Título: Lula quer ligação por ferrovia com Chile
Autor: Leo, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 25/04/2007, Brasil, p. A3

A reativação de um projeto de ligação ferroviária entre Brasil e Chile e negócios milionários entre a Embraer e a estatal aeronáutica Enaer fazem parte da agenda de conversas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a presidente do Chile, Michele Bachelet, durante a visita de trabalho que o brasileiro inicia hoje, em Santiago. Lula chega ao Chile acompanhado de uma missão de 30 altos executivos, liderada pelo presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf. A visita, de negócios, tem um forte tom político, de reaproximação entre os dois países.

No encontro com Bachelet, Lula deve firmar um memorando de entendimento na área da defesa, que poderá beneficiar a Embraer, de olho no gordo orçamento militar do país (US$ 1,3 bilhão no ano passado, US$ 800 milhões previstos neste ano). Negociações para um acordo de cooperação entre as duas empresas aeronáuticas estão avançadas, mas não terminaram a tempo de serem anunciadas formalmente durante a visita de Lula. Pelo acordo, a Enaer produzirá peças e partes para os novos jatos da Embraer, da linha Phenom, e comprará da empresa brasileira aviões Supertucanos e Bandeirantes.

Esses negócios devem gerar compras de US$ 120 milhões, por empresa, e permitirão desenvolvimento conjunto de equipamentos, com vantagens para a Embraer, pelo baixo custo da parceira chilena.

Os governo chilenos e brasileiro discutirão planos de modernizar a precária ligação ferroviária entre os dois países, através dos Andes, e tentarão atrair capital chinês para a obra, informou ao Valor o embaixador brasileiro no Chile, Mário Vilalva. Com um investimento de US$ 150 milhões, segundo calcula Vilalva, a ferrovia, hoje muito sinuosa e com trechos de bitolas diferentes, poderia tornar-se uma alternativa econômica para o comércio bilateral, incluindo as exportações de soja.

Lula está entusiasmado com o projeto, desde que soube do interesse dos chineses em financiá-lo, durante a visita que fez à China, em 2004. Mas a falta de interesse, na época, e a ênfase posta pelo governo chileno na realização de acordos com países de fora da região deixou a obra em segundo plano. Há, no governo Bachelet, uma nova disposição do governo chileno em parcerias com o Brasil, acredita o Itamaraty, que pediu a Skaf a formação da missão empresarial.

O Chile negocia com o Mercosul um acordo de liberalização do setor de serviços, que, espera o Itamaraty, deverá ser concluído até junho, e criará vantagens para empresas brasileiras, muito competitivas em setores como a construção civil.

No esforço para livrar-se da dependência em relação ao oscilante fornecimento de gás da Argentina, o Chile pesquisa a viabilidade de reservas de gás ao sul do país (já na mira da Petrobras); planeja explorar reservas, instalar uma usina de beneficiamento do gás liquefeito e tem planos de construção de hidrelétricas, com potencial de geração de 3 mil megawatts.

Esses movimentos atraem interesse de empresas como a Camargo Corrêa, que já tem investimentos no setor têxtil (Santista), pesquisa oportunidades na área de cimento, e enviou, nesta semana, a Santiago um grupo de altos executivos, comandados pelo presidente do conselho da empresa, Vitor Hallack.

A presença dos executivos da Camargo Corrêa e de outras grandes empresas brasileiras se deve à coincidência da realização do Fórum Econômico Mundial - América Latina, nos mesmos dias da visita de Lula, em Santiago. Entre discussões sobre crescimento nos países latino-americanos, o sucesso do modelo chileno e as conseqüências da expansão econômica da China para a região, os participantes pretendem criar um "Consenso de Santiago", com propostas de políticas para uma "segunda geração de reformas", ao lado de medidas que permitam crescer com distribuição de riqueza e liberalizar o mercado financeiro sem ampliar a fragilidade das contas externas no continente.