partido. Mesmo que o governo não tenha condições reais e concretas de executar isso, não pode deixar de ver a razão pela qual o partido defende o seu programa.

Valor: O PT não repete o PSDB e PFL ao engavetar a CPI do Apagão Aéreo, mesma prática da época do governo FHC?

Luiz Sérgio: Nos oito anos de Fernando Henrique nós não tivemos CPI para valer. O que é preciso deixar claro é que CPI é um instrumento de disputa política. E é muito natural é que o governo não queira ceder esse espaço. E a oposição quer ganhar esse espaço de disputa. Agora, CPI não é o único instrumento e nem sempre seus resultados são satisfatórios. Não é que se assemelhe, mas ninguém que é governo quer ceder palanque para se fazer disputa.

Valor: Então, o engavetamento foi feito para não ceder o espaço político. Não foi a questão da falta de um fato determinado, como se falou. Houve, então, o fato determinado, como reconheceu o ministro Celso de Mello, do Supremo?

Luiz Sérgio: A Constituição diz que precisa ter um fato determinado. Discutir, por exemplo, as razões da queda do avião. O requerimento fala em casos estranhos.

Valor: Mas fala de crise aérea. Não há uma crise?

Luiz Sérgio: Há uma crise. Uma coisa é reconhecer que há uma crise, outra coisa é dizer o que que se quer investigar.