Título: Cade suspende compra do grupo Ipiranga
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 18/04/2007, Brasil, p. A6

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) do Ministério da Justiça suspendeu, na noite de ontem, os efeitos da compra da Ipiranga pelos grupos Petrobras, Braskem e Ultra.

A decisão foi tomada pelo conselheiro-relator do processo, Luís Fernando Rigato Vasconcellos e significa, na prática, o congelamento da operação. Vasconcellos concedeu medida cautelar para proibir Braskem e Petrobras de participarem de decisões comerciais e estratégicas na Copesul. E vetou a Petrobras de fazer qualquer alteração comercial na área de distribuição de combustíveis adquirido da Ipiranga.

O conselheiro vetou também a transferência de novos ativos petroquímicos da Ipiranga. Ele determinou que estes ativos "permaneçam em unidade juridicamente independente". E incluiu nessa unidade independente a manutenção da linha de produtos, da marca e da rede própria de distribuição.

Vasconcellos justificou a medida alegando que é necessário preservar a reversibilidade da compra, caso o Cade conclua pela reprovação do negócio no futuro. Ele esperou a Bolsa de Valores fechar para divulgar a medida à imprensa. Com isso, quis evitar prejuízos às ações das empresas envolvidas no negócio.

O conselheiro determinou ainda que qualquer futura modificação nos acordos de acionistas das empresas seja submetida previamente para análise do Cade. As empresas estão sujeitas a multa diária de R$ 100 mil, caso descumpram qualquer um dos itens estipulados pelo órgão antitruste.

A medida cautelar será analisada hoje pelo plenário do Cade, composto por sete conselheiros. Formalmente, eles podem rever alguns pontos, ou mesmo votar contra a proposta de Vasconcellos. Mas, a expectativa é que o plenário do Cade concorde com a medida, pois ela foi discutida em reuniões reservadas entre os conselheiros.

Vasconcellos resolveu suspender os efeitos da compra da Ipiranga depois de receber um requerimento das secretarias de Acompanhamento e de Direito Econômico dos ministérios da Fazenda e da Justiça (Seae e SDE). Ambas concluíram, em análise preliminar, que o negócio tem o potencial de causar danos à concorrência nos setores petroquímicos e de distribuição de combustíveis. Em nota conjunta, ressaltaram que o negócio criou alta concentração, elevou as barreiras para futuros concorrentes e criou uma integração vertical para quem atua no refino e na indústria petroquímica.

No mercado de distribuição de combustíveis, as secretarias apontaram que a aquisição deverá elevar a participação da Petrobras para cerca de 50% em vários municípios nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O vice-líder deste mercado - cujo nome não foi revelado na nota - teria aproximadamente 10% de participação e, com isso, as condições para a competição seriam reduzidas.

"Ademais, o Ultra, que será a principal concorrente da Petrobras Distribuidora no Sul-Sudeste, irá gerir sob comissão os negócios da Petrobras nessas regiões, nos termos do contrato", informaram as secretarias. "Esse canal de comunicação e comunhão de interesses entre dois concorrentes é potencialmente danoso à concorrência e poderia favorecer conluio entre as empresas nas regiões Sul e Sudeste", concluíram a Seae e a SDE.

Já no setor petroquímico, as secretarias alegaram que, como a Petrobras controla o fornecimento de matéria-prima (gás e nafta) de todos os pólos petroquímicos do Mercosul, "sua re-entrada como concorrente no mercado petroquímico, participando do bloco de controle da Copesul, suscita preocupações concorrenciais". Além disso, afirmaram, com o controle da Ipiranga, a Braskem "aumentará a assimetria no mercado nacional de resinas".

Neste ponto, as secretarias quiseram enfatizar que a compra dos ativos petroquímicos da Ipiranga ampliará o poder da Braskem na produção de resinas plásticas frente a outros concorrentes. A aquisição dará à Braskem mais de 50% de participação de mercado na fabricação de matérias-primas utilizadas pela indústria de plástico - 53% no polietileno, 52% no polipropileno e 53% em PVC. Essa participação inclui não apenas a fatia dos outros produtores domésticos, como também dos importadores de resinas. Essa situação de ampliação do poder da Braskem na produção de resinas poderá, segundo a Seae e a SDE, alterar o regime de concorrência nesses mercados, "em prejuízo da indústria de plásticos e do consumidor final".

As secretarias disseram que a medida cautelar não significa "necessariamente" que serão impostas restrições à aquisição no futuro. "Tratam-se apenas de medidas de governança corporativa que visam a preservar a reversibilidade da operação, protegendo em última instância o consumidor final e aumentar a transparência e confiança dos investidores no mercado de capitais brasileiro", justificaram, em nota.

A Petrobras e o Ultra informaram que não comentariam oficialmente o assunto. Em outros casos julgados no Cade, a Braskem advogou a tese de que o mercado interno segue as cotações praticadas no exterior e, por isso, as fusões locais não repercutem negativamente aos consumidores. Essa foi a tese que prevaleceu no Cade, em 2005, quando o órgão antitruste aprovou a criação da Braskem, realizada em 2002. Em nota no fim da noite de ontem, a Braskem disse que a operação é "pró-competitiva" e representa uma "importante" fase da reestruturação do setor. A petroquímica afirmou ainda que a medida cautelar do Cade não muda o processo de fechamento da operação, previsto para hoje. (Colaborou André Vieira, de São Paulo)