Título: Diplomacia é marca de brigadeiro Saito
Autor: Agostine, Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 09/04/2007, Política, p. A7

Assim que ficou sabendo que assumiria o comando da Aeronáutica, há quase dois meses, o tenente-brigadeiro Juniti Saito ligou para o cantor e apresentador Ronnie Von -seu colega de turma militar- e falou: "Eu cheguei lá". A frase era uma resposta a uma conversa iniciada quarenta anos atrás, quando os dois jovens cadetes da Força Aérea Brasileira (FAB) ainda se perguntavam: "Já pensou se alguém da nossa turma chega no posto de 'ministro da Aeronáutica'?" Dos tempos de cadete, Saito, responsável pela gerência da crise do sistema aéreo brasileiro, conserva a determinação, discrição e, embora não fosse o líder de sua turma, mantém a diplomacia.

"Saito San" e "cadete Nogueira", como o comandante e Ronnie Von eram conhecidos na Escola Preparatória de Cadetes do Ar, em Barbacena (MG), sonhavam com o posto máximo da Aeronáutica. Da turma dos "Brasinhas", conhecidos pelos diabinhos vermelhos com um tridente na mão costurados nos macacões-um personagem famoso dos quadrinhos da época- apenas Saito e mais um colega alcançaram as quatro estrelas da carreira militar. Eram 240 alunos.

Os dois jovens trilharam caminhos diferentes e Saito seguiu passo a passo o roteiro para conquistar o cargo máximo da Força Aérea. Chegou lá por ser o mais antigo na corporação. Por liderança, diz um conhecido seu, nunca chegaria ao posto.

Saito ascendeu ao comando do Aeronáutica, há pouco mais de um mês, como solução para o impasse dentro do Alto Comando. Nos bastidores, dizia-se que o tenente-brigadeiro Luiz Carlos Bueno da Silva, então comandante da Aeronáutica, preferia a indicação de outro brigadeiro, Paulo Roberto Rörig de Britto, seu "afilhado" na corporação. A cúpula da Aeronáutica divergiu sobre a indicação e a questão foi resolvida pelo princípio da antiguidade, tradicional entre os militares. Pelo mesmo princípio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva escolheu os comandantes do Exército e da Marinha.

Nos primeiros dias como chefe das Forças Aéreas, Saito chamou os integrantes da cúpula e mostrou-se aberto ao diálogo. A eles, reforçou os princípios da hierarquia e disciplina, fundamentais na ordem militar.

Para não acirrar os ânimos com os integrantes da cúpula, chegou a recusar uma festa planejada por colegas de sua turma de 1960, para comemorar sua promoção. "Ele ficou com receio de que parecesse uma demonstração de força e que tivesse uma repercussão ruim", recorda o coronel aviador da reserva Mário José Santana, colega de turma de Saito. "E ele é muito discreto e não é de perfil político. Mas não se exime do diálogo", observa.

Semana passada, os militares demonstraram que as eventuais divergências sobre a indicação de Saito são águas passadas. Na cerimônia de posse do chefe do Estado-Maior da FAB, brigadeiro José Américo dos Santos, ex-comandantes da Aeronáutica, ex-presidentes da Infraero, ministros do Superior Tribunal Militar e líderes de oficiais da reserva fizeram um ato de desagravo a Saito, em demonstração de unidade e coesão.

Na gestão da crise do "apagão aéreo", o tenente-brigadeiro também reverteu situações desfavoráveis. Com sua diplomacia, conseguiu fazer o presidente Lula mudar de idéia no primeiro embate que tiveram.

Saito assumiu o posto em meio à pressão dos controladores de vôo por uma reestruturação da carreira e enfrentou o motim que paralisou os aeroportos. O chefe da Aeronáutica deu voz de prisão os amotinados. Lula interveio e condenou a ação. Saito não retrocedeu e anunciou a abertura de inquéritos policiais militares contra os líderes do motim. O mal-estar entre o governo e a Aeronáutica ficou evidente e em menos de três dias, como em poucas vezes desde que foi eleito, Lula recuou e "reavaliou" a iniciativa de não punir os controladores. O presidente justificou que impediu Saito de dar voz de prisão porque recebeu relatos incompletos do que estava acontecendo nos aeroportos e aceitou o argumento apresentado pelo chefe da FAB de que o motim dos controladores poderia ter efeito cascata em outros setores aéreos e no Exército e Marinha.

O comandante da Aeronáutica foi nomeado pelo presidente como responsável pelo controle da gestão da crise e condecorado na semana passada.

Além da diplomacia, os colegas de "Saito San" destacam a disciplina oriental. Ele foi o primeiro nissei (filho de imigrantes japoneses) a chegar ao posto máximo da Aeronáutica e ganhou destaque e admiração dentro da colônia japonesa no país. Natural de Pompéia, cidade de 16 mil habitantes no interior de São Paulo, ele aprendeu a falar português somente aos sete anos de idade. Na comunidade agrícola em que vivia, era muito comum o japonês ser a língua mais falada.

Pai de três filhos, Saito dedicou 42 anos dos seus 64 anos à carreira militar. O comandante da Aeronáutica mantém contato freqüente com os colegas "Brasinhas", em reuniões em Barbacena, Campo dos Afonsos (RJ) e Pirassununga (SP), onde estudaram.