Título: Desafio energético abre oportunidades para o Brasil
Autor: Faleiros, Gustavo
Fonte: Valor Econômico, 17/04/2007, Caderno Especial, p. F5

A força do crescimento econômico na China, algo sem paralelo entre as nações em desenvolvimento, acabou por criar no país um grande dilema: o consumo de energia. Não que os chineses estejam preocupados com uma escassez imediata no suprimento energético, pois possuem 13% das reservas mundiais de carvão. O problema central é como controlar a demanda, tornar o uso de energia mais eficiente e menos poluente. A crise cria oportunidades para o Brasil, reconhecido mundialmente por seu potencial em fontes de energia limpa.

Desde sua abertura à economia de mercado, a China se transformou em um ator importante na demanda mundial por energia. Em 1993, o país deixou de ser exportador de petróleo para se transformar num dos maiores importadores do planeta. Atualmente, 45% de seu suprimento de óleo cru é importado. A escalada do crescimento nos últimos dez anos fez com que a China tirasse do Japão o posto de segundo maior consumidor de energia do mundo, atrás apenas dos EUA. Sua capacidade instalada para a geração elétrica atingiu em 2005, 400 gigawatts (GW), mais do que o dobro do que existe no Brasil.

A razão principal por trás de uma demanda tão aquecida, explica o diretor do China Desk da KPMG, Hsieh Yuan, foi a consolidação de uma numerosa classe média nas áreas urbanas em constante crescimento. "O desenvolvimento de cidades próximas ao litoral foi acompanhado pela instalação de sistemas de ar condicionado e calefação, além do aumento do número de carros", exemplifica o executivo. Ele lembra ainda as transferências de fábricas do mundo todo para o território chinês. Pesquisa da KPMG revela que 80% das 500 maiores companhias do globo têm ao menos uma unidade na China.

Essa tendência de alto consumo de energia também é acentuada pela baixa eficiência no uso do insumo. Em média, as empresas chinesas gastam quatro vezes mais energia do que as americanas, e até dez vezes mais do que as japonesas, para produzir artigos semelhantes. Como 70% do suprimento de energia elétrica no país provém de termelétricas movidas a carvão mineral, a atividade econômica teve um efeito colateral notável sobre o meio ambiente. Uma pesquisa conduzida pelo próprio governo chinês mostrou que, em 2000, 300 cidades tinham níveis de poluentes atmosféricos acima dos padrões definidos pela Organização Mundial da Saúde. "Em Pequim não se vê o sol", conta um acadêmico que visita a China com freqüência.

A economia movida à energia fóssil coloca os chineses na linha de frente no debate sobre o aquecimento global. Projeções da Agência Internacional de Energia mostram que a China se transformará no maior emissor de gases estufa do planeta já em 2009, ultrapassando o campeão EUA.

O panorama já está fazendo com que o governo chinês estabeleça novas regras para aumentar a eficiência energética e conter a poluição. A partir deste ano, novos prédios devem atender níveis mais baixos de consumo de energia, e os edifícios já existentes devem se adaptar até 2020. Novos planos para exploração de carvão e construções de termelétricas estão congelados até que as velhas usinas melhorem seu desempenho. Em 2006, pela primeira vez, o governo estabeleceu metas de redução no consumo de energia (4%) e um corte nas emissões de SO2 nas termelétricas (2%).

Mas ao contrário do que se esperava, os indicadores mostraram que tanto a demanda energética quanto a poluição caem em ritmo bastante lento, abaixo das metas. Na opinião do diretor do Núcleo de Estudos Asiáticos (Neasia) da Universidade Nacional de Brasília (UNB), Lytton Guimarães, o cumprimento de metas estabelecidas pelo governo central chinês é muito difícil. "O crescimento na China é tão dinâmico, tem uma sinergia própria, que não há como controlar", analisa Guimarães.

É neste contexto que o Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) enxerga um potencial a longo prazo para empresas brasileiras. Para o secretário-executivo da CEBC, Rodrigo Maciel, o problema energético e ambiental tornará mais atrativa a transferência de produção da China para outros países. "Ao invés de comprar o grão de soja para processar, os chineses podem comprar a soja processada para economizar energia", ilustra Maciel.