Título: Clima entre Poderes está envenenado
Autor: Ulhôa , Raquel
Fonte: Valor Econômico, 20/12/2012, Política, p. A6

O Congresso parou, mas não por causa do recesso parlamentar. Como era esperado, ficou para o início do próximo ano a decisão sobre o veto da presidente Dilma Rousseff à nova fórmula de divisão dos royalties aprovada pelo Congresso. Até 4 de fevereiro de 2013, a única coisa a ser votada no Congresso será a eleição dos novos presidentes da Câmara e do Senado.

A Lei do Orçamento também fica para 2013. O ano termina com um impasse entre as instituições, especialmente o Legislativo e o Judiciário, mas com reflexos diretos sobre o Executivo. O motivo é que a determinação do ministro Luiz Fux (STF) pela qual o veto dos royalties só pode ser apreciado depois de o Congresso analisar outros 3.060 vetos em pauta tem várias implicações, além de paralisar a pauta do Legislativo.

Para o presidente do Senado, José Sarney, a grande maioria dos 3.060 vetos presidenciais em pauta são irrelevantes. A rigor não são 3.060 projetos vetados. São 204 projetos, sendo que 51 vetados integralmente e 153 parcialmente.

O plano de voo era colocar na pauta os 204 projetos. Em seguida, algum líder pediria a inversão da pauta, algo corriqueiro no Legislativo. Assim o veto dos royalties passaria a ser o primeiro na lista de em votação. Fácil, não fossem os interesses em jogo. A decisão de Fux "abriu as portas do inferno", segundo expressão usada por um deputado.

Num primeiro momento, atinge o Legislativo, porque paralisou as atividades do Congresso. Ao mesmo, causa apreensão no governo Dilma, que tem interesse na manutenção de vetos que, se forem a voto, a presidente pode efetivamente sofrer uma derrota. No limite, o Legislativo pode também decidir retaliar projetos de interesse do Judiciário. Seria o caos institucional.

É improvável, mas o impasse entre os Poderes é real.

Tão logo a vice-presidente Rose de Freitas (do PMDB capixaba, que apoia o veto da nova fórmula de distribuição dos royalties) tentou organizar a pauta com a inversão, os interesses se manifestaram. Os parlamentares ligados aos ruralistas pediram que, antes dos royalties, fossem votados os vetos ao Código Florestal, mais antigos e igualmente dividem as bancadas dos partidos que o dos royalties.

Mas não parou por aí. A chamada "Bancada da Saúde" também reivindicou a votação dos vetos à Emenda Constitucional 29, ainda mais antigos, que permitiam volume maior de recursos financeiros para o setor. Os representantes dos sindicalistas pularam à frente e exigiram a votação, também mais antiga, do veto às mudanças no fator previdenciário.

O governo não tem interesse na votação desses vetos, especificamente, e orientou seus líderes a também não concordar com a inversão da pauta.

O deputado Henrique Alves (RN), líder do PMDB e provável futuro da Câmara acha que só há uma saída: um entendimento entre o Congresso e o Supremo. Para Alves, em algum momento o Congresso, Casa especialista na administração de conflito, encontrará a solução. Para o líder do PMDB, o erro foi do Legislativo, que não analisava vetos havia 12 anos.

Uma hipótese é o STF estabelecer que a regra vale para o futuro, a partir da votação dos vetos à nova divisão de royalties. O Congresso se encarregaria de encontrar uma solução para os vetos remanescentes.

O clima entre Legislativo e Judiciário está envenenado. Além da decisão de tirar da Câmara o poder de decretar a perda de mandatos, nos casos de sentenças criminais transitado em julgado, agora o STF entrou no que Sarney chamou de assunto da "economia interna" do Congresso. A situação deve piorar com a decisão de o Ministério Público Federal pedir, no recesso do Judiciário, a prisão dos três deputados cassados pelo Supremo, se o presidente do STF, Joaquim Barbosa, mandar os três deputados para a cadeia, sem que a sentença tenha transitado em julgado.