Título: Fim da CPMF no crédito deve alavancar operações
Autor: Carvalho, Maria Christina
Fonte: Valor Econômico, 16/04/2007, Finanças, p. C12

Depois de amanhã, o presidente do Banco ABN AMRO Real, Fábio Barbosa, vai comandar a primeira reunião de diretoria da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) desde que assumiu a presidência, na semana passada. Uma das primeiras pautas de Barbosa será discutir os pontos que podem ser alvo da auto-regulação que pretende desenvolver.

Barbosa, 52 anos, assume em um momento auspicioso. O governo fala em reduzir a zero a CPMF do crédito e a economia pode crescer 4,5% neste ano - dois fatores que devem alavancar mais as operações, que já cresceram 21% ao ano desde o início da década.

Além disso, está animado com o movimento de desobstrução de gargalos que o câmbio apreciado está provocando, com as empresas ajustando custos e o governo acenando com a redução de tributos e estímulos ao investimento.

A seguir, os principais pontos da entrevista.

Valor: Como avalia a possível redução a zero da CPMF do crédito?

Fábio Barbosa : Vai na direção certa. A CPMF encarece o crédito. Em operações de curto prazo para grandes empresas, que pagam spread muito baixo, pode representar parcela importante do custo do empréstimo. O 0,38% de CPMF acaba sendo maior do que o spread. Se a CPMF cair, vai estimular a tomada de crédito para investimento e para consumo pelas empresas e pessoas físicas. O sistema financeiro calcula que os impostos representam um terço do custo do crédito.

Valor: Como está vendo a situação econômica atual?

Barbosa : Estou otimista. A economia deve crescer 4,5%. Mas, precisamos aumentar os investimentos. É necessário estimular o setor privado a investir em infra-estrutura e concessões para manter o ritmo de crescimento por muito tempo. Isso facilita a decisão dos que avaliam se devem ou não expandir os negócios.

Valor: O câmbio apreciado não prejudica os negócios?

Barbosa : A pressão sobre o câmbio deve continuar em função da aceleração do crescimento e do apetite do investidor estrangeiro. Como isso veio para ficar, alguns setores vão se beneficiar e outros terão que se renovar, buscando maior competitividade. É impossível todos se darem bem ao mesmo tempo, mas o quadro é positivo no geral.

Valor: Qual a origem da apreciação cambial?

Barbosa : A valorização do real não reflete problemas da economia brasileira, como acham alguns, mas sim acertos. Estamos vivendo uma bonança com US$ 110 bilhões de reservas e economia em crescimento. Também está influindo o cenário internacional, com a valorização dos preços das commodities e o enfraquecimento do dólar. O euro estava a 1,32 dólar no final do ano passado e agora custa 1,35 dólar. Os juros elevados têm influência reduzida. As taxas estavam acima de 20% há três anos, já caíram mais de dez pontos e o câmbio continua se apreciando.

Valor: Mas, qual o aspecto positivo dessa situação?

Barbosa : As empresas estão se tornando mais competitivas e ajustando a estrutura de custos. Como o quadro tende a perdurar, temos que mexer na competitividade do próprio país, na questão tributária, da infra-estrutura. E o governo começa a fazer isso, deixando mais claro quais são os verdadeiros gargalos e trabalhando neles.

Valor: O que vai acontecer com os bancos quando o juro nominal básico cair para um dígito? Será antes do final do seu mandato, em 2010?

Barbosa :Não vou arriscar fazer previsão sobre a taxa de juros. A tendência é de queda, a continuar o cenário internacional favorável e o processo de desobstrução dos gargalos da economia doméstica. Mas não arrisco uma data.

Valor: E os bancos, como ficam nesse processo?

Barbosa : A taxa já caiu bastante nos últimos anos, de 26,5% no início de 2003 para os 12,75% atuais. O que tem acontecido é que o volume de operações de crédito vem crescendo em ritmo acelerado, a uma média média de 21% ao ano, nos últimos seis anos. Com taxas de juros menores, os volumes de crédito crescem e os prazos se alongam. O que se espera é que o sistema financeiro seja eficiente e exerça seu papel de rentabilizar a poupança que lhe foi confiada e repassar os recursos para empréstimos para consumo e investimento. Vejo com otimismo o cenário futuro para os bancos. Se a economia for bem, os bancos continuarão crescendo e lucrando. Lucro é bom para todo mundo.

Valor: A imagem dos bancos não está ruim?

Barbosa : A gente sempre vê os bancos ligados a críticas sobre tarifas, spreads e lucratividade. A população em geral acaba tendo uma imagem negativa do sistema financeiro mas não necessariamente do banco em particular. A relação das pessoas com as agências e os gerentes em geral é muito boa. É preciso separar a questão em dois aspectos: há coisas que os bancos precisam melhorar para se conectarem com os anseios da sociedade e mas há críticas superficiais e parciais.

Valor: Mas, a queda lenta dos juros do crédito é um fato.

Barbosa : O spread para pessoa física caiu de 54% em 2002 para 39% em fevereiro passado. Foi uma queda substancial. O que não se leva em conta é que foi incorporado um número grande de tomadores de crédito - empresas pequenas e médias e pessoas físicas de baixa, cujo histórico de crédito é mais recente e, por isso, pagam juros maiores. A média acaba distorcida por esses novos clientes do mercado. O prazo médio do crédito foi alongado. Era de 220 dias e agora é de 300 dias. Prazos mais longos tendem a ter spreads maiores porque o risco é maior. Com maior transparência é possível explicar essa situação e ajudar na melhor compreensão de quais são os problemas de modo a limitar as críticas àquilo que de fato o setor financeiro precisa fazer melhor.

Valor: Como a Febraban pretende tratar de antigos problemas que pesam no spread?

Barbosa : Compulsório, carga fiscal, direcionamento de crédito, proliferação de leis municipais são todos problemas que acabam onerando a intermediação financeira. São assuntos complexos que precisam ser tratados na busca de uma solução que acomode as várias partes envolvidas. O compulsório, por exemplo, tem impacto na política monetária. Por isso, sua solução não é trivial.

Valor: E a questão do lucro, que muitos consideram astronômicos?

Barbosa : A rentabilidade média do setor financeiro foi de 23% em 2006 segundo o Banco Central. No mercado internacional, o retorno ficou entre 18% a 20%. No exterior, as taxas de juros básicas estão por volta de 5%; no Brasil, perto de 13%. O Brasil precisa de bancos fortes para apoiar a economia e para não se precisar mais de programas de recuperação de bancos estatais e privados, extremamente custosos para a sociedade.

Valor: Por que as tarifas não param de crescer?

Barbosa : Às vezes se pega uma tarifa em particular e se diz que ela subiu muito. Mas, os bancos trabalham com cestas ou pacotes de tarifas, que premiam os relacionamentos mais intensos. Assim como as companhias aéreas dão milhagem, os bancos chegam a isentar de tarifas os clientes mais presentes. A concorrência está aumentando. É só ver a disputa pelas folhas de salário.