Título: Ações trabalhistas da Varig velha têm a Gol como foco
Autor: Campassi, Roberta e Vilella, Janaína
Fonte: Valor Econômico, 25/04/2007, Empresas, p. B1

A Gol, segunda maior companhia aérea nacional, está sendo acionada em pelo menos dezessete ações trabalhistas movidas por ex-funcionários da Viação Rio Grandense - a velha Varig -, que está em recuperação judicial, apenas nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul. Todos os processos foram abertos entre os dias 2 e 18 de abril deste ano, depois que a Gol comprou a VRG, unidade que foi desmembrada da Varig em julho de 2006, numa das etapas do processo de recuperação.

A abertura das ações reacende o debate sobre a herança de passivos em casos de compra de empresas em recuperação judicial, bem como de suas unidades. A polêmica existe mesmo no caso da VRG, que foi criada sem quaisquer dívidas da velha Varig.

No Rio, onde a Varig tem sua sede administrativa, há oito processos de ex-funcionários da Varig contra a Gol Linhas Aéreas ou Gol Transportes Aéreos (holding de capital aberto e subsidiária, respectivamente). O levantamento foi feito pelo Valor no site do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro (TRT-RJ). Em São Paulo, há mais dois processos e no Rio Grande do Sul, mais sete, segundo informações da assessoria de imprensa do TRT-SP e do TRT-RS.

A Gol, no entanto, é alvo potencial de um número maior de processos. No Rio, existem 98 outras ações trabalhistas abertas contra a VRG ou suas ex-controladoras, a VarigLog e a Volo do Brasil. Advogados que representam os ex-funcionários argumentam que quem entrou com as ações pode incluir a Gol como ré, agora que ela é a dona da VRG. "Vamos requerer a inclusão da Gol em todos os processos", diz o advogado Leonardo Quintella, do escritório A. D. Meirelles Quintella, que atua em cerca de 30 ações movidas contra VRG e Volo. Ele também representa cinco ex-funcionários da Varig que entraram com ações diretamente contra a Gol em abril. Eles reivindicam, entre outras coisas, o pagamento de salários atrasados, do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e de verbas rescisórias.

"Estamos estudando migrar estas ações para a nova sucessora. Você pode alegar sucessão em qualquer fase do processo", disse Álvaro Quintão, advogado do Sindicato Nacional dos Aeroviários, que assiste cerca de 60 ex-funcionários da Varig que entraram com ações no Rio contra VRG, VarigLog, Volo ou Aéreo.

Os advogados dos ex-empregados interpretam que a Gol pode ser considerada sucessora das dívidas da Varig em recuperação, porque adquiriu a maior parte da operação comercial da companhia por meio da unidade desmembrada, a VRG. Por outro lado, ainda não existe jurisprudência sobre a questão trabalhista em casos que envolvem companhias em recuperação judicial.

Já é consenso que a lei que regula o a recuperação, criada em 2005, permite interpretações divergentes a respeito dos compromissos com ex-empregados.

Em nota ao Valor, a Gol afirma que qualquer ação trabalhista, como as que foram iniciadas, "afronta o artigo 60 da Lei de Recuperação de Empresas", que trata de sucessão de dívidas.

Além disso, a companhia lembra que os diferentes credores da Varig aprovaram o plano que deu origem à VRG e permitiu sua venda. Nesse acordo, foi estabelecido que as dívidas da antiga Varig seriam honradas com recursos provenientes de duas emissões de debêntures pela nova empresa, no valor de R$ 50 milhões cada. A Gol já se comprometeu a cumprir esse compromisso e estuda até mesmo antecipar o resgate desses títulos, como forma de adiantar o pagamento aos credores.

Para Quintão, advogado do sindicato, os ex-funcionários que entraram com ações judiciais terão que abdicar dos recursos a serem pagos via emissão de debêntures pela VRG. "Essas debêntures não pagam um décimo do passivo trabalhista. Muitos empregados resolveram entrar na Justiça para tentar receber estes recursos antes", concluiu Quintão.

Por fim, a Gol argumentou na nota que "a Justiça do Trabalho não tem competência para impor à VRG ou à sua Controladora qualquer espécie de obrigação ou dívida que não esteja prevista no plano de recuperação judicial" e no edital de venda da unidade produtiva.

Para fazer essa afirmação, a empresa baseia-se em recentes liminares concedidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os pareceres do STJ suspenderam decisões de juízes de primeira instância que chegaram a dar ganho de causa aos trabalhadores, em processos movidos contra a VRG, Volo ou VarigLog.

No entender dos ministros do STJ, é de competência da 1ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, onde tramita o processo de recuperação da velha Varig, legislar sobre o tema. O ministro Ari Pargendler considerou em uma de suas decisões a necessidade de preservar o patrimônio da Varig até que o STJ decida em última instância qual juízo é responsável por decidir sobre a sucessão trabalhista no caso de aquisição de empresa em recuperação, ou seja, de quem é a competência para legislar sobre o tema, a Vara Empresarial ou a Justiça do Trabalho.

Segundo Quintão, pelo menos 25 das 60 ações que foram iniciadas no TRT-RJ já foram julgadas procedentes em primeira instância. No entanto, a execução dos processos está suspensa, por conta das liminares do STJ.

Enquanto o STJ não julgar o mérito da questão, qualquer caso que diga respeito à Varig em recuperação é de competência da 1ª Vara Empresarial do Rio e do juiz responsável pelo caso, Luiz Roberto Ayoub. Em entrevista ao Valor, o juiz disse que já decidiu que não há sucessão de dívidas.