Título: Índia precisa reformar seu setor agrícola para crescer, diz a OMC
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 24/04/2007, Internacional, p. A13

As altas taxas de crescimento econômico da Índia nos últimos anos são resultado em grande parte da decisão de Nova Déli de abrir unilateralmente seu mercado e reduzir tarifas de importação, avalia a Organização Mundial do Comércio (OMC), em um relatório confidencial.

Mas a entidade adverte que, para a rápida expansão indiana ser sustentável, reformas mais profundas são necessárias, principalmente no sensível setor agrícola. O país cresceu 8,5% em média desde 2003 e o governo prevê expansão entre 8% e 10% no longo prazo, mais que o dobro do Brasil.

O relatório que a OMC acaba de enviar aos 150 países membros sob o carimbo de "restrito" - e ao qual o Valor teve acesso - servirá de base para o exame da política comercial da Índia que será feito no dia 23 de maio. Nas discussões sobre a Rodada Doha, o país vem resistindo a abrir seus mercados a produtos agrícolas e industriais.

A entidade nota que o "impressionante desempenho" econômico da Índia tem sido impulsionado pelo setor de serviços, "onde a liberalização foi mais rápida". Diz que a expansão já se traduziu numa melhora dos indicadores sociais, incluindo a queda na mortalidade infantil, redução no número de pobres e analfabetos e melhora no acesso sanitário e à água potável.

No caso da agricultura, a avaliação da OMC pode dar fôlego para os hábeis negociadores indianos persistirem na sua demanda por uma grande flexibilidade na designação de produtos especiais, que teriam um corte tarifário menor.

A participação da agricultura no Produto Interno Bruto (PIB) da Índia continua a declinar, de 23% em 2000 para 18% no ano passado. Mas o setor emprega 60% da população ativa, o que indica que a produtividade do trabalho agrícola é apenas 20% do nível do resto da economia.

Nesse cenário, a agricultura indiana cresce de maneira "lenta e irregular", com a baixa produtividade atribuída a fragmentação das propriedades, dependência das chuvas, e também pela maneira "inadequada" como o governo gasta os recursos para o setor. Quase tudo vai para subsídios, sobrando pouco para infra-estrutura e pesquisa. As subvenções diretas foram estimadas em 1,4% do PIB em 2006. Mas um recente estudo do Ministério das Finanças sugere que os subsídios implícitos e explícitos somaram 4,2% do PIB em 2004. A maior parte é para alimentos.

A segurança alimentar continua a ser uma grande preocupação na Índia e razão da intervenção governamental. Daí fixação de preço mínimo para 25 commodities essenciais, controle de preço para outras colheitas, subsídios para fertilizantes, água, eletricidade e sementes.

Além disso, a Índia tem alta tarifa de importação de produtos agrícolas. A média aplicada é de 40,8%. Na verdade, a alíquota agrícola é três vezes menor do que os 114,2% da média consolidada, que é a taxa máxima que Nova Déli pode fixar.

"A diferença entre alíquota aplicada e consolidada é considerável, o que dá ao governo margem importante para aumentar as tarifas aplicadas, que têm sido usadas para elevar alíquotas para vários produtos agrícolas nos últimos anos", diz o documento.

A coalizão no governo, que inclui dois partidos comunistas, mantém um sistema tarifário complexo, com mudanças freqüentes nas taxas e numerosas exceções. Mas as restrições à importação caíram para cerca de 3,5% das linhas tarifárias. Outras 300 importações agrícolas e industriais "sensíveis" são monitoradas.

O setor industrial indiano cresce quase 7% desde 2000, e o relatório indica uma situação relativamente boa. As tarifas de importação industrial têm caído. A média aplicada é de 12,1%, abaixo do teto de 34,9% que o país pode fixar. Persistem altas alíquotas para setores como têxteis e confecções (22,5%) e automóveis (33,6%). As alíquotas representam 16% dos recursos do governo central.

Por outro lado, o país continua a usar medidas anti-dumping para proteger sua indústria de importação com preço considerado deslealmente baixo. A maioria das ações tem como alvo produtos químicos, de plásticos e de borracha, metais e têxteis, sobretudo originários da China.

Os serviços crescem 9% ao ano, apesar do grande gargalo na infra-estrutura. Os serviços de transporte marítimo e de portos ainda são ineficientes, sendo um "grande impedimento ao comércio".

A OMC questiona a eficácia de "generosos" incentivos a investimentos nas Zonas Econômicas Especiais, que criam poucos empregos e sem qualificação. Também aponta receita tributária baixa em relação ao PIB, "insuficiente" para a necessidade de desenvolvimento.

A OMC diz ainda que o investimento privado é desestimulado por altas taxas de juros, e considera "decepcionante" o Investimento Direto Estrangeiro (IDE) equivalente a apenas 1% do PIB. Daí a necessidade de reformas profundas.