Título: "O Brasil tem bons produtos, mas não sabe vender", diz embaixador chinês
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 18/04/2007, Brasil, p. A5

"Reclamar não vai adiantar, o importante é competir". O alerta para as empresas brasileiras foi feito, em linguagem direta e pouco diplomática, pelo embaixador da China no Brasil, Chen Duqing. Ao discursar para uma platéia reunida pelo Conselho Empresarial Brasil - China, ontem em São Paulo, ele enfatizou que as indústrias brasileiras têm que mudar sua "mentalidade", caso contrário, o processo de globalização se tornará mais difícil para o país. "É evidente que o Brasil pode viver de portas fechadas, mas não dá para viver bem."

O embaixador chinês reclamou que as empresas multinacionais já instaladas no Brasil estão dificultando a entrada das companhias da China. "Os chineses são vistos como intrusos, mas o mercado brasileiro é composto por multinacionais. Mais um país não é um problema", disse.

Em entrevista ao Valor, Chen especificou o caso do setor automobilístico, no qual a chinesa Chery encontrou dificuldades para entrar no Brasil. A montadora optou pelo Uruguai, sócio do Mercosul, onde pretende instalar uma planta. "No Brasil, o imposto de importação é alto, a mão-de-obra não é barata e a burocracia é complicada", disse o embaixador. O Uruguai é menos exigente na agregação de conteúdo local: apenas 35% no primeiro ano.

O embaixador chinês reconhece que o investimento prometido pelo país asiático na aproximação política entre China e Brasil ainda está muito aquém do potencial. "São poucas as empresas chinesas que estão no Brasil", disse. A maior parte do investimento ocorre nos setores de telecomunicações, informática e eletroeletrônicos.

Na área de infra-estrutura, na qual os projetos são mais vultosos, pouca coisa saiu do papel. Chen citou a usina energética de Candiota, cujos trabalhos já começaram, que conta com investimento chinês. Ele falou também sobre a joint venture entre a chinesa Baosteel e a brasileira Vale do Rio Doce para a construção de uma siderúrgica no Maranhão. "O problema é que o governo local não fez nada. Dizem que o impacto ambiental é complicado se a siderúrgica estiver na ilha. Podiam ter falado desde o início", reclamou o embaixador.

Depois de o país crescer puxado pelo investimento estrangeiro, o governo chinês decidiu estimular o consumo interno. Por isso, está incentivando a importação. "O Brasil tem bons produtos, mas não sabe vender", diz Chen. A China organiza em novembro uma feira para indústrias da América Latina e Europa mostrarem produtos.

De acordo com o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Ivan Ramalho, o Brasil promoverá uma missão comercial à China, por orientação do ministro, Miguel Jorge, ainda neste semestre. O objetivo é tratar não apenas de importação, mas também de exportação para o país asiático.

Os dois lados concordam que a saída para as dificuldades no comércio bilateral é a negociação. "O melhor é negociar", diz Chen. Brasil e China celebraram recentemente dois acordos de restrição voluntária do comércio nas áreas de têxtil e de brinquedos. Segundo Ramalho, os acordos são a melhor alternativa, porque entram em vigor rapidamente e não expulsam o produto do mercado, apenas evitam surtos de importação.

Os setores que mais reclamam da concorrência chinesa - têxtil, confecções e calçados - estão solicitando ao governo que eleve para 35% a Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul. Ramalho disse que o assunto será avaliado pela Câmara de Comércio Exterior, mas que a decisão ainda não foi tomada. (RL)