Título: Argentina tem inflação divergente, mas estável
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 16/01/2013, Internacional, p. A13

Com um índice oficial de inflação de 10,8% em 2012, divulgado ontem pelo instituto governamental Indec, a Argentina entrou em seu sexto ano de estatísticas de variação de preços contestadas dentro e fora do país. Uma média das estimativas privadas, apresentada pela oposição no Congresso Nacional um dia antes da divulgação do número oficial, apontou uma variação de 25,6% nos preços ao longo do ano passado.

Os consultores privados e o governo argentino, contudo, convergem para um ponto: a inflação argentina está relativamente estável e tende a apresentar variação pequena no curto prazo. Nos escritórios de economistas que assessoram o meio empresarial a projetar cenários para 2013, não se trabalha com a hipótese de uma escalada do índice de preços.

"O governo está amortecendo parte do aumento de gasto público que promove com o uso das reservas internacionais para o pagamento de dívida e com as sobras que consegue no setor externo", disse o economista José Luis Espert, de visão bastante crítica ao governo da presidente Cristina Kirchner.

Desde 2010, o pagamento dos juros e do principal de títulos emitidos em moeda estrangeira é feito com o saldo das reservas internacionais. A estratégia faz com que a dívida argentina em dólar seja pequena atualmente, em torno de 12% do PIB.

O gasto primário do setor público aumentou 32% entre janeiro e novembro do ano passado, enquanto a receita corrente subiu 26%. Mas parte dessa expansão de gastos proveio de fontes como os recursos da Anses, a autarquia que administra a previdência pública e os fundos de pensão privados que foram estatizados em 2008.

"O gasto público tende a aumentar em 2013, o que terá efeito inflacionário, mas haverá mais folga no setor externo, já que a arrecadação e o resultado na balança de pagamentos foram afetados por uma seca que levou a uma perda de 10 milhões de toneladas de soja", disse o economista Ramiro Castiñera, da consultoria Econometrica.

A aposta da expansão do gasto público está no calendário político: em outubro serão realizadas eleições parlamentares, e o investimento público é um dos instrumentos do governo para tentar reaquecer a economia e colher os frutos na eleição.

Mas, ainda assim, o aumento na taxa real da inflação deverá ser modesto. O crescimento econômico de no máximo 3% tende a moderar as expectativas de reajuste no setor privado."Nossa expectativa é que haja um crescimento de três pontos percentuais na taxa real", disse Espert.

Caso a expectativa se confirme, a Argentina encerraria este ano com uma inflação real anual próxima a 30%, o que poderia colocar o país como o de mais alta inflação no mundo, caso a média dos índices privados fosse oficialmente reconhecida.

De acordo com dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), apenas Belarus, Irã, Venezuela, Sudão e Sudão do Sul possuem inflação acima de 20% ao ano, sendo que em todos estes países a trajetória prevista para 2013 é de queda.

Em pronunciamentos públicos, o principal estrategista econômico do país, o vice-ministro da Economia, Axel Kicillof, defende a tese de que políticas anti-inflacionárias tendem a beneficiar setores que vivem de renda, porque deixariam de ter seus ativos em crédito depreciados. Já a expansão da economia, mesmo à custa do aumento da inflação, beneficiaria o setor produtivo, que é tomador de crédito na moeda nacional.

"A diferença é que em 2013 continuaremos com a inflação alta dos últimos anos, mas sem a expansão econômica que vinha sendo registrada desde 2003. Os efeitos desta variação de preços na economia tendem a ser cada vez mais danosos", acrescentou Castiñera.