Título: Real valorizado já ameaça produção de carros no país
Autor: Olmos, Marli
Fonte: Valor Econômico, 24/04/2007, Empresas, p. B9

Se até hoje as queixas da indústria automobilística em torno da valorização do real se limitavam aos prejuízos com as exportações agora os dirigentes das montadoras começam a apontar o câmbio como motivo de perda de competitividade em toda a produção, incluindo as vendas no mercado interno. E ameaçam importar no lugar de produzir no país.

"Se o real continuar se fortalecendo e os custos continuarem aumentando todas as montadoras, que também têm fábricas fora do Brasil, poderão começar a importar", disse o presidente do grupo Fiat, Cledorvino Belini, durante seminário do setor automotivo.

"É duro, mas é a realidade", disse Belini diante de uma platéia formada por executivos da indústria de autopeças e de suprimento de matéria-prima, durante evento da Sociedade de Engenharia Automotiva (SAE).

Para Belini, importar no lugar de produzir no país "seria o fim da picada". E é preciso, segundo disse, lutar para que isso não aconteça. "Mas ao mesmo tempo cada empresa quer preservar o seu negócio", disse. Para o executivo, a prevalecer a atual situação cambial, o Brasil acabará "exportando apenas montanhas de bananas". Belini disse que o país corre o risco, assim, de "se transformar em um grande exportador de commodities e grande importador de veículos e outros bens de consumo".

A Fiat, o maior vendedor de automóveis do Brasil, ainda não está importando peças em grande quantidade porque, segundo Belini, seu sistema de produção depende do chamado "just-in-time", por meio do qual os componentes chegam à linha de montagem no exato momento de produção. Por outro lado, os seus fornecedores já começam a trazer peças de outros países, segundo o executivo.

Com a valorização do real, a montadora italiana teve de elevar os preços dos carros exportados já em 2006. Em decorrência disso, enquanto o volume de vendas ao exterior ficou estável em 96 mil unidades no ano passado, na comparação com 2005, a receita com as vendas externas subiu 36,2%, num total de US$ 871 milhões.

O presidente da Fiat também disse que a iminente perda de competitividade das montadoras instaladas no Brasil em relação às fábricas de outras regiões, notadamente a Ásia, decorre, em parte, por culpa da composição da carga tributária no país.

Após longo debate entre engenheiros do setor a respeito de como tem de ser o carro de baixo custo, Belini disse que o Brasil tem veículos baratos em relação ao mundo. Mas os preços desses veículos aumentam não apenas porque o carro produzido aqui é mais tributado do que em outros países como também em decorrência da cascata de impostos que a indústria enfrenta, diferentemente do que ocorre em países como China.

"Cada um de nós também tem de fazer a sua lição de casa e buscar eficiência e produtividade é obrigação da industria porque ainda existe muito desperdício", disse. "Mas com a carga tributária reduzida nosso produto seria competitivo", completou.

Belini endossa o movimento que a indústria automobilística lançou no segundo mandato do governo Lula em defesa da redução de impostos no ato da compra do carro e elevação gradativa ao longo do tempo de uso, uma idéia adotada em países como Itália e que serve para estimular o consumidor a trocar o carro e promover uma renovação da frota.

Segundo ele, o carro de baixo custo depende ainda de desenvolvimento de novas tecnologias e materiais mais leves. "Não adianta querer vender para o brasileiro um carro mais barato que não consegue subir a serra de Santos", disse.

Em relação ao desafio lançado pelo ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Miguel Jorge, para que o setor persiga agora a meta de produzir 5 milhões de veículos por ano, Belini concorda que esse deve ser o volume a ser atingido somando as produções do Brasil e Argentina por volta de 2010. Para 2007, os fabricantes no Brasil esperam a produção de 2,78 milhões. "Com 5 milhões, dos quais 1 milhão voltados á exportação estaremos firmes, independentemente de ameaça asiática."